São Paulo, domingo, 16 de maio de 2004

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FUTEBOL

Máxima entidade do futebol nasceu em 1904 com pouco dinheiro, sem uma voz ativa e limitada pelos britânicos

Fifa relembra seu início pobre e escravo

DA REPORTAGEM LOCAL

Imagine a Fifa pobre, fraca politicamente, com pouco alcance, escrava. Essa era a Fifa no dia 21 de maio de 1904, quando ela nasceu.
A entidade que hoje impressiona pelo seu poderio financeiro e por sua magnitude foi oficialmente criada em Paris quando quem reinava absolutamente no futebol eram os britânicos, em especial os ingleses. Esses não só viraram o nariz para a Fifa no início como também restringiram suas ações nos seus primeiros anos de vida.
No século 20, o futebol se espalhava pela Europa e alcançava já alguns rincões do planeta, mas a atividade esportiva que se tornaria tão popular era regulamentada e controlada pelos ingleses. Alguns países europeus ensaiavam a criação de uma entidade internacional, mas se curvavam à tradicional e forte federação inglesa.
Robert Guérin, que seria o primeiro presidente da Fifa, e alguns amantes do esporte de outros países esperavam por uma resposta positiva dos britânicos. A resposta demorou, atrasando a esperada fundação. Quando chegou, foi negativa -Lord Kinnaird, presidente da federação inglesa, vetou seu país no novo organismo.
França, Bélgica, Dinamarca, Holanda, Espanha, Suécia e Suíça oficialmente criaram a Fifa. Só no papel, pois a entidade não tinha força. As leis do futebol, que até hoje passam pelo crivo da International Board, eram naquela época ainda mais inacessíveis para os dirigentes estrangeiros.
A decisão de criar de fato a Fifa veio no primeiro dia de maio de 1904, quando França e Bélgica se enfrentaram pela primeira vez. Em um banquete no dia da partida, Guérin, que representava a federação francesa, acertou com Louis Muhlinghaus, secretário da federação belga, a fundação.
Cada entidade sócia teria que pagar 50 francos por ano, uma quantia mais simbólica do que qualquer outra coisa. O plano era organizar um Mundial de futebol já em 1906, mas essa idéia só iria vingar mesmo em 1930, quando outro francês estaria no poder.
Quem representou a Espanha na fundação da Fifa foi na verdade um clube, o atual Real Madrid, que obviamente não era nem sombra do que é hoje no mundo.
Dois dias depois da fundação aconteceu o primeiro congresso da entidade. Ficou decidido que era preciso atrair novos membros para a Fifa, que não tinha boas condições para colocar em prática seus planos. O ponto principal, porém, era trazer os ingleses para o grupo, o que, segundo o próprio Guérin, era essencial.
Os britânicos dominavam no início do século o torneio olímpico de futebol, evento que contribuía para a Copa do Mundo ficar na ""geladeira". O sucesso dos ingleses em disputas internacionais confirmava para os poucos sócios da Fifa que o nível do futebol que esses praticavam era baixo.
Em 1904, a única aquisição significativa da Fifa foi a Alemanha, que se irmanou à entidade por meio de um telegrama.
As dificuldades continuavam. Cogitou-se a realização de um torneio de clubes na Suíça, mas esse não vingou. A própria federação francesa, base da Fifa, sofria um racha. Porém novos membros chegavam. Itália, Áustria, Hungria, Irlanda e País de Gales.
Os ingleses aos poucos foram se rendendo à Fifa, especialmente depois de um clube inglês ser proibido de jogar em alguns países europeus filiados à nova entidade esportiva européia -até 1909 as fronteiras do velho continente não seriam transpostas.
Um congresso realizado em 1906 em Berna selaria de vez a entrada britânica na Fifa. O preço: o inglês Daniel Burley Woolfall assumiu a presidência da entidade.
A situação não mudou muito nos anos seguintes, pois os britânicos continuavam não aceitando socializar as regras e o controle do esporte. A Primeira Guerra Mundial retardou os poucos projetos que a entidade tinha em mente.
O nome Fifa nasceu em francês (Fédération Internationale de Football Association), mas foi sob o domínio britânico que ela começou a se expandir, mais nos países colonizados pelos ingleses.
A primeira casa da Fifa era meio improvisada. Na rua Saint-Honoré, 229, em Paris, ficava a base de Guérin e de um organismo que tratava de ""esportes atléticos". Uma portentosa sede própria era um sonho ainda bem distante.
O pioneiro Guérin não demorou muito a se retirar da vida esportiva. E a concorrência com outros esportes era enorme para o futebol nos primórdios da Fifa.
Passados cem anos, a entidade que tem 204 membros e que ostenta uma rica sede na Suíça, voltou a olhar para a velha casa em Paris. São 150 milhões de atletas registrados e um torneio que é vendido por mais de US$ 1 bilhão e que é visto, acumuladamente, por quase 50 bilhões de telespectadores no mundo. Um século se passou assim. (RODRIGO BUENO)


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