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Turma do amendoim
Em uma aldeia na maior cidade da Costa do Marfim, Drogba é onipresente e tratado como divindade
FÁBIO SEIXAS
ENVIADO ESPECIAL A ABIDJAN
Pés descalços, sob um
guarda-sol que a protege da
garoa fraca, Germaine Kouadio é o retrato da tranquilidade. Descasca amendoins e os
coloca em pequenas garrafas
plásticas, que vende a 50
francos, ou apenas R$ 0,16.
Haja concentração.
Atrás dela, a menos de um
metro, mais de 50 homens e
crianças pulam, xingam e urram. Assistem à estreia da
Costa do Marfim na Copa do
Mundo, diante de Portugal.
A Folha acompanhou o jogo na aldeia de Mputo, periferia de Abidjan, maior cidade marfinesa. Um lugar simples. E que, ontem, só falava
em futebol. E em Drogba.
O astro do Chelsea é onipresente no país. Sua biografia ocupa a vitrine das livrarias. Outdoors da cidade estampam o atacante, com a
camisa da seleção, dando um
voleio. Sua foto está nas casas das famílias, em bares e
até em salões de beleza.
"É uma unanimidade. Não
há nenhum cantor ou ator ou
quem quer que seja que chegue aos pés da sua popularidade. Ele é o cara", diz Tibe
Bi, cônsul da Costa do Marfim em São Paulo e que estava ontem em Abidjan.
Um "cara" com atuação
além do futebol. Drogba também é cultuado por sua atuação para amenizar os conflitos em Bouake, no centro do
país. Em 2007, sua insistência levou para a região um jogo contra Moçambique, pelas eliminatórias da Copa.
"Foi um gesto bonito. Foram dias de paz, em que ele
uniu o país", conta Gilbert
Nenon, o guia até Mputo.
As ruas são de terra, acidentadas, cheias de poças.
Galinhas e bodes se misturam a crianças que brincam
alheias ao jogo. Além delas,
por ali, apenas Germaine não
está com os olhos grudados
nas TVs. Não é porque quer.
É porque não pode.
"Eu adoro futebol, mas estou ocupada. Além do mais,
não tem lugar para ver ali",
afirma ela, apontando com o
queixo para o bolo de gente
espremida atrás de si.
Os amendoins que ela vende a ajudam a sustentar o filho de cinco anos. Lance a
lance, grito após grito, Germaine mantém a impassividade. Até o momento em
que, tão forte a vibração, ela
levanta, sobe no banquinho,
bate palmas. A TV mostrava
Drogba entre os reservas.
Vem o intervalo. E a aldeia
de Mputo comemora o empate até então. O som da TV é
desligado, e a música de
Gadji Celi, ex-capitão da seleção, hoje cantor, invade as
ruas e as pequenas casas de
madeira com teto de zinco.
Pelas mesas, circulam garrafas de Castel, a cerveja local.
E se Germaine subiu no
banquinho quando Drogba
apareceu na TV, precisou se
proteger da bagunça quando
o técnico Sven-Göran Eriksson mandou o astro nacional
para o aquecimento.
Três torcedores correram
até a TV. Um deles se ajoelhou, como se diante de
uma divindade. Outro ergueu a cadeira sobre a cabeça e gritou seu nome.
Atrás, uma marfinense
mandava beijos para a tela.
A vibração valeu pelos
gols que não vieram. Mas o
empate em 0 a 0 foi comemorado como uma vitória.
Em Mputo, os torcedores
correram pelas ruas de terra. Em Abidjan, buzinaço.
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