São Paulo, segunda-feira, 16 de agosto de 2004

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O nome da festa

Depois de uma visita à simpática Afrodite do museu de Maratona, é a vez de assistir à comemoração da ascensão da Virgem ,dia mais importante para as Marias da Grécia do que o próprio aniversário

PAULO SAMPAIO
ENVIADO ESPECIAL A MARATONA

A peça mais rara do museu de Maratona é Afrodite. No caso, nem é tão antiga assim: tem cerca de 60 anos, sobrenome Richulas, toma conta do lugar e não sabe uma palavra em inglês, só grego, mas adora se comunicar. Vassoura na mão, saia preta abaixo do joelho, chinelo e blusa branca de abotoar, ela recebe quem chega rindo e falando sem parar. Se alguém não entende o que ela diz, Afrodite aumenta o tom, como se fosse um problema de audição.
Recém-inaugurado, o museu é visitado nesse momento apenas por um casal de ingleses cujo temperamento contrasta fortemente com o de Afrodite. O advogado Peter Nixon, 50, tem as bochechas vermelhas, uma risada nervosa e o pescoço duro como se tivesse sofrido um torcicolo; sua mulher, a contadora Dorothy, 46, veste uma saia muito ampla em relação às suas pernas finas, camiseta amarrotada e arco de plástico na cabeça. Os dois vieram para acompanhar a filha, Helen, 15, que é remadora e gostaria assistir à competição oficial. "Ela é apenas uma iniciante, mas adora remar", dizem.
Além de mapas da região de Atica, o acervo do museu possui objetos do fim do período neolítico, cerâmicas da idade do Bronze, sepulturas de heróis de guerra e bustos e estátuas do período de dominação romana. Para quem tem o British Museum, o de Maratona parece café muito pequeno.
"Tudo lá é roubado, viemos ver o que sobrou", diz Peter, sem parar de rir nervosamente, referindo-se ao acervo grego do museu inglês.
Na altura do km 4, a rota envereda por um apêndice à esquerda: são dois quilômetros contornando o monumento em homenagem aos gregos que morreram na batalha contra os persas em 490 a.C.
Retorno à estrada, estirão de seis quilômetros, e a maratona chega ao município de Nea Makai, onde há um pequeno centrinho com lojas de roupas, cabeleireiro, correio, peixaria e a primeira igreja ortodoxa. Será que tem casamento grego por esses dias?
Uma senhorinha que está na porta põe-se a falar em grego sem parar. Em vez de aumentar o tom para se fazer entender, como Afrodite, ela fala as palavras va-ga-ro-sa-men-te, enquanto arqueia as sobrancelhas, o que é ainda mais divertido.
Nesse momento aparece Eleni Lagoudaki, 46, uma aeromoça aposentada, de cabelos avermelhados, unhas grandes e discurso pródigo.
"Ninguém se casaria hoje, porque é o feriado religioso mais importante da Grécia depois da Páscoa; comemora-se a ascensão ao céu da Virgem Maria; pela tradição, não se deve casar nos 40 dias que antecedem a data", explica.
Tem um outro detalhe: "Existe aqui na Grécia uma superstição segundo a qual não é bom casar em ano bissexto", conta.
A festa do dia 15 é, segundo explica Eleni, mais importante para as Marias e Mários (Panagiotas, Despinas e Panagiotis, respectivos em grego para o mesmo nome) do que o próprio aniversário:
"As comemorações que contam para os gregos são as "onomáticas", aquelas que festejam o dia do nome da pessoa", explica ela, cujo aniversário do nome é em 21 de maio.
Mas e se, por exemplo, a pessoa se chama Sócrates ou qualquer outro nome que não tenha santo correspondente? "Todos esses comemoram no "Anghion Pandon" (espécie de Dia de Todos os Santos), que é no dia 6 de junho."
Dois "parakalós" depois, descobre-se que as únicas igrejas que fazem o que eles chamam de "panegiri" (quermesse) são as que evocam Maria. Há uma em Mati, na altura do quilômetro 14: estirão menor até lá. Agora são 20h, momento em que uma procissão roda a cidade...


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