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JOSÉ GERALDO COUTO
Que bonito é
O gol de Zé Roberto contra o Gimnasia coroa a primavera tardia do craque, que quase sempre foi subaproveitado
NUMA ENQUETE realizada pelo
UOL para saber quem é o
melhor jogador de futebol
em atividade no país, Zé Roberto está ganhando com uma certa folga
em relação ao segundo colocado,
Rogério Ceni. Até ontem, tinha
42,8% dos votos dos internautas,
contra 33,7% do goleiro são-paulino.
O resultado não chega a surpreender: desde que surgiu como lateral-esquerdo na Portuguesa, em 1995,
Zé Roberto sempre foi ótimo jogador. Some-se a isso o fato de que o
nível do futebol praticado no país
decaiu nos últimos anos, sobretudo
devido ao êxodo de talentos.
Mas o fato é que Zé Roberto, que
nunca tinha sido mais do que coadjuvante de luxo nos times por onde
passou, ganha aos 32 anos a condição de protagonista, se não de astro.
Entre as razões dessa primavera
tardia, além do já mencionado declínio da qualidade do futebol jogado
por aqui, há que reconhecer a sagacidade do técnico Vanderlei Luxemburgo, que soube encontrar a melhor função para o atleta em campo,
a de meia ofensivo.
É como se, em 12 anos de carreira
profissional, Zé Roberto tivesse
sempre jogado no lugar errado, em
prejuízo de suas potencialidades.
Fosse como lateral, fosse como segundo volante, o craque era sempre
subaproveitado.
Chega a lembrar, por analogia, a
história de Miguilim, o menino sertanejo inventado por Guimarães
Rosa, que só começa a ver o mundo
como ele é depois que um mascate
intui que ele é míope e coloca-lhe
um par de óculos no rosto. Pela primeira vez na vida, Miguilim enxerga
direito o rosto da mãe, as plantas,
os bichos.
Luxemburgo, de certa forma, deu
óculos a Zé Roberto. Na terra de cegos em que se transformou o país do
futebol, ele hoje é rei. (Não por acaso, veste a camisa 10 do Santos, manto sagrado que já foi de Pelé.)
Mas não seria justo atribuir o
atual brilho de Zé Roberto apenas à
opacidade dos outros jogadores,
mesmo porque o próprio Santos
conta com alguns de primeiro nível:
Kléber, Maldonado, Cléber Santana,
Pedrinho.
Para comprovar a maestria do sujeito, basta ver o gol que ele fez contra o Gimnasia y Esgrima, da Argentina, no meio da semana.
Depois de arrancar como um garoto pela esquerda, deixando dois
oponentes para trás, Zé Roberto entrou na área em velocidade e, já perto da linha de fundo, olhou para o
meio: não tinha ninguém para receber a bola. Deu então um segundo
olhar, desta vez para o gol, e, mesmo
sem ângulo, resolveu encobrir o goleiro. A bola entrou no cantinho,
num dos lances mais belos do ano.
O movimento dos olhos de Zé Roberto só se deixa ver na repetição em
câmera lenta. Tudo durou uma fração de segundo, com a bola em movimento e um zagueiro a acossá-lo.
É bonito ver a arte do futebol levada a um tal extremo de sutileza e
precisão.
ESTRELAS LIVRES
Por falar em manto sagrado, o
Cruzeiro fez bem em consultar a
torcida sobre a nova camisa do time. Deu a lógica: em vez de manter
aprisionadas no escudo circular do
clube as cinco estrelas do Cruzeiro
do Sul, os fãs decidiram libertá-las
de novo, espalhando-as pelo peito
dos atletas. Assim, a camisa volta a
ser uma das mais belas do Brasil, ao
lado da do Juventus da Mooca.
TRANCOS E BARRANCOS
Jogando feio, sem organização
tática, com gols feitos no "abafa"
por beques e volantes, com expulsões e lesões, o Corinthians avança
na Copa do Brasil, ganha pontinhos
no Estadual e anima a Fiel. Nessa
toada, já não duvido de que chegue
entre os finalistas do Paulistão.
Mas não se iluda: o time é ruim de
doer. O que o salva é a grandeza de
sua torcida e de sua camisa.
jgcouto@uol.com.br
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