São Paulo, segunda-feira, 17 de março de 2008

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"Ganhar do Brasil é mil vezes melhor"

Zidane vê semelhanças entre Heliópolis e o lugar em que cresceu, mas não tem "pena" dos brasileiros pelas eliminações

Em visita a São Paulo, onde inaugurou uma quadra na periferia, francês mostrou humildade até na hora de não se pôr entre os melhores

Fernando Donasci/Folha Imagem
Zidane em quadra da favela de Heliópolis em São Paulo


RODRIGO BUENO
DA REPORTAGEM LOCAL

O maior carrasco do Brasil na história das Copas do Mundo não tem ""pena" do que fez aos brasileiros, mas, em sua visita a São Paulo, fez questão de exaltar o país e se sentiu em casa.
""Vocês podem achar estranho, mas me coloco como um dos seus [brasileiros]. O Brasil para mim sempre foi um exemplo no futebol. Dizem que os ingleses inventaram o futebol, mas os brasileiros o reinventaram. Nós, franceses, admiramos o Brasil. É um prazer estar aqui", falou ele em uma entrevista coletiva no Paineiras, um refinado clube do Morumbi.
Horas antes, ele estava na periferia de São Paulo, em Heliópolis, local da maior favela da maior cidade do país. Inaugurou uma quadra em evento que contou com promoção da Adidas e que inicia uma campanha para a Copa de 2014 no Brasil.
""Inaugurei só uma quadra. O projeto da Adidas é inaugurar uma por ano até 2014. Espero estar no Brasil em 2014. A Copa vai diminuir as chances das outras equipes, mas isso é o futebol. Espero que o Mundial, no Brasil e na África do Sul, seja uma alavanca social. As melhorias têm que ter continuidade após a Copa", falou o ex-meia.
No começo da manhã de ontem, Zidane atendeu alguns jornalistas sul-americanos. Em entrevista da qual participou a Folha, ele deixou claro como foram importantes para ele as vitórias nas Copas do Mundo de 1998 e 2006 sobre o Brasil.
""Quando você joga contra o Brasil, você faz tudo para ganhar. Sim, eu me motivava mais para jogar contra o Brasil. Vencer o Brasil não é duas vezes melhor, é mil vezes melhor. Porque é o Brasil", diz ele, autor de dois gols nos 3 a 0 da final de 98 e responsável pela assistência para Henry no 1 a 0 de 2006.
Mesmo na última vitória, no Mundial da Alemanha, ele elogia o adversário predileto. ""É difícil analisar se o Brasil jogou bem ou mal aquele jogo, se estávamos mais bem preparados. O Brasil sempre tem a melhor equipe. Você joga para ver se consegue ser melhor", diz ele, que chamou o Brasil de ""país do futebol". ""O Brasil é o penta."
Indagado sobre qual era seu maior orgulho e qual era sua maior vergonha no futebol, ele lembrou a final de 1998.
""Vergonha não tenho de nada, pois tudo que fiz, de todas as formas, foi aqui dentro [aponta o coração]. O que fiz de melhor foi ganhar a Copa porque nós, os franceses, não imaginávamos isso. Ganhar uma Copa e, além disso, contra o Brasil? Todos sonhavam com isso", falou.
Zidane, que negou qualquer possibilidade de voltar aos campos, diz que pretende ainda trabalhar com o futebol.
""Estou muito velho [para jogar profissionalmente]. Tive proposta para atuar nos EUA, mas já estou há dois anos sem jogar. Vivo em Madri e pode ser que venha a trabalhar no Real Madrid. Quero voltar a trabalhar com o futebol, mas não como técnico", disse ele.
Aos 35 anos, o francês não se coloca entre os melhores da história, embora tenha sido eleito pela Uefa o melhor europeu. ""Há três jogadores acima de todos: Pelé, Maradona e Di Stéfano. Dizer quem foi o melhor europeu é difícil. Há muitos grandes jogadores. Não me colocaria entre os três melhores. Platini foi melhor que eu."
Zidane já vê seu filho, Enzo [nome dado em homenagem ao uruguaio Francescoli, ídolo de Zidane], pintar com bom futuro, mas evita falar de família.
""Não sei o que vai acontecer [com Enzo]. Não sabemos", falou, para depois dizer que a família é a coisa mais importante para ele. ""Acho que é para todo mundo." Ele fez restrições nas entrevistas coletivas a perguntas relacionadas ao episódio com Materazzi, que teria ofendido a irmã e a mãe do francês.
O três vezes melhor jogador do mundo [1998, 2000 e 2003] diz que gostaria de ser visto no mundo não pelo seu último lance, a cabeçada no zagueiro italiano que lhe rendeu a expulsão na final da Copa passada.
""Na França, as pessoas sempre me vêem pela minha carreira toda, não pela minha última jogada. Quero deixar a imagem da minha carreira", afirmou.
O ex-meia falou também da crise mundial de armadores.
""Hoje, o futebol tem mais tática, mais estratégia. Os 10 [camisas 10] estão desaparecendo. Mas sempre haverá grandes jogadores, inclusive brasileiros, sul-americanos. Não vou citar nomes agora", disse ele, que diz ser atraído na TV hoje pelo Manchester United e o Arsenal.
Segundo ele, que participou ontem à tarde de um jogo beneficente com ex-atletas brasileiros, viajar para o Brasil agora é um aprendizado. ""Como jogador, você viaja muito, mas só pensa no jogo. Agora, viajando com um patrocinador, posso unir o útil ao agradável. Eu aprendo nas viagens", falou.
Zidane deixaria o país ainda ontem à noite. ""Espero que os brasileiros não me odeiem."


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