São Paulo, quinta-feira, 17 de setembro de 2009

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JUCA KFOURI

O espírito esportivo econômico


O futebol europeu propõe uma utopia, o "fair play financeiro", algo que o capitalismo tende a rejeitar


ATENÇÃO: esta coluna será mais maçante, chata mesmo, do que normalmente.
Tratará de uma ideia genero- sa, igualitária, ética e fadada ao fracasso exatamente por sua generosidade, espírito de justiça e comportamento reto. Importa nada discutir por que nós chamamos espírito esportivo de "fair play". Deixa pra lá.
Importa avaliar até que ponto o que Michel Platini idealiza na Uefa que preside é factível neste mundo de competição desenfreada, concorrência desleal, ganância sem fim, dinheiro, dinheiro, dinheiro. E mais dinheiro.
Sim, porque, se por um lado é natural que quem possa mais chore menos, que clubes de grandes massas torcedoras (o mercado!, o mercado!, o mercado!) gerem mais recursos que os pequenos, por outro seria formidável se os menores tivessem um mínimo de condição de lutar por um lugarzinho ao sol.
Diante da obviedade hoje mais que constatada e aceita que é a lavagem de dinheiro no esporte, tentemos ver a coisa pelo lado do doping.
Isso mesmo, do doping.
Ou alguém duvida que o dinheiro sujo das parmalats, MSIs, jogo do bicho, tráfico de drogas, significa turbinar artificialmente times campeões no Brasil, na Colômbia e também na Europa, tanto ocidental quanto oriental?
Mas, se vivemos sob um regime que só pensa em lucro, em rentabilidade nem que seja preciso pisar no pescoço da mãe, em vencer a qualquer preço porque feio só é perder, esperar o quê?
Ora, o sonho do mundo mais justo desmoronou com a queda do infame Muro de Berlim, quando só se viu gente da Berlim Oriental querendo ir para a Ocidental.
Descobrimos todos, ou melhor, alguns de nós descobriram que a luta, na verdade, não era por um mundo mais fraterno, a luta era pelo poder e todos os seus privilégios. Pena que tanta gente boa tenha dado a vida por isso.
Platini entrou numa luta justa, mas, é de se temer, inglória.
Sim, é verdade que a última crise ainda vivida pelo capitalismo revelou que a farra tem limites, algo que diz respeito também ao futebol.
Não terá sido por outra razão que até a filha do bufão Silvio Berlusconi tratou de reduzir o Milan a um tamanho mais palatável aos interesses da família.
Platini teria alguma chance de êxito se o futebol fosse dominado por Belluzzos, ou por Areias (João Henrique), que é uma luz no fim do túnel do Flamengo, em sua próxima eleição, em dezembro.
Mas o futebol, pelo mundo afora, não só no Brasil, registre-se, tem mais euricos que maurícios (o Assumpção, do Botafogo).
Imaginar que o futebol possa ter tetos, orçamentos, só gastar o que gerar, é mais ou menos fazer como um dia fez John Lennon, ao pensar um mundo sem guerras e religiões, em paz.
Findo, também, o sonho neoliberal, certamente o Estado tem um papel, indutor e regulador, a desempenhar para botar ordem na zorra geral. Mas, aqui, não será com timemanias e bingos que a solução virá. Platini "é um sonhador, não o único, e até talvez mais gente se junte a ele, para que o mundo seja um só".

blogdojuca@uol.com.br


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