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FUTEBOL
Vanderlei
MÁRIO MAGALHÃES
COLUNISTA DA FOLHA
O genial Alfred Hitchcock,
longe dos estúdios, não passava de um bobalhão. O mais brilhante orador do Brasil republicano, Carlos Lacerda, era golpista
incorrigível. David Nasser, mestre
do texto, encarnava o jornalismo
mais cafajeste. Wilson Simonal,
talento da música, trabalhava na
moita para a ditadura militar
(conforme reconheceram à Justiça o próprio cantor e dois amigos
seus, um tira do Dops da Guanabara e um oficial do Centro de Informações do Exército).
Moral da história: para vestir a
camisa 10 no seu ofício o sujeito
não precisa ser exatamente um
cara legal. Não quero Vanderlei
Luxemburgo como chapa, mas
ele seria um técnico dos sonhos
para meu clube de coração.
Não faltam motivos para aversão a Vanderlei. Até dos pobres
"v" do início e "i" do fim do seu
nome ele tentou escapar, tornando-se Wanderley. Usou data de
nascimento adulterada, o que lhe
facilitou a vida como jogador.
Filho de comunista, ganhou o
Luxemburgo como homenagem à
revolucionária Rosa. Graças à
sua competência, ascendeu. E
deslumbrou-se. Na beira de campo, ostenta terno e gravata em
pleno calorão. Imita colegas de
países onde, quando a temperatura atinge aquela em que aqui se
joga, os clubes estão de férias.
Lembra os "darks" que infestavam o Brasil com roupas pretas a
mimetizar, no verão, os modelitos
do inverno londrino.
Combina vaidade e vulgaridade. Cometeu: se tivesse que escolher entre sobreviver ele ou o pai,
morreria o pai, por ser mais velho
e ter vivido mais; quem tem dois
banheiros em casa e não sabe a
qual recorrer acaba fazendo nas
calças.
Fala o idioma dos jogadores e
faz disso uma arma. Boleiro que
foi, trata-os como semelhantes.
Diante dos microfones, castiga o
vernáculo com o vocabulário
gongórico. No vestiário, se faz entender em linguagem clara.
Não era ruim de bola, mas deu
azar de concorrer com Júnior pela
lateral esquerda do Flamengo. Lá
conviveu com craques como Zico,
Adílio e companhia. Aprendeu e
se aprimorou. Não é retranqueiro, mas se obstina na armação da
defesa. Seus times atacam verticalmente, mordendo. São equilibrados.
É o recordista em títulos do Brasileiro. O Santos pode bater o recorde de gols. Perdeu Diego e Robinho, mas reconquistou a ponta.
Teve de jogar longe da Vila devido à insanidade de torcedores.
Gols legítimos foram surrupiados.
Vanderlei vê tão bem o jogo
que, após suas instruções, quase
sempre suas equipes começam o
segundo tempo atropelando. Faltam-lhe títulos internacionais e
sucesso no Flamengo e na seleção,
experiências fracassadas que um
dia enfrentará de novo. Não foi o
melhor de 2004, porque ninguém
fez o que Leão fez no São Paulo.
Mas montou um time que soube decidir quando o Atlético-PR
não soube, embora o próximo domingo possa ser o avesso do que
passou. Comanda um Santos que
dá gosto de ver, com a cara de um
técnico campeão que sabe de futebol como poucos.
Zetti e Segundona
O Avaí tinha mais time, mas entrou só para se defender e se
deu mal no Castelão. Zetti, a revelação de técnico do ano ao lado de Péricles Chamusca, pôs o
Fortaleza para atacar, venceu
por 2 a 0 e fará companhia ao
Brasiliense na primeira divisão
do Brasileiro em 2005.
Gre-Nal e história
No último domingo de agosto
de 1961, no mesmo dia em que
entrou no ar a Rádio da Legalidade, o Gre-Nal foi cancelado.
Até o futebol parou por causa
da crise política. É o que conta o
recém-lançado "Brizola - Da legalidade ao exílio" (RBS Publicações, 136 páginas), belo livro
da jornalista Dione Kuhn sobre
a turbulência dos dias (e anos)
seguintes à renúncia do presidente Jânio Quadros.
E-mail
mario.magalhaes@uol.com.br
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