São Paulo, quinta-feira, 18 de junho de 2009

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JUCA KFOURI

A soberba e a seleção


Do mesmo modo que os jogadores não aceitam que haja alguém melhor, os jornalistas também não

LUIS FABIANO rejeita que a seleção da Espanha possa ser melhor que a do Brasil.
Uma vitória apertada sobre o Egito vira quase crise, porque onde já se viu ganhar apertado dessa gente sem tradição?
Por mais que os egípcios sejam os campeões africanos e tenham superado nigerianos e camaroneses, de triste memória recente para o nosso futebol olímpico e não olímpico.
E a África é o continente de Drogba, Eto'o, Adebayor.
Não, o Egito não é Honduras, e a família Scolari perdeu para Honduras antes de ganhar o penta.
Como se sabe, aliás, a seleção que ganhou o pentacampeonato não é uma seleção pentacampeã mundial, porque ganhou só aquela Copa do Mundo, em 2002. Diferentemente da seleção bicampeã de 1958/62, praticamente a mesma.
E, lembremos, tricampeão, jogando, só o Rei Pelé.
Mas as cinco estrelas na camisa amarela fazem com que Luis Fabiano não admita inferioridade nem circunstancial.
Se alguém perguntar a ele sobre os jogadores que começaram a campanha do penta ele nem saberá dizer quem são, como Robinho ignorava a existência de Nilton Santos.
Mas o penta é suficiente para desconhecer méritos em adversários, como se o penta jogasse.
O diabo é que a visão distorcida não é apenas deles, os jogadores. Porque nós, jornalistas, incorremos no mesmo erro.
Ganhar de pouco do Egito é desonra, como se ainda vivêssemos nos anos 60 -e olha que na última partida contra os egípcios a vitória já foi magra, só 1 a 0, em 1963.
E nem é que não existam mais bobos no futebol, como se diz, porque, na verdade, nunca existiram, tanto quanto nossa soberba insiste em nos autoenganar.
Veja o caso deste jogo contra os Estados Unidos.
Ora, os Estados Unidos, aquele país que só não aceita cerveja quente, hambúrguer frio e derrota no basquete, apesar de terem apanhando no basquete mais do que jamais sonharam.
Não importa que ainda em 1950 os norte-americanos, terceiros no primeiro Mundial, o de 1930, tenham protagonizado uma das maiores zebras da história das Copas do Mundo, ao despachar de volta para a Inglaterra os súditos da rainha, que até então se recusavam a disputar o torneio, orgulhosos de sua inconteste, para eles, superioridade de inventores do esporte... bretão.
Não importa nem mesmo se em 11 jogos contra eles foram, sim, dez vitórias nacionais, mas com uma derrota, e em 1998, além de só três das vitórias terem sido por dois ou mais (três, no caso) gols de diferença. Ou seja, as outras sete foram sempre por apenas um gol.
Por que esperar, prever ou exigir goleada nesta manhã, se a Itália, atual campeã mundial, pois não, suou, e contra dez, para vencer por 3 a 1 esta mesma seleção dos EUA? Porque sofremos, os jornalistas, da mesma soberba.
Deixamos de ser os melhores, podemos até voltar a ser, mas também não aceitamos, nós e nossas circunstâncias -apenas para lembrar de um espanhol famoso que não se chama nem Xavi nem Fernando Torres, um tal Ortega y Gasset.

blogdojuca@uol.com.br


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