São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 2005

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"Reds" surgiram em onda antigays

MÁRVIO DOS ANJOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Fundado em 1892, o Liverpool e seu rival, o Everton, surgiram da mesma igreja de São Domingo na cidade. São 2 dos 7 clubes da elite inglesa nascidos de paróquias.
À época, o futebol era usado por puritanos contra os desvios sexuais, que, segundo eles, poderiam arruinar o império, como a masturbação e o homossexualismo. Até hoje, "wanker" (masturbador) é ofensa nos estádios de lá.
O tema foi tratado pelo escritor David Winner no livro "Those Feet: A Sensual History of the English Football" ("Aqueles Pés: Uma História Sensual do Futebol Inglês"), lançado neste ano na Inglaterra e inédito no Brasil.
À Folha, Winner contou que sua pesquisa começou buscando as raízes do estilo inglês de jogo -violento, rude, nada artístico.
"Pensei que tivesse a ver com militarismos, mas, pesquisando impressos e consultando acadêmicos, vi que o futebol floresceu sob enorme repressão sexual."
Alianças conservadoras, como a NVA (Associação Nacional de Vigilância, em inglês) e a White Cross estimulavam a polícia a perseguir atividades imorais e distribuíam panfletos aos jovens.
"A sexualidade era encarada como bestialidade", diz Winner. "Os puritanos recomendavam aos garotos que gastassem suas energias em esportes, para que, exaustos, não se masturbassem."
Figuras famosas, como Conan Doyle, criador do detetive Sherlock Holmes, defendiam que, além disso, os ingleses "deveriam ser rudes no esporte, para não haver o risco da efeminação".
Mas talvez a mais importante cara no futebol tenha sido a do lorde Arthur Kinnaird, que dirigiu a federação do país por 33 anos e foi um jogador violento.
"Acredito que todas as pessoas de bem têm razões para agradecer a Deus pelo progresso deste esporte nacional", dizia Kinnaird. Vice-presidente da NVA, descendia de conservadores banqueiros cristãos e não cessou de pedir mais repressão nos costumes.
Mas por quê? "O medo sexual sempre foi presente no Império Britânico, que era obcecado pela obra "Ascensão e Queda do Império Romano", do [historiador Edward] Gibbon [1737-1794], que sustentava a tese de que Roma caiu quando sua sociedade perdeu a disciplina sexual."
Por fim, conclui que, se um jogador exibisse estilo mais técnico, longe da generalizada masculinidade rude, acabaria malvisto.
"George Best [morto no mês passado], beberrão e brigão, mas talentoso, ouvia da torcida rival: "George Best galã/ Anda que nem mulher/ E usa sutiã'", diz Winner. "O menor sinal de individualidade era visto como efeminação. Só agora a geração de Gerrard, Beckham e Lampard venceu isso."


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