São Paulo, sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

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voz da experiência

Executivo ensina basquete a encestar

Gary Boren, 67, brilha como único técnico de lance livre da NBA, diz que precisão é obtida com cérebro e alerta o Brasil

Analista financeiro iniciou treinos aos 53 anos, criou teoria sobre arremessos e ajuda Dallas, finalista em 2006 e melhor time da liga

ADALBERTO LEISTER FILHO
GUILHERME ROSEGUINI
DA REPORTAGEM LOCAL

Gary Boren decidiu se transformar em cobaia ao perceber a dificuldade que jogadores profissionais enfrentam para executar um arremesso tão corriqueiro no basquete.
Entrou em uma academia, comprou uma bola laranja e estabeleceu o desafio: treinar até entender por que astros que ganham milhões pecam nos lances livres, chutes executados sem marcação e a menos de cinco metros da cesta.
Ele não era um garoto quando fixou tal meta. Já tinha 53 anos e limitações de horário -sua jornada como analista financeiro ocupava o dia todo.
Mesmo assim, obteve êxito.
Hoje, aos 67, Boren é o único treinador de lances livres da NBA. Seus conhecimentos ajudaram o Dallas Mavericks a assegurar o posto de melhor equipe da competição até aqui.
Sua teoria rendeu fama, empregos de consultor em 46 equipes e um discurso inflamado para criticar times e países que não dão importância aos detalhes no esporte- o Brasil está entre os torpedeados.
A jornada de Boren na modalidade começou em 1992. "Eu decidi que chutaria lances livres até acertar a cesta 500 vezes por dia. Cheguei a fazer mais de mil arremessos", disse à Folha. Durante 13 meses, deixou seu escritório no Equity Group para realizar as práticas. Não se lembra de ter faltado.
"No final desse período, eu sabia muito de lance livre. Decidi então passar o conhecimento adiante. Procurei um técnico profissional."
O eleito foi Don Nelson, na época no Golden State Warriors. Boren enviou uma carta mostrando que a equipe era a pior da liga nos lance livres e que ele poderia resolver o problema. Foi contratado.
Sob a batuta do executivo, os atletas melhoraram a média de acerto nos arremessos em 20% apenas no primeiro ano.
No Dallas, a dupla celebra estatísticas também impressionantes. O time fica entre os top 6 na lista dos melhores da NBA em lances livres desde 1999. Na temporada atual, com média de acerto de 80,9%, perde somente para o Phoenix Suns, que tem 81,3% de eficiência.
"Basicamente, eu provo aos atletas que lance livre ganha jogo e que eles erram tanto porque se acham bons demais."
O primeiro item de seu argumento é evidenciado com números. O Dallas venceu sete partidas nesta temporada graças ao melhor aproveitamento que os rivais nos lances livres. Sem esses triunfos, deixaria a ponta da Conferência Oeste, caindo para a quinta posição.
Já as explicações sobre a teoria da falta de humildade dos basqueteiros exige um mergulho nos métodos de Boren.
O economista filma os atletas arremessando. "Existem 41 pontos de falhas em biomecânica, posicionamento e estratégia que detectei. Cada um peca em pelo menos dez itens. Nessa breve orientação, já conseguimos ganhos consideráveis."
A questão central, porém, vem depois. Para Boren, o lance livre é uma guerra entre a mente e o corpo. Sua tarefa é ensinar os pupilos que a primeira parte deve triunfar.
"No arremesso, o cérebro sabe o que fazer. Mas os músculos não obedecem. No lance livre, os atletas ficam calmos porque acham que vão acertar, porque a cabeça conhece o movimento. Aí fazem besteira."
Ele acredita que seus comandados não podem relaxar no momento do chute. Com exercícios de repetição, ensina a evitar "uma sesta muscular".
Boren diz admirar a precisão de brasileiros no fundamento. Lembra de Hortência, Marcel e "daquele recordista em pontos nas Olimpíadas", em referência a Oscar. Lamenta o fato de o Brasil ter decaído no cenário internacional, especialmente com os homens, e promete oferecer seus serviços ao país.
"É um grupo que se esqueceu do valor dos treinos, dos detalhes. Se não me engano, o Brasil acertou pouco mais de 60% dos lances livres no último Mundial [o percentual foi de 61,9%]. É horrível. Desse jeito, nunca voltará a ser bom."


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