São Paulo, domingo, 19 de fevereiro de 2006

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FUTEBOL

A busca do desequilíbrio

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

D esde a Copa de 1958, na Suécia, os laterais brasileiros gostam de avançar. Ficaram famosos os gritos do Feola para o Nilton Santos voltar para a defesa. Ele desobedeceu, ou não escutou, e fez um dos gols do Brasil na vitória de 3 a 0 contra a Áustria.
Nessa época, escutava os jogos pelo rádio e já diziam que o futebol é uma caixinha de surpresas, que o craque estava de salto alto e outros chavões.
Havia também muitas falcatruas. Mas não existiam muitas outras coisas ruins e chatas que vemos hoje nem outras coisas boas que temos atualmente, assunto para uma próxima coluna.
Os grandes laterais brasileiros continuaram no ataque, sem deixar de serem bons na defesa, como Djalma Santos, Carlos Alberto, Leandro, Nelinho (que é excelente comentarista), Jorginho, Júnior, Leonardo, Branco, Cafu, Roberto Carlos, entre outros.
Já os laterais europeus só pensam na defesa. Os poucos habilidosos vão atuar no meio-campo ou de alas, no esquema com três zagueiros. No máximo, um dos dois é escalado para atacar. Por isso, Cafu e Serginho raramente atuam juntos no Milan. Os bitolados técnicos da Europa não gostam da criativa solução brasileira de alternar o avanço dos laterais de acordo com o momento.
Mesmo assim, os técnicos europeus sempre morreram de medo dos avanços do Cafu e do Roberto Carlos. Mas o tempo passa. Cafu tem atuado pouco e pior do que antes, e Roberto Carlos é, hoje, um lateral mais com estilo europeu do que brasileiro.
Com os 20 dias de descanso e de treinos antes da Copa e pela vontade de encerrarem bem suas carreiras na seleção, Cafu e Roberto Carlos podem ainda brilhar no Mundial. Ainda mais que recauchutaram o Cafu.
Roberto Carlos precisa também retirar a máscara que usa para jogar em algumas ocasiões.
A seleção brasileira sempre jogou com um volante bastante recuado ou com um terceiro zagueiro, como na Copa de 2002, com a finalidade de fazer a cobertura dos laterais. Cafu e Roberto Carlos podiam avançar livremente.
No Mundial da Alemanha, isso será mais difícil de acontecer. O volante não pode abandonar o meio-campo, pois o outro ficará sozinho, já que os dois meias são muito mais armadores e atacantes do que marcadores.
Como são dois zagueiros, um não poderá também sair muito para as laterais. Como isso será, algumas vezes, inevitável, prefiro zagueiros mais velozes e com as pernas compridas, como é o caso de Lúcio e Luisão.
Mas vale a pena arriscar. O avanço dos laterais, pelo menos um de cada vez, e o quarteto ofensivo formado pelos dois meias e dois atacantes são fundamentais.
Além disso, o equilíbrio perfeito e a pura razão inibem a liberdade, a ousadia e a paixão.
O Brasil só vai ganhar e brilhar intensamente na Copa se tiver um certo desequilíbrio. É preciso buscá-lo, com equilíbrio.

Pontas-de-lança
Na coluna anterior sobre a evolução tática, parei no WM ou no 3-2-2-3. Como um dos meias chegava em velocidade, como uma lança, na área adversária, era chamado de ponta-de-lança. Para marcá-lo, os técnicos recuaram um dos médios para a zaga, que passou a ser o quarto zagueiro. Antes havia um zagueiro central e mais um de cada lado.
Erroneamente, até hoje o zagueiro esquerdo é chamado de quarto-zagueiro, e o da direita, de zagueiro central.
Como uma equipe não podia ter apenas um jogador no meio-campo, os técnicos recuaram mais ainda o meia ofensivo, que passou a ser o meia-armador.
Assim, se formou o 4-2-4, com uma linha de quatro defensores, um armador mais defensivo (volante), um meia-armador e quatro jogadores mais adiantados (dois pontas, um centroavante e o ponta-de-lança).
O ponta-de-lança, geralmente camisa 10, costumava ser o craque do time, como Pelé, Maradona, Cruyff, Zico e tantos outros. Ele era uma mistura do atacante de hoje, que recua para receber a bola, com o meia-atacante (Alex, Roger), que atua próximo dos dois da frente. Já o meia-armador, como Ricardinho, participa da marcação, da organização do meio-campo e, às vezes, ainda chega ao ataque para fazer gols.
Durante muito tempo, a maioria dos times brasileiros, como a seleção em 1954 e o Santos de Pelé, jogou no 4-2-4. Dele, surgiu o 4-3-3, esquema a ser tratado em uma próxima coluna.

E-mail : tostao.folha@uol.com.br


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