São Paulo, sábado, 19 de junho de 2010

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Quase lá

Na fronteira entre as duas Coreias, a única referência à Copa é uma réplica da Jabulani diante de um banheiro militar

FÁBIO SEIXAS
ENVIADO ESPECIAL A PAJU

Na cidade sul-coreana mais próxima à Coreia do Norte, a única referência à Copa do Mundo é uma réplica da bola Jabulani diante de um banheiro usado por militares. Nada mais.
A Folha esteve ontem em Paju, às margens da Zona Desmilitarizada, área criada em 1953 após o cessar-fogo entre os dois países. É, em todo o mundo, a fronteira que mais dispõe de equipamentos militares: como nunca foi assinado um tratado de paz, as Coreias tecnicamente continuam em guerra.
A reportagem tentou obter visto de entrada na Coreia do Norte para a série "Um Mundo que Torce". O grande empecilho seria deixar rapidamente o país, já que o governo norte-coreano costuma reter o passaporte de jornalistas. Diante da impossibilidade de entrar e sair no mesmo dia, a opção foi visitar o "quase lá", Paju.
A cidade de 308 mil habitantes fica a 58 km de Seul e é dormitório de militares sul-coreanos, americanos e de membros do Comando das Nações Unidas. São eles que guardam a porção sul da Zona Desmilitarizada, uma faixa de 2 km de extensão até a fronteira ocupada por árvores e pequenas plantações de arroz e ginseng de modestos lavradores locais.
Do lado de lá, é quase a mesma coisa. Uma faixa de 2 km, sem ocupação, a partir da divisa. São 250 km de extensão, tomando como base o paralelo 38. A grande diferença é que não há árvores.
"Como a eletricidade oscila muito lá na Coreia do Norte, e como o óleo é considerado muito caro, eles derrubam as árvores no inverno para tentar se aquecer", afirma o guia Kim, sul-coreano.
Apesar de o roteiro em Paju tentar o tempo todo vender as versões sul-coreanas para o conflito, Kim, que prefere não revelar o sobrenome, tenta manter o equilíbrio.
Não acredita, por exemplo, nas explicações do seu país para o afundamento do navio militar Cheonan, em março, que matou 46 marinheiros e elevou as tensões entre Seul e Pyongyang.
"Muita gente aqui acha que foi um acidente, que o navio acertou rochedos e, por isso, afundou. As provas do governo são muito fracas, não convenceram", opina.
"Além do mais, aquilo foi a um mês das eleições locais. Pareceu uma manobra da situação para ganhar votos."
Do mirante de Paju, mantido pela ONU, é possível observar o país vizinho.
Filmar e fotografar é proibido. Ontem, porém, o céu estava nublado na região e nem a bandeira norte-coreana, içada no maior mastro do mundo, a 160 m, era visível daquele ponto.
Assim, as grandes atrações para os turistas eram visitar um dos quatro túneis escavados por norte-coreanos para invadir o sul, descobertos em 1978, e uma passagem rápida pelo mercadinho local. O motivo: é um dos únicos no país que vende Dae Dong, a cerveja norte-coreana. "É mais forte do que a nossa. Até os alemães gostam", diz Kim, sorrindo.
E, se há assunto mais escasso por lá do que Copa do Mundo, é a reunificação.
Apesar de o esporte ter servido como instrumento de aproximação entre os dois países, com as delegações desfilando juntas na abertura dos Jogos de 2000 e 2004, hoje o processo está paralisado. Uma seleção única?
"Não vou estar aqui para ver", lamenta Kim, enquanto coloca mais uma garrafa de Dae Dong na sacola.



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