São Paulo, sexta-feira, 19 de outubro de 2007

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XICO SÁ

Passa boi, passa boiada

Essa história do churrasco como prêmio até o cavalo de São Jorge sabe que é uma imoralidade bovina

AMIGO TORCEDOR, amigo secador, a diretoria do Corinthians dá um boi para não cair, mas os palmeirenses, os são-paulinos e os santistas dão uma boiada para ver o alvinegro no faroeste caboclo da Segundona. Essa história do churrasco, apenas um churrasco como prêmio, até o cavalo de São Jorge sabe que é imoralidade bovina diante de tanto dinheiro que passou pela lavanderia de Itaquera.
Passa boi, passa boiada e nem o mais ingênuo dos vegetarianos acredita que a saga de tirar o Timão do buraco mereça só costelas, fraldinhas, picanhas, alcatras... Ao ponto, mais para malpassadas, e a breja fica no pendura, no fiado.
Até porque a modernidade já roubou até a graça das velhas piadas de Vicente Matheus, o grande timoneiro. Hoje não tem mais riso quando se agradece à Antarctica pelas brahminhas que nos enviaram, chiste clássico do marido da dona Marlene.
É tudo da mesma casa. Donde se conclui que Matheus era um profeta, gênio que antecipou grandes fusões do mercado. Nuestro Nostradamus da zona leste, por supuesto.
E quis o destino, amigo, esse maestro do óbvio, que o Corinthians duelasse, na hora fatal, com um time que teve um boi como encosto. Sim, amigo, o corpo de Edgar Allan Poe só pode ter sido enterrado embaixo do campo dos Aflitos. Se não a caveira do escriba do corvo, pelo menos o cadáver de Carneiro Vilela, o Edgar local do folhetim "A emparedada da rua Nova" (1912), deve gritar até hoje sob aquela grama. No romance, Vilela nos relata o caso de uma jovem burguesa que havia sido engravidada pelo namorado, mancebo de balés-ralés, como diria Marcelino Freire, e, para encobrir a vergonha da nobre família, foi emparedada viva com filho e tudo no santo ventre.
É, amigo, quis o destino que o rival do alvinegro, domingo, fosse o Náutico, que passou 31 anos de fastios ludopédicos por causa de um boi. Hexacampeão estadual em 1968, osso duro para Santos de Pelé e garrinchosos Botafogos, a diretoria do Timbu esqueceu os orixás e a promessa que deveria ser paga: doar um boi para sacrifício no terreiro do pai Edu, famoso babalorixá de Olinda.
Até mandaram um boi, mas um boi meio prejudicado, um boi castrado, amigo, que os deuses que dançam no terreiro não receberam bem. Nessa brincadeira foram 19 decisões, só quatro títulos, e haja mortes na praia. Tantas que o time mereceu homenagem em HQ de Corto Maltese na qual o herói dos mares simula uma revolta das areias de Piedade. Sim, corintiano, os cartolas, reza a lenda, pagaram a promessa em 99. O que significa que o peso do boi agora está no Parque São Jorge e faz da peleja do domingo, no país em que boiada e churrascos decidem os destinos dos homens públicos e privados, o jogo caubói do ano. A sorte do alvinegro é que inventaram a expulsão do Acosta, que entende de cumbia e chorizo como nenhum de nós.

Área VIP & Senzala
Além de esperar o fim do dramalhão para ver as pelejas, agora a Globo vem com camarote VIP com a turma do rolex e do Projac. Haja novela no intervalo do jogo contra o Equador. Gente bonita, clima de paquera, como na paródia do viejo Alexandre Matias, que põe este pueblo para balançar a caveira.


xico.folha@uol.com.br

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