São Paulo, quinta-feira, 20 de março de 2008

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França volta atrás sobre boicote a Pequim-08

Para chanceler, economia supera os direitos humanos

MARCELO NINIO
DE GENEBRA

Depois de considerar "interessante" a proposta de boicotar a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim em protesto contra a repressão chinesa no Tibete e dizer que levaria a idéia aos demais membros da União Européia, o chanceler da França, Bernard Kouchner, voltou atrás.
A meia-volta foi explicada ontem com uma sinceridade raramente demonstrada pelos países do Ocidente quando o assunto são seus interesses na China. "Quando se lida com relações internacionais com países importantes como a China, obviamente são tomadas decisões econômicas à custa dos direitos humanos", disse Kouchner, complementando: "Isso é realismo elementar."
Na terça-feira, o chanceler francês havia elogiado a proposta feita pela organização Repórteres sem Fronteira, de boicotar a abertura dos Jogos de Pequim por causa da repressão no Tibete e desrespeito do país-sede a princípios elementares de direitos humanos.
O gesto, porém, não foi seguido por nenhum outro país da UE, onde assuntos de política externa freqüentemente causam calorosas discussões.
Desde o início dos distúrbios recentes no Tibete, os líderes europeus pouco falaram sobre o assunto, mas a UE deixou claro que não apoiaria um boicote total à Olimpíada, como pedem ativistas tibetanos.
Um protesto do bloco europeu à altamente simbólica cerimônia de abertura, marcada para o dia 8 de agosto, quando será acesa a tocha olímpica, seria um golpe significativo à imagem global chinesa.
Ontem Kouchner voltou a dizer que a idéia não é má, mas descartou o gesto. "Há muitas boas idéias que não podem ser postas em prática", disse o chanceler à rádio RMC.
A violenta repressão chinesa aos protestos no Tibete, os piores em quase 20 anos, colocou a Olimpíada de Pequim no foco dos grupos humanitários, que vêem nos Jogos a única forma de pressionar a ditadura comunista. Um dos fundadores da organização Médicos sem Fronteiras, Kouchner pode ter voltado atrás, mas sua idéia serviu de inspiração na UE.
O presidente do Parlamento Europeu, Hans-Gert Poettering, fez eco à declaração original do ministro francês, pedindo a políticos do continente que evitem comparecer à abertura da Olimpíada se a violência no Tibete continuar.
Kouchner, que foi expulso do Partido Socialista francês no ano passado ao aceitar fazer parte do governo do presidente Nicolas Sarkozy, alinhado à direita, preferiu ser pragmático. "Honestamente, é muito bonito falar de direitos humanos. Eu falei neles a minha vida inteira e vou continuar falando", declarou o chanceler, antes de concluir em sintonia com o realismo sarkozista. "Mas há dois lados na moeda."
Para o vice-presidente do comitê organizador da Olimpíada, Jiang Xiao, o boicote à abertura dos Jogos é idéia de "um grupo pequeno" e não deve ser levado a sério. "Acredito que a maioria das pessoas do mundo tomará a decisão certa", disse Xiao, em entrevista coletiva em Pequim convocada às pressas para abafar a iniciativa.


Com agências internacionais


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