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Racing: a academia não podia morrer
ROBERTO PETRI
especial para a Folha
Nada os atemoriza. Pode o sol
estar insuportável ou o frio, alguns graus abaixo de zero. Os
hinchas (torcedores) do Racing
Club (fundado em 25 de março
de 1903) não são tão fanáticos
como os do Boca, mas lembram
os fiéis corintianos.
Ganharam o último campeonato em 66 (quando foram buscar, pela primeira vez para o
futebol argentino, a Libertadores e o Mundial interclubes).
Estão amargando 32 anos de fila. Sofrem como condenados,
mas não deixam de respaldar
seus craques. Ano após ano.
Campeonato após campeonato
(agora se disputam dois títulos
em cada temporada): no primeiro semestre, o Apertura, no
segundo, o Clausura. O sofrimento tornou-se duplo.
Antes, nos primórdios, ninguém chegava perto em glórias
(nove títulos, sendo sete seguidos) e em técnica.
"La Academia" foi um apelido surgido em face da arte que
Ohaco, Olazar, Perinetti, Dela
Torre e tantos outros imprimiam a seu jogo. Depois viriam
os malabaristas Vicente Zito e
Chueco Garcia para infernizar
os zagueiros. Carlos Gardel, o
ídolo máximo do povo, frequentava as tribunas para
aplaudir tantos fenômenos. No
amadorismo, o Boca (seis títulos) e o River (um) não eram o
que são hoje. O Independiente
(dois) transformou-se em inimigo de bairro (Avellaneda), e
a rivalidade persiste.
Pois bem. O Racing quase foi
à leilão. Faliu. Estava em processo de dissolução. Acontece
que o brado dessa torcida sofrida foi bem mais forte. Sensibilizou toda a nação e, principalmente, o hoje "hincha" número
um do River, Carlos Saul Menem. Para evitar linguagem jurídica, quebrou-se o galho.
O Racing, que não participou
da rodada de abertura, já jogou no domingo último, em
Rosario, perdendo para o Central, colocando 15 mil pagantes
a mais no estádio. Por um ano
a questão foi resolvida. As dívidas somam mais de US$ 50 milhões, e a torcida ajudará a pagar (tem clube por aqui devendo mais e não fecha). Não há
quem duvide da total recuperação, moral e financeira.
Amanhã, em seu estádio Presidente Peron (o caudilho e
Evita amavam também as cores celeste e branca), joga-se o
clássico contra o Independiente
(considerado o segundo em importância, só perdendo em
prestigio para River x Boca), e
a expectativa é de um verdadeiro retorno. Quem sabe de
gala. Os heróis do tricampeonato profissional (49, 50 e 51),
tipo Mendez, Rubem Bravo, Simes, Sued e cia não estarão em
campo, o que seria prenúncio
de vitória garantida, mas os
Latorre, Delgado, Ubeda, Ruben Capria atuais por certo entrarão com a alma dos antepassados a empurrá-los. Que
seja um jogaço, sem violência
(fora e dentro do campo), coisa
que está acabando com o glorioso futebol portenho.
Nunca esquecendo que muitos
brasileiros honraram essa camisa: João Cardoso (campeão
mundial interclubes em 66),
Dorval, Luís Cláudio, Batista e
outros ex-santistas. Lembrando, também, que um amistoso
entre Racing e Santos, na década de 60, é considerado por
quem viu como o mais belo jogo
internacional entre clubes já
realizado na Argentina.
Por essas e mais outras que até
Pelé se diz torcedor do Racing e
ficou feliz com a última decisão
da Justiça argentina.
Roberto Petri é comentarista da ESPN-Brasil e
CBI, especialista em futebol argentino
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