São Paulo, domingo, 20 de setembro de 1998

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Lusa, favorita pela primeira vez no clássico

ALBERTO HELENA JR.
da Equipe de Articulistas

Esta é uma das raras vezes na história desse clássico em que a Lusa entra em campo como franca favorita diante do São Paulo. Não só porque o time de Candinho vem jogando o fino, como, sobretudo, porque o tricolor está caindo pelas tabelas, literalmente, tanto do Brasileiro quanto da Mercosul.
É bem verdade que a volta de Carlos Miguel, contra o Colo-Colo, no meio da semana, deu certa consistência ao lado esquerdo do setor de armação da equipe, embora a presença de Marcelinho, no seu lugar, tenha conferido maior velocidade e contundência por ali, além de reincorporar o lateral Serginho ao jogo, o que não é pouco.
Por mim, jogariam os dois.
Agora, não me perguntem o que fazer com o miolo de zaga, onde Rogério, Márcio Santos e Bordon, quanto mais se revezam, mais abrem uma clareira na marca do pênalti, onde os adversários montam acampamento e fazem a festa.
Dia sim, dia não, alguém me cobrava se havia visto o filme de Ugo Georgetti, "Boleiros". Envergonhado, confessava minha falha, fruto, entre outras coisas, de meu auto-exílio nas matas de Ibiúna.
Outro dia, recebi a fita de "Boleiros", com gentil recadinho do diretor, que aprendi a admirar anos atrás, quando, por acaso, assisti na TV seu magnifico "A Festa", num desempenho antológico do meu velho amigo, tricolor fanático, Adriano Stuart.
Ao falar de Adriano, lembro-me de Fellini, que, certa ocasião, referindo-se a Marcello Mastroianni, qualificava-o como o ator perfeito, pois o ator perfeito era que nem cavalo de terreiro de candomblé, que incorpora o personagem como se fosse uma entidade.
Adriano é um cavalo de candomblé, nascido não num terreiro, mas num picadeiro de circo. Potrinho ainda, lá pelos seis, sete anos, ao lado de outro velho amigo que teve o juízo de virar filósofo, depois de adulto -David José-, Adriano dá um show de interpretação em "O Sobrado", de Walter George Durst.
Escolado na pioneira TV Tupi, sob a direção de Cassiano Gabus Mendes, pai do Cássio e do Tato, formou-se num time campeoníssimo, com Lima Duarte, Luís Gustavo, Dionísio Azevedo, todos ostentando a gloriosa camisa tricolor.
E é como um ex-craque do São Paulo que Adriano abre um papo de botequim, onde rolam as histórias de "Boleiros", na mais pura linhagem das comédias italianas de 50 a 70, em vários episódios amarrados por um fio condutor. Aquelas, que, no fim da gargalhada, resta um travo de amaretto.
Os personagens são tão reais como os diálogos, do paulistês da maioria ao pernambucano do craque que veio do Náutico para o Palmeiras da Academia. E aquele pivete misterioso, que surge e desaparece da escolinha de futebol como surgem e desaparecem os milhares de pivetes nos cruzamentos das nossas ruas? Sabe tudo, sentencia Adriano, com o olhar no futuro, resgatando o futebol do passado, congelado na memória.
Resumindo: é um filme que vai rolar nas mesas de botequim, daqui para sempre, como a bola dos sonhos de cada um de nós.


Alberto Helena escreve aos domingos, segundas e quartas-feiras


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