São Paulo, quarta-feira, 21 de março de 2001

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Lateral do Vasco competiu no ano passado sem a documentação exigida

Clube dos 13 encobriu irregularidade na JH

Entidade confirma que tinha conhecimento do problema de Jorginho Paulista e que não tomou providências; clube não chegaria à decisão se tivesse perdido os pontos

FERNANDO MELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

O Clube dos 13 abafou um escândalo que teria tirado do Vasco, de Eurico Miranda, o título da Copa João Havelange, sua quarta conquista nacional.
Com a ciência da entidade que reúne os 20 maiores times do país, o time de São Januário escalou o lateral-esquerdo Jorginho Paulista de forma irregular em pelo menos quatro partidas da Copa JH, torneio organizado pelo Clube dos 13 em substituição ao Brasileiro do ano passado.
Se o CBDF (Código Brasileiro Disciplinar de Futebol) tivesse sido cumprido, o Vasco teria que ter perdido 20 pontos, estaria fora da segunda fase do Nacional-2000 e não teria conquistado o título -teria terminado a primeira fase em 24º lugar, à frente de Corinthians e Santa Cruz, e daria sua vaga no mata-mata ao Guarani, que terminou na 13ª colocação.
Questionado pela Folha, o presidente da entidade que reúne os 20 maiores times do país, Fábio Koff, admitiu que soube que Jorginho Paulista estava irregular em parte da Copa JH.
"O que soube, por informações extra-oficiais, é que ele jogou algumas partidas sem estar devidamente regularizado. Mas não sei por quanto tempo isso durou e, se no próprio curso da competição, o Vasco não regularizou sua situação", disse o dirigente gaúcho, em entrevista por telefone.
O principal problema com a documentação de Jorginho Paulista teria sido o fato de que a Udinese, seu ex-time, não encaminhou ao Vasco a liberação do jogador, uma vez que ele foi expulso da Itália por ter atuado com passaporte europeu falso.
Mesmo sem estar com a documentação pronta, o jogador atuou contra Gama, Goiás, Flamengo e Coritiba. Na final da JH, o lateral-esquerdo, que atuou 14 vezes no torneio, acabou marcando um gol contra o São Caetano.
Foram duas as justificativas dadas por Fábio Koff para que o Clube dos 13 não tenha agido para punir o clube de Eurico. A primeira foi a de que a entidade, ao perder o Comitê de Penas -órgão criado inicialmente para substituir o Tribunal de Justiça Desportiva nas questões judiciais da JH e que acabou extinto-, não tinha competência para julgar o caso.
"Não tomamos nenhuma atitude porque não éramos órgão judicante, isso não era competência nossa. Deixamos de sê-lo com a exclusão do Comitê de Penas. Toda a postulação deveria ter sido encaminhada ao TJD. Não éramos nem instância inferior, só podíamos aplicar a suspensão automática em caso de cartões amarelos ou vermelhos."
A segunda justificativa foi a de que não houve nenhum pedido formal de qualquer clube interessado na punição ao Vasco.
"O que recebemos foi um ofício de pessoa física do advogado Paulo Goyaz (vice-presidente do Gama) pedindo a punição ao Vasco também por ofício. Não houve recurso formal de um clube a nós. Houve solicitação de informações, uma consulta. Respondi que o acesso a esta informação deveria ser obtido na CBF. Encaminhamos o caso ao nosso Departamento Jurídico, mas entendemos que o prazo para reclamar, de cinco dias úteis após o jogo, já estava esgotado."
A interpretação de que o "crime" cometido pelos cariocas já estava prescrito não é compartilhada por especialistas em direito esportivo ouvidos pela Folha.
Para Marcílio Krieger, o Clube dos 13 não tinha competência para decidir o caso sozinho. "Só o TJD poderia julgar se o prazo para reclamação havia expirado ou não. No meu entender, até que o resultado do jogo seja homologado, o clube que se sentir lesado pode reclamar", declarou o advogado catarinense.
Além do Clube dos 13, outras três equipes -Gama, Goiás e Coritiba- receberam a informação, dada de forma extra-oficial por funcionários da CBF, de que o vascaíno não estava com sua situação regularizada no Departamento de Registro da entidade que comanda o futebol brasileiro.
Temendo ser prejudicados por Eurico Miranda, então vice-presidente do Vasco, as três equipes recuaram e preferiram, como o Clube dos 13, abafar o caso Jorginho (leia texto nesta página).
Questionado se o Clube dos 13, como organizador do torneio, não tinha a obrigação de requerer à CBF a situação oficial de Jorginho Paulista, Koff disse que o problema não era da entidade.
"Se é justo ou não um clube ser campeão com um jogador irregular, acho que não cabe a mim responder. Essa pergunta tem que ser feita ao TJD ou à CBF, que tinha em mãos todos os documentos do jogador", disse o dirigente, que defendeu a desburocratização no futebol, com a criação de comitês que possam agir com rapidez em questões jurídicas de determinados torneios.
Além das justificativas dadas por Koff, a Folha apurou que outros três motivos foram fundamentais para o "arquivamento" do caso Jorginho Paulista:
1) A entidade não queria tumultuar o torneio, que certamente seria paralisado na Justiça.
2) Havia o temor da reação de Eurico Miranda, então vice-presidente do Clube dos 13 e do Vasco.
3) Irritado com a perda do Comitê de Penas, criado no início do torneio para julgar os casos de indisciplina na Copa JH e depois extinto por pressão do Tribunal de Justiça Desportiva-, o Clube dos 13 resolveu "lavar as mãos" e deixar que o caso estourasse -se estourasse- no TJD.


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