São Paulo, quarta-feira, 21 de agosto de 2002

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FUTEBOL

Não é de ninguém

JORGE KAJURU
ESPECIAL PARA A FOLHA

Tenha cuidado para dizer "nunca mais". Desde a Copa do Mundo de 1986, disputada no México, perdi o encanto que tinha pelo futebol. Já se foram 16 anos. De seis para cá, analiso qualquer jogo com a pura isenção de um turista chegando ao estádio do Maracanã.
Só me emociono com um grande time, com uma bela jogada.
Especialmente vibro quando vejo um drible de caneta ou um chapéu bem dado, daqueles que Reinaldo dava como se estivesse penteando o cabelo de Abel.
Admirava tanto a habilidade de Ademir da Guia que bastava o Divino tocar na bola para derramar meu choro de suspiro.
Pensava neste agosto: a quanto tempo não me batia aquela vontade de ver o teipe de um jogo assistido no mesmo dia?
Quantas vezes não saíamos do Palestra, do Pacaembu ou do Morumbi e uma hora depois estávamos em casa revendo - com Walter Abraão e Geraldo Bretas na Tupi - aquela mesma partida. Valia a pena!
Porque será que o futebol me deixou tão glacial? O fora de campo enoja tanto? Ou será que dentro de campo foi-se embora o brilho desta paixão?
A música que esvazia qualquer angústia consegue, ao contrário da bola, me levar prazerosamente ao bis. Chego a ouvir dez vezes seguidas "Teresa da Praia", com Dick Farney.

É fértil. É nosso!
O atual Campeonato Brasileiro tem feito coisas comigo que até mesmo Deus duvida.
Por motivos de saúde, tenho visto quatro, cinco, até seis jogos por rodada. Controle remoto e salve o pay-per-view.
Domingo foi o dia. Parecia aquele menino suspirando nos tempos da Academia.
O primeiro tempo da partida entre Corinthians e São Caetano merecia videoteipe durante a semana inteira. Um esquema tático bem montado pelo técnico Mário Sérgio, cumprido de forma militar pelos jogadores da equipe do ABC, com direito a flashes da Imperatriz Leopoldinense.
O desfile poderia ter encerrado o primeiro tempo em 6 a 2, sem nenhum exagero da minha parte. Mário Sérgio tem cabeça para organizar qualquer time nas quatro linhas do gramado. Sabe fazer o tempero. Se melhorou o temperamento, é treinador para chegar à seleção brasileira.
No sábado, foi lindo explodir com os dois gols de Romário.
Ser dono de um pequeno pedaço de terra (grande área) é tudo aquilo que um pobre atacante deseja. Romário é dos poucos no mundo que sabe valorizar esse dom divino.
E ainda teve Kaká com suas jogadas de menino, de pelada, de praia, de várzea.
Não me entusiasmo com nada que possa vir a me faltar amanhã, mas aprendi que, no futebol, o futuro ao Brasil pertence.
Em nenhum outro lugar do mundo vão nascer craques com tanta fartura.
No mesmo filme veio a última Copa do Mundo, no Japão e na Coréia do Sul. De imediato, torna-se impossível esquecer gols de bico (marcado por Ronaldo), de falta (de Ronaldinho), e o de Rivaldo contra a Bélgica.
Ah! Como é bom escrever um artigo e nem se lembrar dos cartolas. Aliás, eles existem?
O verdadeiro futebol brasileiro é como a "Teresa da Praia". Não é de ninguém.

Também ganhei
Ops! Valeu, seu Zazá. Eu também sou pentacampeão mundial. Comentei a Copa daqui. Em 1994, fui mais tetra ainda porque estive lá, comentando e cobrindo tudo nos Estados Unidos.

"Pentas" e penta
Só levando na boa ironia a leitura da entrevista do técnico Zagallo, na qual, de modo justo, se mostrou orgulhoso caso receba a homenagem para ser o técnico da seleção no último jogo amistoso que a equipe fará nesta temporada, em novembro, encerrando suas atividades no ano -a CBF ainda está definindo o adversário. Até aí, nada mais coerente. Massageando o ego, o Lobo soltou: "...Eu participei dos cinco títulos mundiais do Brasil. Dois como jogador, um como treinador, um como coordenador e um, agora, como comentarista." Temos mais "pentas" do que penta.

E-mail kajuru@terra.com.br


Tostão, em férias, volta a escrever neste espaço em 4 de setembro



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