São Paulo, segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

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Teste para a Copa falha na segurança

Maior clássico sul-africano vira laboratório para o Mundial, mas cambista e maconha ficam incólumes perto da polícia

Duelo no Soweto atrai cerca de 40 mil pessoas, e guardas ficam focados em impedir que torcida ocupasse as escadarias da arquibancada


FÁBIO ZANINI
DE JOHANNESBURGO

Para os torcedores que acabaram lotando o Orlando Stadium, o maior clássico do futebol sul-africano valia muito pouco, além de uma oportunidade de fazer soar vuvuzelas, vestir máscaras e chapéus berrantes, cantar e dançar.
Para os organizadores da Copa de 2010, o "dérbi do Soweto" de anteontem, realizado no famoso distrito de mesmo nome em Johannesburgo, teve importância muito maior. Foi um dos últimos grandes testes esportivos no país antes do começo do Mundial, em junho.
Cerca de 40 mil pessoas enfrentaram sol forte para o que pode ser chamado de o Fla-Flu da África do Sul: Orlando Pirates contra Kaizer Chiefs, vizinhos e arquirrivais do bairro, com torcidas que se equivalem no fanatismo.
Foi, pela primeira vez em muitos anos, um dérbi que começou com ambos os lados sem chance de erguer o título sul- -africano. E que terminou num 0 a 0 condizente com um jogo morno no campo, embora pelando nas arquibancadas.
Apesar de uma impressão geral de ordem e tranquilidade, a reportagem presenciou falhas de segurança, mesmo com o grande número de policiais em serviço. Cambistas operavam discretamente perto da entrada principal do estádio, a poucos metros das autoridades.
Um deles, de chapéu verde usado em safáris e forte bafo de cerveja, aproximou-se, primeiro perguntando ao repórter se tinha algum ingresso sobrando para doar. "Quero muito ver futebol hoje, cara, muito..."
Após receber a resposta negativa, revelou a verdadeira intenção. "Não quero de graça. Eu pago 20 rands [R$ 5]."
Nova negativa, e ele deu a última cartada. "E comprar, quer? Te vendo por 100 rands." Mais do que o dobro do preço da bilheteria, 40 rands.
Em cerca de meia hora, foram três abordagens semelhantes. Tudo a menos de cem metros de meia dúzia de policiais que acompanhavam a movimentação sonolentamente. "Por enquanto, sem ocorrências", disse o oficial Matobe.
O "perímetro de segurança" ao redor do estádio, que deve ser aplicado na Copa, também falhou. Garotos vendiam bebidas e cigarros na entrada principal, sem ter autorização.
O Orlando Stadium, mais tradicional dos estádios sul-africanos dedicados ao futebol, foi submetido recentemente a uma reforma e deve ser utilizado como campo de treinamento durante a Copa do Mundo.
O clássico tinha sabor de teste também porque Irvin Khoza, presidente da liga sul-africana de futebol, que promove o campeonato nacional, é ao mesmo tempo chefe do comitê organizador do Mundial-2010.
A chegada e a saída de torcedores não foram um problema na partida. Muitos deles recorreram a um novo sistema de corredores de ônibus que é a grande aposta para desafogar o trânsito em Johannesburgo.
Quem chegou de carro pelas largas avenidas que dão acesso ao estádio enfrentou pouco congestionamento e conseguiu parar facilmente nos vários bolsões ao lado do estádio, pelo modesto preço de 20 rands.
No interior do Orlando Stadium, havia conforto para as multidões sentadas em cadeiras individuais e um sistema de rampas escoando facilmente os torcedores. Os banheiros mostravam-se relativamente limpos. E notou-se a ausência quase total de violência, apesar da cerveja consumida em grande escala em copos de papelão.
Porém, em diversos pontos do estádio, sentia-se cheiro de maconha, outra brecha evidente no esquema de segurança.
Além disso,o controle de circulação era mínimo, e o acesso ao campo, fácil demais. Para chegar ao gramado, sem ninguém importunar com pedidos de credencial, era preciso apenas pular uma corrente de menos de meio metro de altura e avançar por um corredor.
Guardinhas barrigudos e já passados da meia-idade preocupavam-se mais em impedir que torcedores exaltados ocupassem as escadarias das arquibancadas. A cada invasão, ainda que mínima, vinha o pito e uma cara feia. "Tem gente que não entende, mesmo você falando de um jeito simpático", disse Peter, um dos bedéis de torcida.


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