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JOSÉ ROBERTO TORERO
Ah, amado amante...
É aquele com desempenho físico exuberante, faz jogadas diferentes, penetrações imprevisíveis, surpreende
FIEL LEITOR , leal leitora, eis um
fato incontestável: há jogadores que nasceram com vocação para amantes.
Não, não estou falando que eles
nasceram para o adultério, para os
encontros furtivos com mulheres
casadas em motéis de cortinas lilases e abajures vermelhos.
Explico melhor: o jogador-amante é aquele reserva que só entra na
partida de vez em quando, mas aí
põe fogo no time.
Vários ficaram famosos por seguir
este roteiro: entravam no segundo
tempo e, diante de marcadores
exaustos, nos maravilhavam com
gols acrobáticos e jogadas galantes.
Naqueles poucos instantes, o jogador-amante mostra um desempenho físico exuberante, faz jogadas
diferentes, penetrações imprevisíveis, surpreende. Quantas vezes a vitória não veio de seus pés ágeis e de
seus chutes certeiros?
Depois de ver tal eficiência, não
poucos torcedores se deixaram levar
pela sedução dos amantes e sonharam em transformá-los em maridos,
ou seja, titulares absolutos.
Foi o sonho de muitos, foi a desilusão de tantos. Quem nasceu para libélula não suporta ser formiga. Escalados desde o princípio, os amásios murcham ao se verem diante
das enfadonhas obrigações táticas e
no jogo seguinte acabam voltando
para o banco. Sua especialidade são
aqueles poucos minutos, aquela
meia hora especial e única.
Todos os times já tiveram jogadores-amantes em suas fileiras. E eles
são muito úteis. A sabedoria manda:
não dispense os maridos; de vez em
quando, recorra aos amantes.
O exemplo mais claro talvez seja
Escurinho. No Palmeiras, mas principalmente no Internacional, ele entrava e fazia a diferença. Porém, se
começasse jogando, não era assim
tão virtuoso. Escurinho não era um
jogador para o ramerrame de uma
longa partida. Sua especialidade era
coruscar num instante fugaz.
Há exemplos em outros clubes. Os
corintianos com mais de 40 se lembrarão de Adãozinho. Os palmeirenses de 30, de Euller. Os santistas de
20, de Basílio.
Os motivos que justificam estes
amantes são vários. O primeiro que
me vem à cabeça é a velocidade. Em
geral, os jogadores-amantes são
muito rápidos e, assim, se saem
melhor quando pegam um marcador já cansado. Se entram no começo da partida, enfrentam atletas com
todo o gás e não conseguem fazer
milagres, não conseguem aquele
meio metro de vantagem que permite o chute tranqüilo ou o cruzamento perfeito. E, no final do jogo,
quando costumam dar seu show, já
estão exaustos.
Outro motivo, que me foi dito pelo
técnico Pepe há algum tempo, é que
alguns jogadores só entendem a partida ao vê-la de fora. Aí, depois de observar seus pares do banco, ele sabe
por onde ir, qual o ponto fraco do
marcador, como estão seus companheiros etc... Mas, se ele começa o
jogo dentro do campo, não consegue
enxergar estas sutilezas, não consegue ver os atalhos do campo.
Boa parte dos jogadores-amantes
tem uma certa altivez ao vestir o
colete de reservas. Chegam a sorrir
intimamente. Sabem que mais cedo
ou mais tarde serão chamados e
então, em poucos minutos, farão sua
mágica de novo: a jogada rápida,
o gol, o estádio explodindo de felicidade.
Outros, porém, sofrem secretamente. Sonham com a estabilidade
de jogar os 90 minutos. E mais os
acréscimos. Sonham em se aquecer
dentro de campo, em dar entrevistas
no intervalo. Sonham em jogar todo
o tempo, mas com a mesma intensidade de um jogador que só participa
de um pedaço da partida. Querem
ter, simultaneamente, as qualidades
de amante e marido. Mas isso é difícil de conseguir. Quase impossível.
As mulheres e os técnicos que o
digam.
torero@uol.com.br
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