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SONINHA
Seleção "brasileira"
Um jogador, mesmo nascido aqui, que constrói carreira
fora do país pode ser um dos melhores do futebol brasileiro?
ESTÁ CADA vez mais difícil saber o que é e para que serve
uma seleção nacional.
Ela deve reunir os melhores (e o
técnico que faça dar "liga") ou deve
ser o melhor conjunto possível,
mesmo que deixe algum medalhão
de fora? É impossível fazer as estrelas se empenharem tanto quanto
um jogador menos talentoso? Os
craques já não dão o mesmo valor à
"amarelinha" agora que a meca é um
time de ponta da Europa? O objetivo
da seleção é ganhar todos os títulos,
ou alguns torneios servem apenas
como preparação para a Copa? Os
amistosos são uma boa chance para
testes ou a melhor ocasião para entrosar o time "principal"?
Esses problemas já são "velhos".
Uma dúvida nova me ocorre com a
última convocação do Dunga, e tem
a ver mais com o conceito de "nacional" do que o de "seleção".
De uns tempos para cá, tem sido
comum um jogador se naturalizar e
defender a seleção de outro país. Na
última Copa, havia brasileiros vestindo camisas de todas as cores.
Isso sempre me pareceu apelação
sem cabimento. Times podem ser
mistos, verdadeiras seleções transnacionais. "A" seleção, não. Cada um
que reúna o melhor do seu país (resolvidos os dilemas acima...) e não
pesque em águas territoriais alheias.
O Brasil tem o melhor futebol do
mundo. Quem quiser nos fazer frente que invista na sua própria horta.
Aí veio a convocação do Afonso, de
quem a maioria de nós apenas ouviu
falar (ou nem isso). Para saber quem
é, é preciso assistir TV a cabo, dar
uma busca no Google ou esperar os
jornais do dia seguinte. Afonso deixou o Atlético-MG aos 21 anos, sem
causar muita comoção. Desde 2002
joga na Europa; na Suécia, chegou a
ser cogitado para a seleção... sueca.
Agora, seu desempenho no Heerenveen o credenciou a uma vaga na
seleção brasileira. Mas o quanto
Afonso deve sua convocação ao Brasil, ao futebol brasileiro?
Ele nasceu aqui, pegou gosto por
futebol aqui, fala português, cresceu
admirando jogadores brasileiros.
Mas está sendo convocado pelo que
joga na Holanda! Caso seja mesmo
um grande jogador, como é possível,
pode ser considerado um dos maiores expoentes do futebol brasileiro?
O que vale é o lugar onde a pessoa
nasceu ou onde construiu sua vida?
Quando um imigrante é feliz na
nova terra, ele naturalmente adota a
nova nacionalidade, independentemente de papéis e carimbos. Meus
avós portugueses não negavam a
origem (como poderiam?), mas se
consideravam superbrasileiros. Um
brasileiro que faz a vida lá fora continua brasileiro, mas a sua carreira é
"brasileira"? A convocação deve ser
pelo critério berço ou carreira?
Afonso não saiu daqui muito cedo.
E quem vai embora aos 15 anos? Poderá ser convocado para defender o
Brasil, sem nunca ter vivido o futebol profissional brasileiro?
Não quero parecer xenófoba contra nossos próprios conterrâneos.
Aliás, quando dizem "tem de convocar só quem joga aqui!", sou radicalmente contra. Mas essa situação, em
que somos apresentados a alguns
brasileiros já na seleção, me fez mudar de idéia a respeito de selecionados mistos. Nesse mundão sem
fronteira, talvez o lugar de atuação
conte mais do que de origem. Afonso
surpreenderia menos se estivesse
na seleção sueca ou holandesa.
soninha.folha@uol.com.br
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