São Paulo, domingo, 22 de junho de 2008

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JUCA KFOURI

Ei, Dunga, pede pra sair!


O capitão de 1994 não pode se desfazer de seu maior patrimônio, a autenticidade.
E não deve se curvar


MEU CARO Dunga, acabou. Não é possível que você, depois de ter sido crítico da geração da Copa do Mundo de 1982 e, coerente com seu equívoco, ter estendido o raciocínio para craques como Kaká e Ronaldinho Gaúcho, vá agora aceitar passivamente uma convocação enfiada goela abaixo. Seu chefe nem fez questão de disfarçar, como nas vezes anteriores, nos episódios com Romário, que Parreira acatou em 1994, e com o mesmo Baixinho, em 2002, que Felipão repeliu.
Claro, Dunga, Felipão era o salvador da pátria, tinha mesmo carta-branca e podia peitar a chefia. Nem você tem nem Parreira, então, a tinha. E fica até gozado ver Parreira dizer que não foi o patrão quem impôs Romário, porque isso "fugiria do estilo de Ricardo Teixeira", depois que o país viu o presidente da CBF, na TV, em horário nobre, fazer a convocação de Ronaldinho.
Antes, ao menos, ele era mais discreto. Agora, nem isso, sabe que é o Rei Ricardo 1º, o Único. E sabe onde foi que você errou, caríssimo Dunga?
Errou ao aceitar um cargo para o qual não estava preparado, porque ninguém pode começar pelo topo -nem mesmo Paulo Roberto Falcão, mais gabaritado, pôde.
Franz Beckenbauer é algo único, gênio, não serve como exemplo, porque é a exceção da regra. Claro que é compreensível que você se deixasse cair em tentação, mas os primeiros resultados, principalmente aquela vitória de 3 a 0 sobre a Argentina em seu segundo amistoso, levaram à arrogância, ao desatino, à falta de educação, a ponto de o assessor de imprensa da CBF entregar você às feras com comentários maldosos e com endereço certo para serem vazados por quem não tem rabo preso.
A conquista surpreendente da Copa América, então, parece ter dado a você a convicção de que poderia tudo, e não era verdade. Pois se é verdade que você tem o mérito de tratar igualmente mal a todos e não dar preferência a ninguém, o que, você tem razão, fere muitos interesses e apressa sua queda, você poderia, ao menos, não ter fustigado os craques que você fustigou sem piedade.
Saiba que não tenho o menor prazer em dizer nada disso, até porque o que deve vir adiante será, ao menos do ponto de vista das relações humanas, da pior qualidade possível, com a volta do compadrio e das convocações suspeitas, embora, neste último quesito, algumas das suas, você sabe, tenham sido nebulosas.
Mas, ao menos, nunca ninguém viu você trocando beijos com jornalistas e/ou mesmo com cartolas. Como me agrada ouvi-lo chamar Ricardo Teixeira de Ricardo Teixeira e não de doutor, o que ele não é nem aqui nem na China, país para onde quer levar o Ronaldinho mesmo que você não queira.
Diga-se, aliás, que até o Felipão tratava o homem como doutor.
É isso, meu caro.
Sei que nossas relações, que começaram tão bem em 1990, quando você fez o "Diário da Copa" para "Placar", estarão irremediavelmente comprometidas depois de mais esta coluna, mas é o que, francamente como sempre nos demos, achei que deveria lhe dizer.
E lamento ter de fazê-lo.

blogdojuca@uol.com.br


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