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ENTREVISTA
ORLANDO SILVA JÚNIOR
"A modéstia deve nortear a preparação de estádios da Copa"
Ministro do Esporte diz que o governo federal não irá desembolsar R$ 1 para arenas e que comete engano quem pensa que Mundial de 2014 irá resolver todos os problemas das 12 cidades-sedes
Fotos Ricardo Nogueira/Folha Imagem
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O ministro Orlando Silva Jr., durante entrevista concedida na Embaixada do Brasil na África do Sul
EDUARDO ARRUDA
PAULO COBOS
ENVIADOS ESPECIAIS A PRETÓRIA
O BRASILEIRO saberá quanto a Copa do
Mundo de 2014 vai custar para o governo
federal até o fim do ano. Quem diz isso é o
ministro do Esporte, Orlando Silva Jr., 38,
em entrevista concedida à Folha em Pretória, onde
foi se encontrar com organizadores do Mundial de
2010. Silva Jr. prega que os estádios brasileiros devem ter um "padrão modesto", sem a ostentação de
alguns projetos atuais. E volta a garantir que o governo federal não investirá na construção ou na reforma de arenas. Mas diz que, se o Rio receber a
Olimpíada em 2016, o tratamento será outro.
FOLHA - A África do Sul está fazendo uma Copa com gastos modestos
[a estimativa é de US$ 3,5 bilhões].
Por que o Brasil vai gastar tanto?
ORLANDO SILVA JR. - Não esperemos que a África faça um Mundial como a Alemanha, assim
como não esperemos que o
Brasil faça uma Copa como a da
África. A realidade de cada país
vai moldar a Copa. O que o Brasil fará é otimizar os recursos,
sem gastar rios de dinheiro.
Pretendemos fazer investimentos necessários para que os
estádios tenham segurança e
conforto, e as cidades tenham
bons sistemas de transporte,
acomodação e segurança.
FOLHA - É justo tirar dinheiro de todos os contribuintes para colocar só
em 12 cidades?
SILVA JR. - Todos os contribuintes serão beneficiados. Com a
Copa, teremos mais investimento privado girando na economia do que recurso público.
A Copa funciona como medida
anticrise. Vai ajudar o Brasil a
acelerar seu crescimento.
FOLHA - O senhor crê em investimento para transporte e aeroportos
ou essa conta vai ser só do governo?
SILVA JR. - Eu acredito que a Copa terá investimento público e
privado. O Brasil já desenvolveu modelos interessantes para
atrair o setor privado. Vou dar
um exemplo concreto: o sistema de concessão de rodovias.
Por outro lado, eu admito a hipótese de que haja financiamento público para determinados projetos. Mas, na minha cabeça, isso é uma operação bancária, não é dinheiro direto do
Tesouro. O dinheiro público,
sobretudo, deve ser investido
em obras de infraestrutura.
FOLHA - O que a Fifa pede nesse
sentido?
SILVA JR. - A Fifa nos indicou
que é muito importante investir em aeroportos. Há muitas
cidades que têm seus terminais
funcionando no limite de operação. Vamos precisar ampliá-los. Em outros, precisamos ampliar as pistas. Também temos
interesse nos portos. Não imaginemos que a pessoa vai construir um hotel apenas para a
Copa. Se você tem terminal de
passageiros nos portos, você
pode permitir um conjunto de
transatlânticos circulando pelo
país, com leitos temporários,
para suprir as acomodações.
FOLHA - O senhor admite financiamento do BNDES para os estádios?
SILVA JR. - Essa pergunta deveria ser feita ao Luciano Coutinho, que é o presidente do banco. O BNDES tem critérios técnicos muito rigorosos. E o banco tem uma equipe de análise
de risco muito firme. Se pode
ter ou não, vai ser analisado na
medida em que os interessados
passarão por esses critérios.
FOLHA - Dinheiro para os estádios
vai ter?
SILVA JR. - Do governo federal,
não.
FOLHA - E se...
SILVA JR. - Já ouvi que há governo estadual que se interessa em
construir ou reformar estádio.
Esse é um tema que está fora da
pauta do governo federal. Nos
Jogos Pan-Americanos, houve
dinheiro do Tesouro para instalações, mas não haverá R$ 1
para estádio de futebol.
FOLHA - E se chegar uma hora em
que vão falar: "Se não tiver dinheiro
do governo, não vai ter estádio'?
SILVA JR. - Essa hipótese não
existe.
FOLHA - Como o senhor pode garantir isso?
SILVA JR. - Veja, desde que a Fifa
escolheu as cidades-sedes, temos feito um trabalho para firmar uma matriz de responsabilidade, um pacto entre o governo federal, os Estados e as prefeituras. E, nessa matriz, vai estar explícito que o governo federal não tem nenhum compromisso com qualquer investimento para estádios. As cidades apresentaram projetos e
vão ter que sustentá-los.
FOLHA - O fato de o Tribunal de
Contas da União ter apresentado
várias irregularidades na gestão do
dinheiro público tem a ver com isso?
SILVA JR. - Não. O Brasil tem
leis, critérios, e a administração
tem que segui-los. A restrição
em relação a estádios é um conceito. Já fui mal interpretado
pela seguinte opinião: o governo tem mais o que fazer do que
cuidar de estádio. Quando se
tem um duto público financiando aquela instalação, a
preocupação com a sustentabilidade acaba sendo menor.
FOLHA - Não há exagero em estádios como o de Manaus, por exemplo, para 60 mil pessoas?
SILVA JR. - Defendo que os estádios sejam modestos e que se
cumpram os critérios adotados
pela Fifa, que já é um padrão
superior ao brasileiro hoje.
FOLHA - Então, há exagero?
SILVA JR. - Defendo que a modéstia seja o padrão para a preparação dos estádios. Assim,
não teremos riscos de elefantes
brancos, de estádios enormes
com utilização uma vez por
ano. É preciso levar em conta o
perfil de cada cidade sob o ponto de vista do futebol.
FOLHA - E o Morumbi, é um problema?
SILVA JR. - Até onde sei vai ser o
estádio de São Paulo na Copa. É
o estádio que a Fifa tem referência, mas precisa de ajustes.
O projeto foi criticado pela Fifa,
e Juvenal Juvêncio [presidente
do São Paulo] me disse: "Farei
as modificações que a Fifa exigir para atender aos critérios
para a abertura do Mundial".
Palavras dele. Não vejo como
problema, vejo como solução.
FOLHA - São Paulo comporta outro
estádio?
SILVA JR. - Qualquer discussão
fora o Morumbi é extemporânea. Sei que o Corinthians quer
construir seu estádio, mas não
seria para a Copa do Mundo.
FOLHA - Se o PT e seus aliados perderem a eleição de 2010, a Copa pode ser afetada?
SILVA JR. - Se um candidato de
fora da base aliada ganhar a
eleição, não tenho preocupação
com a Copa. O Brasil tem estabilidade democrática. Os documentos que o presidente Lula e
os governadores assinaram
mostram compromisso com a
Copa. E nenhuma eleição vai
atrapalhar isso.
FOLHA - Quando era ministra do
Turismo, Marta Suplicy estimou que
o governo federal iria investir R$
38,5 bilhões em obras para a Copa.
O número é esse?
SILVA JR. - Não conheço detalhes desse projeto. O certo é
que falar em qualquer número
hoje é mera especulação. Só
que a Copa não vai ser a panaceia para resolver todos os problemas das 12 cidades.
FOLHA - Evitar falar quanto vai custar a Copa é um aprendizado do Pan,
que custou várias vezes mais do que
o orçado inicialmente?
SILVA JR. - Foi um erro não ter
um planejamento detalhado no
Pan. A segurança estava prevista para custar R$ 13 milhões.
Era um número absurdo. Acabou custando R$ 500 milhões.
Aprendi no Pan que não se deve
especular em torno de números. O importante é fixar a matriz de responsabilidades:
quem faz o quê, quem paga o
quê. Isso é bom para o governo
saber o que vai lhe caber nesse
latifúndio. É bom para evitar
um desgaste com a opinião pública. Se você fala que custará x,
e acaba custando cinco vezes x,
a opinião pública fica incomodada, pois é dinheiro público.
FOLHA - Quando saberemos quanto vai custar para o governo a Copa?
SILVA JR. - Vou poder falar até o
fim do ano qual será a parte do
governo federal. Este número
já tem que estar no Orçamento
de 2010, quando teremos que
fazer licitações, iniciar as obras.
Mas é claro que será um número estimado, que pode ter redução de custo em uma licitação
ou ter majoração por causa da
execução de uma obra.
FOLHA - Quais são as chances de o
Rio sediar a Olimpíada de 2016?
SILVA JR. - Nossa candidatura é
muito forte. Nenhuma outra
candidatura exibiu as garantias
governamentais que o Rio ofereceu. Não se surpreenda se o
Rio for vitorioso.
FOLHA - O que vale para a Copa,
em que o governo diz que não vai
gastar com arenas, vale para os Jogos Olímpicos de 2016?
SILVA JR. - São coisas diferentes.
Copa é uma modalidade só. E o
futebol no Brasil tem um peso
diferente. Existe demanda. A
economia do futebol suporta. A
Olimpíada tem modalidades
sem muita tradição. Muitas vezes construir instalações para
elas é até bom. Instalações para
modalidades olímpicas terão
abordagens diferentes.
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