São Paulo, segunda-feira, 22 de junho de 2009

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ENTREVISTA

ORLANDO SILVA JÚNIOR

"A modéstia deve nortear a preparação de estádios da Copa"

Ministro do Esporte diz que o governo federal não irá desembolsar R$ 1 para arenas e que comete engano quem pensa que Mundial de 2014 irá resolver todos os problemas das 12 cidades-sedes

Fotos Ricardo Nogueira/Folha Imagem
O ministro Orlando Silva Jr., durante entrevista concedida na Embaixada do Brasil na África do Sul

EDUARDO ARRUDA
PAULO COBOS
ENVIADOS ESPECIAIS A PRETÓRIA

O BRASILEIRO saberá quanto a Copa do Mundo de 2014 vai custar para o governo federal até o fim do ano. Quem diz isso é o ministro do Esporte, Orlando Silva Jr., 38, em entrevista concedida à Folha em Pretória, onde foi se encontrar com organizadores do Mundial de 2010. Silva Jr. prega que os estádios brasileiros devem ter um "padrão modesto", sem a ostentação de alguns projetos atuais. E volta a garantir que o governo federal não investirá na construção ou na reforma de arenas. Mas diz que, se o Rio receber a Olimpíada em 2016, o tratamento será outro.

 

FOLHA - A África do Sul está fazendo uma Copa com gastos modestos [a estimativa é de US$ 3,5 bilhões]. Por que o Brasil vai gastar tanto?
ORLANDO SILVA JR. -
Não esperemos que a África faça um Mundial como a Alemanha, assim como não esperemos que o Brasil faça uma Copa como a da África. A realidade de cada país vai moldar a Copa. O que o Brasil fará é otimizar os recursos, sem gastar rios de dinheiro. Pretendemos fazer investimentos necessários para que os estádios tenham segurança e conforto, e as cidades tenham bons sistemas de transporte, acomodação e segurança.

FOLHA - É justo tirar dinheiro de todos os contribuintes para colocar só em 12 cidades?
SILVA JR. -
Todos os contribuintes serão beneficiados. Com a Copa, teremos mais investimento privado girando na economia do que recurso público. A Copa funciona como medida anticrise. Vai ajudar o Brasil a acelerar seu crescimento.

FOLHA - O senhor crê em investimento para transporte e aeroportos ou essa conta vai ser só do governo?
SILVA JR. -
Eu acredito que a Copa terá investimento público e privado. O Brasil já desenvolveu modelos interessantes para atrair o setor privado. Vou dar um exemplo concreto: o sistema de concessão de rodovias. Por outro lado, eu admito a hipótese de que haja financiamento público para determinados projetos. Mas, na minha cabeça, isso é uma operação bancária, não é dinheiro direto do Tesouro. O dinheiro público, sobretudo, deve ser investido em obras de infraestrutura.

FOLHA - O que a Fifa pede nesse sentido?
SILVA JR. -
A Fifa nos indicou que é muito importante investir em aeroportos. Há muitas cidades que têm seus terminais funcionando no limite de operação. Vamos precisar ampliá-los. Em outros, precisamos ampliar as pistas. Também temos interesse nos portos. Não imaginemos que a pessoa vai construir um hotel apenas para a Copa. Se você tem terminal de passageiros nos portos, você pode permitir um conjunto de transatlânticos circulando pelo país, com leitos temporários, para suprir as acomodações.

FOLHA - O senhor admite financiamento do BNDES para os estádios?
SILVA JR. -
Essa pergunta deveria ser feita ao Luciano Coutinho, que é o presidente do banco. O BNDES tem critérios técnicos muito rigorosos. E o banco tem uma equipe de análise de risco muito firme. Se pode ter ou não, vai ser analisado na medida em que os interessados passarão por esses critérios.

FOLHA - Dinheiro para os estádios vai ter?
SILVA JR. -
Do governo federal, não.

FOLHA - E se...
SILVA JR. -
Já ouvi que há governo estadual que se interessa em construir ou reformar estádio. Esse é um tema que está fora da pauta do governo federal. Nos Jogos Pan-Americanos, houve dinheiro do Tesouro para instalações, mas não haverá R$ 1 para estádio de futebol.

FOLHA - E se chegar uma hora em que vão falar: "Se não tiver dinheiro do governo, não vai ter estádio'?
SILVA JR. -
Essa hipótese não existe.

FOLHA - Como o senhor pode garantir isso?
SILVA JR. -
Veja, desde que a Fifa escolheu as cidades-sedes, temos feito um trabalho para firmar uma matriz de responsabilidade, um pacto entre o governo federal, os Estados e as prefeituras. E, nessa matriz, vai estar explícito que o governo federal não tem nenhum compromisso com qualquer investimento para estádios. As cidades apresentaram projetos e vão ter que sustentá-los.

FOLHA - O fato de o Tribunal de Contas da União ter apresentado várias irregularidades na gestão do dinheiro público tem a ver com isso?
SILVA JR. -
Não. O Brasil tem leis, critérios, e a administração tem que segui-los. A restrição em relação a estádios é um conceito. Já fui mal interpretado pela seguinte opinião: o governo tem mais o que fazer do que cuidar de estádio. Quando se tem um duto público financiando aquela instalação, a preocupação com a sustentabilidade acaba sendo menor.

FOLHA - Não há exagero em estádios como o de Manaus, por exemplo, para 60 mil pessoas?
SILVA JR. -
Defendo que os estádios sejam modestos e que se cumpram os critérios adotados pela Fifa, que já é um padrão superior ao brasileiro hoje.

FOLHA - Então, há exagero?
SILVA JR. -
Defendo que a modéstia seja o padrão para a preparação dos estádios. Assim, não teremos riscos de elefantes brancos, de estádios enormes com utilização uma vez por ano. É preciso levar em conta o perfil de cada cidade sob o ponto de vista do futebol.

FOLHA - E o Morumbi, é um problema?
SILVA JR. -
Até onde sei vai ser o estádio de São Paulo na Copa. É o estádio que a Fifa tem referência, mas precisa de ajustes. O projeto foi criticado pela Fifa, e Juvenal Juvêncio [presidente do São Paulo] me disse: "Farei as modificações que a Fifa exigir para atender aos critérios para a abertura do Mundial". Palavras dele. Não vejo como problema, vejo como solução.

FOLHA - São Paulo comporta outro estádio?
SILVA JR. -
Qualquer discussão fora o Morumbi é extemporânea. Sei que o Corinthians quer construir seu estádio, mas não seria para a Copa do Mundo.

FOLHA - Se o PT e seus aliados perderem a eleição de 2010, a Copa pode ser afetada? SILVA JR. - Se um candidato de fora da base aliada ganhar a eleição, não tenho preocupação com a Copa. O Brasil tem estabilidade democrática. Os documentos que o presidente Lula e os governadores assinaram mostram compromisso com a Copa. E nenhuma eleição vai atrapalhar isso.

FOLHA - Quando era ministra do Turismo, Marta Suplicy estimou que o governo federal iria investir R$ 38,5 bilhões em obras para a Copa. O número é esse?
SILVA JR. -
Não conheço detalhes desse projeto. O certo é que falar em qualquer número hoje é mera especulação. Só que a Copa não vai ser a panaceia para resolver todos os problemas das 12 cidades.

FOLHA - Evitar falar quanto vai custar a Copa é um aprendizado do Pan, que custou várias vezes mais do que o orçado inicialmente?
SILVA JR. -
Foi um erro não ter um planejamento detalhado no Pan. A segurança estava prevista para custar R$ 13 milhões. Era um número absurdo. Acabou custando R$ 500 milhões. Aprendi no Pan que não se deve especular em torno de números. O importante é fixar a matriz de responsabilidades: quem faz o quê, quem paga o quê. Isso é bom para o governo saber o que vai lhe caber nesse latifúndio. É bom para evitar um desgaste com a opinião pública. Se você fala que custará x, e acaba custando cinco vezes x, a opinião pública fica incomodada, pois é dinheiro público.

FOLHA - Quando saberemos quanto vai custar para o governo a Copa?
SILVA JR. -
Vou poder falar até o fim do ano qual será a parte do governo federal. Este número já tem que estar no Orçamento de 2010, quando teremos que fazer licitações, iniciar as obras. Mas é claro que será um número estimado, que pode ter redução de custo em uma licitação ou ter majoração por causa da execução de uma obra.

FOLHA - Quais são as chances de o Rio sediar a Olimpíada de 2016?
SILVA JR. -
Nossa candidatura é muito forte. Nenhuma outra candidatura exibiu as garantias governamentais que o Rio ofereceu. Não se surpreenda se o Rio for vitorioso.

FOLHA - O que vale para a Copa, em que o governo diz que não vai gastar com arenas, vale para os Jogos Olímpicos de 2016?
SILVA JR.
- São coisas diferentes. Copa é uma modalidade só. E o futebol no Brasil tem um peso diferente. Existe demanda. A economia do futebol suporta. A Olimpíada tem modalidades sem muita tradição. Muitas vezes construir instalações para elas é até bom. Instalações para modalidades olímpicas terão abordagens diferentes.

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