São Paulo, sábado, 22 de julho de 2006

Texto Anterior | Índice

RODRIGO BUENO

Foi ele que começou

É questionável pôr quase no mesmo nível quem deu uma cabeçada e quem xingou a mãe do rival no campo

QUANTAS vezes já li e ouvi que o futebol é coisa lúdica, brincadeira de criança, lazer acima de tudo. Esse olhar meio romântico e infantil do esporte, porém, é cada vez mais utopia. Nem as seguidas campanhas de fair play pelo mundo têm eliminado ou reduzido as sacanagens e o "vale tudo para vencer". A Copa que acabamos de ver e a Libertadores que estamos vendo são ótimos exemplos disso.
Assistimos, talvez, ao Mundial mais tosco da história, com explosão de cartões amarelos e vermelhos, gols em segundo plano, marcadores se destacando como nunca e a consagração de Materazzis e Scolaris. E o abismo que separava os bons meninos dos garotos levados, se não existe mais, agora é algo pequeno.
O lance mais polêmico da Copa teve seu desfecho só nas últimas horas, quando a Fifa decidiu "multar" e "punir" tanto o "mocinho" Zidane quanto o "vilão" Materazzi. A mamãe da "família do futebol" protegeu no caso, sim, seu filho favorito. É tão inovador quanto questionável colocar quase no mesmo nível quem deu uma cabeçada e quem xingou a mãe do rival no campo. Buscando coerência, os técnicos que são flagrados por microfones ou por leituras labiais falando palavrões deveriam ser multados. Clubes cujos torcedores ofendam a mãe dos árbitros teriam que receber multa. O mesmo castigo valeria para os juízes que atacam verbalmente atletas e para os dirigentes que fazem provocações.
Futebol sem xingamento é um sonho impossível. Até quem só jogou uma "pelada" entre amigos sabe disso. Se Materazzi tivesse dito algo racista, deveria ser duramente castigado. Mas não foi o caso. Zidane, com seu passado recheado de "ataques", está suspenso por três jogos, mas se aposentou. Fará três dias de serviço comunitário, algo que já realiza há bom tempo. O craque francês ainda manteve sua Bola de Ouro, prêmio que não deveria nem ter ganho.
A Fifa tentou ser mais justa na eleição dos melhores da Copa, deixando jornalistas votarem até a meia-noite. Assim, as eleições equivocadas de Ronaldo (98) e Kahn (2002) não se repetiriam. Mas poucos votaram após a final, que acabou pouco antes da meia-noite na Alemanha devido à prorrogação e aos pênaltis. Zidane venceu quase como Ronaldo e Kahn, com votos dados antes do jogo (esperei o término da final para escolher entre Buffon, Cannavaro, Vieira e Zidane, mas não tive tempo de deixar o voto na urna).
O mundo hoje reverencia Luiz Felipe Scolari e, especialmente no Brasil, onde todos conhecem até que ponto pode chegar Felipão na busca por um triunfo (jogar bola dentro do campo para atrapalhar o rival ultrapassa qualquer limite), ele posa como o treinador ideal, o que vence a qualquer custo, no grito. Até porque a Holanda do refinado Van Basten apelou tanto quanto Portugal na batalha das oitavas em que fair play virou piada. Aliás, sabia que o Brasil ganhou o Troféu Fair Play da Copa?

FOI ELE QUE ME BATEU
O River Plate deveria pegar belo "gancho" de disputas internacionais. Além do "comportamento" da "torcida", que se acostumou a bater nos policiais de outros países, envolveu-se em escândalo de compra de juiz na semifinal da Libertadores-05. Pela selvageria contra o Libertad, levou da Conmebol só uma multa de US$ 30 mil. Vai "com tudo" agora na Copa Sul-Americana.

FOI ELE QUE SE ADIANTOU
Rogério encarna tanto o espírito da Libertadores que se adiantou escandalosamente em pênalti contra o Estudiantes. Disse que o goleiro rival fez o mesmo. Certo, mas o Estudiantes, mais sujo time da história do torneio, saiu do Morumbi (caótico antes, durante e após o jogo) falando até que o São Paulo não teve fair play ao pressionar bola devolvida após a queda de argentino.


rbueno@folhasp.com.br

Texto Anterior: Rodada vira desafio para os últimos campeões nacionais
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.