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FUTEBOL
Festa na casa de Marta vira crise de hipertensão
Animação acaba em preocupação com a saúde da mãe da camisa 10
Dois Riachos, onde atleta nasceu, vai da euforia à depressão em 120 minutos, e promessa de Dona Teresa a Padre Cícero acaba adiada
SÉRGIO RANGEL
ENVIADO ESPECIAL A DOIS RIACHOS (AL)
A festa na casa de Marta já tinha começado havia horas. Um
quarteto de forró e um repentista animavam os convidados e
os penetras. Primos da jogadora assavam 60 kg de carne de
porco e de carneiro e distribuíam cervejas e refrigerantes.
Mãe da jogadora, Teresa
Vieira, 60, contava a todos que
iria pagar promessa para Padre
Cícero logo após a final olímpica. Sob o sol do sertão, ela iria
percorrer a pé os 5 km que separavam sua casa da capela
mais famosa de Dois Riachos (a
152 km de Maceió).
As câmeras da TV Globo, que
transmitiam flashes ao vivo para o país, empolgavam ainda
mais os festeiros torcedores.
A euforia na cidade acabou
com o gol de Lloyd no início da
prorrogação. Dona Teresa, que
assistiu ao jogo chorando, foi a
primeira a deixar o amplo salão
da nova casa da meia-atacante,
a melhor do mundo e que veste
a camisa 10 da seleção. Ela sofreu uma crise de hipertensão e
teve que sair carregada do local.
Dona Teresa não tinha ainda
visto nenhum jogo da seleção
na Olimpíada. Ela ficava no
quarto rezando e só entrava na
sala quando os filhos estavam
comemorando os gols do time.
Desta vez, a aposentada viu a
partida a pedido dos produtores da TV Gazeta, afiliada da
Globo em Alagoas.
""Ela quis agradar e acabou
passando mal. O importante é
que a mãe já está melhor", disse
Ângela Vieira, 33, com um terço enrolado nas mãos duas horas depois da final olímpica.
Cinco minutos depois de Dona Teresa deixar a sala, os músicos foram embora. Já os cerca
de 50 vizinhos e os penetras
aguardavam calados o fim do
jogo. Queriam aparecer na TV.
""Estou aqui só para passar na
Globo. Moro em Juazeiro e ganho a vida fotografando os moradores pelas cidades do interior. Quando passei aqui na
porta e vi o carrão da TV, entrei.
E estou adorando", disse o fotógrafo Patrício Cícero, 29.
Silenciosos, os torcedores
continuaram no salão após a
derrota. Eles só deixaram a casa
depois que a produtora da TV
informou que as entradas ao vivo para os telejornais da emissora tinham sido canceladas
com a derrota da seleção.
""Mesmo assim, valeu. Acho
que deu para a minha mulher
ver o meu boné", acrescentou
Cícero, logo depois de cumprimentar José Vieira, 32, um dos
irmãos de Marta.
Com a mãe descansando no
quarto, José ficou no portão da
casa recebendo os cumprimentos de solidariedade dos torcedores. Parecia cena de velório.
Eles não falavam nada com o irmão da craque do Brasil. Apenas apertavam a mão de José e
voltavam para suas casas.
""É triste, mas não posso fazer
nada. O importante é que a
Marta vale ouro para todos",
disse José. Ele é famoso em
Dois Riachos pelas brigas que
tinha com Marta na infância.
Assim como quase todos os
moradores, ele não gostava que
a menina jogasse futebol com
os garotos na pequena cidade.
""Naquela época, nenhuma
mulher fazia aquilo. Além disso, tínhamos que ficar ouvindo
as gracinhas dos vizinhos. Aqui
no sertão, ninguém nunca ia
pensar que ela chegaria a ser
conhecida no mundo todo por
causa do futebol. O importante
é que ela venceu o preconceito", conta José, que nunca jogou futebol na vida.
Em Dois Riachos, Marta era
chamada na infância de ""macho e fêmea". ""Minha mãe era a
única que não atrapalhava muito. Ela discutia com as pessoas
que chamavam a Marta pelo
apelido", contou Ângela.
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