São Paulo, segunda-feira, 22 de outubro de 2007

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America's Cup encara "tapetão de 120 anos"

Imbróglio opõe milionários e envolve taça da regata mais tradicional da Terra

Caso, que será julgado em Nova York, avalia se o atual campeão, o Alinghi, burlou normas do "Deed of Gift", documento escrito em 1887

ALEC DUARTE
DA REPORTAGEM LOCAL

Um documento que repousava há 120 anos num arquivo da Suprema Corte do Estado de Nova York estará a partir de hoje no centro de uma discussão que envolve vaidade, bilhões e um troféu esportivo.
O tribunal terá de decidir se o barco suíço Alinghi, atual bicampeão da America's Cup (principal prova da vela), violou os termos do "Deed of Gift" -texto de duas páginas escrito em 24 de outubro de 1887 e que regulamenta a tradicional regata, realizada desde 1851.
Quem quer saber é o bilionário do software Larry Ellison, 63, que já torrou mais de US$ 300 milhões em duas fracassadas campanhas da equipe norte-americana Oracle para conquistar a cobiçada taça.
Inconformado com as regras estipuladas pelos suíços para a edição 2009 do evento, o 33º da história, Ellison bateu o pé e recusou todas as tentativas de conciliação amigável. O caso parou em Nova York porque foi ali que George Lee Schuyler -autor do "Deed of Gift"- depositou o documento.
A substituição do mar pelo tapetão agitou o glamouroso mundo da competição oceânica mais importante do mundo. E colocou em evidência outro contumaz colecionador de dinheiro: Ernesto Bertarelli, 42, herdeiro de um império da biotecnologia. É Bertarelli o magnata que banca o Alinghi.
Mas não é só Ellison que questiona a bula apresentada pelo Alinghi para a defesa do título -conquistado em julho deste ano na cidade espanhola de Valencia. Outros cinco adversários protestaram por ocasião da divulgação das regras, e o bicampeão foi forçado a fazer um "recall" do regulamento.
A reunião, no mês passado, não contou com nenhum representante do Oracle. Ao final, o Alinghi divulgava um comunicado afirmando que "todas as demandas" das embarcações rivais haviam sido contempladas. O Oracle considerou a reforma "cosmética" e deu o sinal verde para o processo judicial.
O direito de ditar as regras em diversos aspectos da America's Cup é prerrogativa do campeão, segundo o próprio "Deed of Gift". O dono da taça escolhe local, época, dimensão dos barcos, ordem de desafiantes, composição da corte de apelações. Um festival de vantagens.
A questão é se o Alinghi, embevecido pelo poder, não avançou o sinal, burlando normas que Schuyler escreveu três anos antes de morrer.
A escolha do desafiante oficial (todos os outros competidores, na verdade, desafiam o desafiante, numa eliminatória) é, na visão dos advogados de Ellison, a principal irregularidade cometida pelo Alinghi.
O "Deed of Gift" diz explicitamente que os barcos que desafiam o campeão têm de ser de iates clubes que promovem regatas anualmente. Não é o caso do Desafio Español, equipe criada em Valencia para acompanhar a marina construída por 2 bilhões em recursos públicos. A cidade estima retorno três vezes maior nos próximos oito anos.
Há também questionamentos técnicos. A revista eletrônica "Sail World" teve acesso à ficha de inscrição dos espanhóis na sexta-feira e revelou discrepâncias em vários parâmetros da embarcação registrada.
Ellison e Bertarelli têm dinheiro de sobra para gastar com advogados. A liturgia jurídica agora deve obrigar os organizadores a suspender a edição 2009. A AC Management, responsável pelo evento, já fala até em 2011 como data mais provável para o novo encontro entre os bilionários da vela. Desta vez, nos mares.

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