São Paulo, quarta-feira, 22 de novembro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Entediado, Thorpe pára aos 24

Nadador que arrematou cinco ouros olímpicos e virou referência anuncia fim por falta de inspiração

Atleta segue caminho de outros astros que brilharam na juventude e deixaram piscina antes dos 25 para cuidar da vida pessoal

GUILHERME ROSEGUINI
DA REPORTAGEM LOCAL

Ian Thorpe fez questão de guardar o exato momento do fim. Seu relógio marcava 14h53min na tarde do último domingo, 19 de novembro.
Na casa onde vive, o atleta olímpico mais premiado da Austrália, um dos nadadores mais laureados da história, decidiu que não disputaria mais competições oficiais. Não sentia dores no corpo, não estava doente nem fora de forma. Só que, aos 24 anos, não encontrava mais motivação para perpetuar sua trajetória nas piscinas.
Ontem, em Sydney, ele convocou a imprensa para colocar fim a meses de especulação sobre seu futuro. "Não tenho mais o objetivo de quebrar recordes mundiais. Sei fazer isso, mas não estou mais inspirado."
Sem disputar um torneio desde a Olimpíada de Atenas, em 2004, Thorpe conta que passou a fazer um balanço de sua vida nos últimos anos. Levou em conta os resultados que o transformaram em lenda -22 recordes mundiais e cinco ouros em duas edições dos Jogos- e também a vida pessoal.
"Percebi que não tinha feito muitas coisas que gostaria. Então é hora de deixar a natação de lado. Pode não ser o melhor momento para parar, mas é o meu momento", sentencia.
Suas palavras viraram imediatamente motivo de celeuma. Como um homem de 24 anos, que ganha US$ 5 milhões por ano e está em plena forma, pode dizer adeus ao esporte?
Técnicos e jornalistas chegaram a tachá-lo de "louco" e "preguiçoso" quando ouviram sua proposta de se dedicar a uma carreira de ator ou de médico no futuro. O depoimento mais contundente, porém, veio de quem viveu tal situação.
Sua compatriota e também nadadora Shane Gould sabe o que Thorpe passou na tarde de domingo. Aos 15 anos, ela ganhou três ouros na Olimpíada de Munique-1972. Aos 16, cansada de tudo, abandonou as piscinas e passou a morar isolada no litoral da Austrália. "É o inferno decidir parar, mas necessário. Às vezes, prosseguir no esporte significa ignorar várias coisas boas que a vida oferece."
Outros campeões das piscinas seguiram a mesma vereda, como Mark Spitz, dono de sete ouros nos mesmos Jogos de Munique. Ele parou aos 22.
"Colocar um ponto final cedo pode significar maturidade, e não o contrário. O Thorpe, por exemplo, já alcançou tudo o que sonhava e ainda tem tempo para aproveitar a juventude, curtir as festas, criar uma vida afetiva, coisas que deixou de lado enquanto treinava", explica Márcia Pilla do Valle, especialista em psicologia esportiva.
Desde 1998, quando se tornou o mais jovem campeão mundial da história da natação -tinha 15 anos-, Ian James Thorpe é apontado como fenômeno. Sua técnica refinada no nado crawl e o fôlego que exibia em provas de meio-fundo (em especial nos 200 m e nos 400 m livre) viraram referência.
O curioso é que Thorpe afirma não ter tido tempo de curtir as façanhas. Por isso, escolheu como primeira ação ao decidir se aposentar uma revisão de seus feitos por um viés diferente. O resultado o agradou. "Competindo, eu não tinha tempo de pensar no que eu conquistava na água. Agora, eu tenho. E estou mais orgulhoso do que nunca do que alcancei."


Texto Anterior: Tostão: Onda da mediocridade
Próximo Texto: Tênis: Federer fecha ano com vitória sobre Nadal
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.