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FUTEBOL
Um outro 1958
JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA
O ano de 1958 tinha tudo
para ser um ano perfeito
para o Brasil.
João Gilberto gravou ""Chega
de Saudade", Juscelino, o presidente bossa nova, construía
Brasília no meio do nada, Guarnieri estreava ""Eles Não Usam
Black-Tie", e o país formava um
bom time para disputar a Copa
do Mundo da Suécia.
Aliás, bem mais que um bom
time. Lá estavam Didi, Nílton
Santos, Gilmar e outros craques
experientes, além de uns jovens
muito promissores.
De fato, a seleção não fez feio.
Depois de um começo inseguro,
acertou-se com as entradas de
Djalma Santos, Garrincha e Pelé e foi crescendo na competição.
Houve um empate frustrante
contra a Inglaterra, mas Áustria, União Soviética e País de
Gales foram todos vitimados pelo ataque arrasador cujo entrosamento crescia de jogo a jogo.
Na partida semifinal contra a
seleção da França, Pelé somente
não fez chover.
Chegou então o dia da decisão, que seria contra os donos
da casa.
Como os suecos também usavam uniforme amarelo e azul, o
Brasil teve que improvisar e entrou no estádio vestindo camisas roxas e shorts lilases. Foi o
melhor que se pôde encontrar.
O problema é que a nova roupa deixou os jogadores com a
pulga atrás da orelha.
Eles acharam aquelas cores
muito chamativas e não conseguiam se soltar em campo.
Para piorar, o time da Suécia
não demorou muito para marcar o primeiro gol num chute da
entrada da área.
Didi, o Príncipe Etíope, pegou
a bola e caminhou calmamente
até o meio de campo.
Queria passar aos companheiros uma mensagem de calma.
Mas escolheu mal suas palavras
e disse: ""Vamos honrar as cores
deste uniforme!" Garrincha riu
tanto que quase caiu no chão.
De qualquer forma, a equipe
brasileira começou a buscar o
empate.
Garrincha fez duas jogadas
incríveis, igualzinhas: passou
fácil pelo marcador, mas, em
vez de cruzar para Vavá, que estava embaixo do gol, chutou
sem direção.
Pelé chegou a dar um chapéu
no adversário dentro da área,
mas escorregou na hora de chutar e a bola foi para fora.
Zagallo perdeu um gol cara a
cara com o goleiro, e Pelé errou
uma cabeçada dentro da pequena área.
Diante de tanta displicência,
poucos se admiraram quando a
Suécia fez dois a zero.
Quando o juiz apitou o fim da
partida, os loiros vikings deram
a volta olímpica e aos brasileiros
só restou a lamentação.
Mário Américo, o preparador
físico, correu pelo campo e roubou a bola do juiz.
Depois, queimou-a.
Mas a foto que mais marcou o
país foi aquela em que Pelé chora compulsivamente nos ombros de Gilmar.
Éramos novamente vice-campeões, como em 50.
Quando a seleção desembarcou no Rio, só seus parentes estavam lá para recebê-los.
O curioso é que o novo fracasso fez com que o Brasil perdesse
o interesse pelo futebol.
Outros esportes começaram a
ganhar importância, como o tênis e a natação.
Mas nenhum conseguiu ganhar do basquete. O esporte de
Edvar, Oscar e Ubiratã foi várias vezes campeão mundial.
Hoje, em cada terreno baldio
do país joga-se basquete e a seleção canarinho é famosa no
mundo inteiro.
Nossos jogadores são convidados a jogar nos milionários clubes do exterior e recentemente o
armador Sócrates, que atuou
dez anos pelo Boston Celtics, foi
considerado um dos maiores
atletas do século.
Mas nem tudo são flores.
O basquete cresceu tanto que
hoje o confuso campeonato nacional da modalidade é disputado por mais de cem clubes, que
são divididos em quatro grupos
nomeados com as cores da bandeira nacional.
Os dirigentes da modalidade
misturam suas contas bancárias
com as dos clubes e pairam sobre todos sérias suspeitas, principalmente no que se refere à
compra e venda de jogadores
para o exterior.
Vários deles estão sendo investigados pelo Senado e lutam para não terem o sigilo de suas
contas quebradas, numa clara
demonstração de culpa.
Para piorar, a CBF, Congregação de Basquete Federal, a mais
poderosa entidade esportiva do
país, está tendo seu contrato
com a Nike investigado pela Câmara Federal.
No Brasil inteiro há um forte
sentimento de indignação e
muita gente já pensa, com alguma razão, que este não é mais o
país do basquete.
E-mail torero@uol.com.br
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