São Paulo, sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

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XICO SÁ

Sorte no amor, azar no jogo


As regras estão estipuladas, agora é conferir se dará jogo, pois a marcação já tem sido implacável e a punição, severa


AMIGO TORCEDOR , amigo secador, começou de novo o massacre das peladas, e, conforme uma madura e civilizadíssima discussão de relação ainda nas areias do Nordeste, adotamos aqui no barraco um severo código -nem o babilônico Hamurabi pensaria algo mais rigoroso- para o calendário ludopédico de 2009. A marcação está implacável, como já senti nos primeiros momentos de bola rolando.
O regulamento, claro, é mais labiríntico e maluco do que as regras de todos os Estaduais do país, mas tentarei resumir. As mesas-redondas domingueiras, por exemplo, estão definitivamente vetadas. Em vez da histeria dos cavaleiros do ramo, um cineminha, um teatro, a pizza com os amigos etc. Com exceção do falatório da rodada final do torneio, sagrada desde as tábuas de Moisés. Na rodada do meio de semana, direito a só um jogo completo, enquanto ela vai ao botequim com as colegas. Arrisquei ver Guarani x Portuguesa, após ter visto também Santo André x Palmeiras, ela anotou no caderno negro: deve uma trilha de pelo menos 90 minutos na serra da Cantareira. Ela sabe que odeio as tais expedições saudáveis. Meu temor é simples: quem se cuida muito corre o sério risco de morrer com muita saúde, já pensou que triste?
Enfim, valeu o futuro castigo, o Bugre e a Lusa fizeram uma das pelejas mais medonhas da humanidade, o que obrigava os narradores a usar a desculpa do início de temporada de cinco em cinco minutos. Peladaço digno de Come-Terra x Come-Mortos, clássico de "O Fantasista", divertidíssima novela do escritor chileno Hernán Rivera Letilier.
Agora justiça seja feita: o time do Canindé tem a terceira camisa mais bonita do Brasil. Falo do uniforme em luto como nos fados lusitanos, com faixas verde, vermelha e branca, um belíssimo desenho da marca Cavalera associada à Penalty.
Sim, amigo, não fujo à luta, voltemos ao código caseiro. Ouvir no rádio, via internet, um Sport x Serrano, o embate do leão contra o jumento sertanejo, vale um bônus para ela equivalente a uma hora e meia de atraso enquanto veste a roupa para irmos a uma festa.
Os jogos do Fenômeno, ufa, estão liberados. Mesmo com toda a sua ingenuidade ludopédica, a patroa aposta que serão raríssimos, de modo a não perturbar a harmonia do nosso ninho de amor. Descer para a Vila Belmiro, só uma vez por mês. A nega cansou do vexame do Peixe em 2008. Ainda topa em nome da paella no almoço e do passeio na orla. Nem adianta insistir que o homem-gabiru Madson será o cara!
Sobrou até para o pobre do corvo Edgar, amigo, o inocente agourento foi exilado no interior, em uma chácara repleta de moças, ambiente familiar, lógico, nos arredores de Ribeirão Preto. Ainda bem que está sob os cuidados de Durvalzim, o maior secador do clássico Come-Fogo do universo, de quem o cronista herdou a mandinga, além do lirismo.
Não toquei, evidentemente, ao tratar de árduo tema, no capítulo das recompensas de alcova, sob pena de cutucar o leitor com a vara curta da curiosidade e da inveja. Ao final da jornada, confesso se valeu ou não o sacrifício deste doente capaz de testemunhar um Chapetuba x Íbis, num sábado à noite, sem luz, debaixo de tempestade de granizo.

xico.folha@uol.com.br


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