São Paulo, quinta-feira, 23 de junho de 2011

Texto Anterior | Índice | Comunicar Erros

O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

MINHA HISTÓRIA
LEANDRO FERNANDES JACOB, 21


Motivador

O PC Gusmão se comoveu com minha vida e me chamou para conversar com os jogadores de futebol Dou palestras em tudo quanto é clube Agradeço a Deus por tudo, inclusive por ser soropositivo

RESUMO
Nascido e criado em Botafogo, no Rio, Leandro Fernandes Jacob, 21, já deu palestras para jogadores de mais de 15 clubes de futebol. Portador do vírus HIV, foi adotado pelo técnico PC Gusmão, do Atlético-GO, que o leva em viagens para incentivar os atletas contando sua história. Ele falou para o grupo do Flamengo após o time faturar o primeiro turno do Estadual.

(...)Depoimento a

LUIZA SOUTO
DO RIO

Nasci num hospital que tinha aqui na Rua da Passagem. Sempre morei na Álvaro Ramos. Adoro Botafogo e não quero sair daqui. Aos 6 anos, o meu pai descobriu que eu tinha Aids e abandonou minha mãe. Pouco o vi ou falei com ele depois.
Minha mãe morreu no ano seguinte e meus avós passaram a me criar. Tenho um irmão de 29 anos e uma de 17, que mora comigo. Mas eles não têm essa doença.
Foram os meus avós, dona Rosa, de 71 anos, e seu Ramon, de 70, que me contaram que eu estava com HIV. Eles choravam muito, e eu lembro que disse que ia reverter essa situação. Chegava a tomar oito comprimidos por dia. Hoje são só três.
Com 15 anos, ainda andava com auxílio de um andador, pois minhas pernas eram muito fracas. Mas nunca desanimei. Tanto que os médicos disseram que eu só ia viver até os dez anos.

PRECONCEITO
Uma vez uma professora não quis que eu me juntasse às outras crianças. Ela disse que não saberia o que fazer se eu me machucasse. Falei que ela deveria me tratar como os outros. Eu não queria tratamento diferenciado.
Quando conheci minha primeira namorada, aos 14 anos, não contei de imediato sobre a minha condição, mas tenho certeza de que alguém falou, pois um belo dia ela me ligou e terminou tudo. Depois tive outros namoros. Já fiquei três anos com uma menina, mas ela sabia o que eu tinha. Às vezes acontece de um ou outro jogador de futebol não me tratar bem, mas é muito difícil me tirarem do sério. Sou muito calmo.

PC GUSMÃO
Em 2005, conheci o PC. Costumava frequentar um restaurante no Recreio toda sexta, quando rolava um show de samba. Nos intervalos, pegava o microfone e contava piada. O dono me pagava R$ 50 por semana.
O PC viu a apresentação e veio falar comigo. Então ele se comoveu com a minha história e me chamou para conversar com os jogadores do Botafogo, time que ele treinava e passava por uma situação difícil. Ele pensou que, se eu falasse sobre a minha vida, ia motivar os jogadores.
Só sei que, naquele ano, ganhamos tudo. Passaram a me chamar de Biriba, um cachorrinho preto e branco, mascote do clube na década de 40. Foi o presidente na época, Bebeto de Freitas, que me chamou assim.
O PC passou a ajudar lá em casa e também paga o meu tratamento na ABBR (Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação) até hoje. Quando posso, divido com meus avós e irmãos a ajuda. Para onde o pai vai, eu vou também. Agora dou palestras em tudo quanto é clube. No último dia 19 foi aniversário dele. Liguei e conversamos muito. Estou vendo quando vou voltar a vê-lo.

SAMBA E FUTEBOL
Em todo clube, sempre tem quem toque um instrumento. Então quis aprender. Como gosto de samba de raiz, escolhi o cavaquinho.
Na minha vida, só tive aula de música durante cinco meses. Tudo que sei hoje aprendi no olho. Eu tenho mais de 300 músicas e já gravei uma com o Dicró. Ela se chama "Os sabores da mulher".
Há um ano e meio, eu o vi vendendo CD na Uruguaiana (centro do Rio) e me apresentei. Pedi pra ele escutar umas músicas minhas. Dias depois ele me ligou dizendo que queria gravar essa. Samba e futebol pra mim é a combinação mais perfeita que tem.
Vou me formar esse ano e estou decidindo se faço faculdade de música ou de educação física.

PALESTRAS
Na mesma semana que o PC assumiu o Atlético-GO [3 de abril], eu fui para lá dar uma palestra. Gostei muito.
Tanto o time como o PC estão muito animados para esse campeonato. E o Atlético é guerreiro, tem tradição.
Estive também há pouco tempo no Flamengo. O próprio Vanderlei [Luxemburgo, técnico] me ligou quando o time foi campeão do primeiro turno. Agora estou esperando mais convites.
Enquanto não viajo eu apareço lá no Vasco, para visitar os amigos que fiz. Quando o time foi campeão da Copa Sul-Americana, eu apareci no dia seguinte para dar os parabéns à equipe.
Quando vou aos clubes, eu gosto de chegar e ler algum trecho da Bíblia para o time. Também cito livros sobre espiritualidade e equilíbrio. Até filme eu levo. Já fui ao cinema gravar trechos de "Nosso Lar" para usar nas minhas palestras.
Só sei que, desde pequeno, tenho o costume de acordar às 3h para orar. Agradeço a Deus por tudo que tenho, inclusive por ser soropositivo. Tenho uma missão com isso. Nada é por acaso.


Texto Anterior: Paternidade pode atrapalhar Nenê
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.