São Paulo, domingo, 23 de dezembro de 2007

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TOSTÃO

Saudade, saudosismo, modernismo


A mediocridade não pode ser aceita com a justificativa de que não existe mais o futebol espetacular de outras épocas


N ESTA ÉPOCA , ficamos mais saudosos e nostálgicos.
Ao mesmo tempo, é uma ocasião para refletir, planejar, sonhar com novas experiências e fazer algo que transcenda a realidade.
Temos saudades das coisas que vimos, gostamos, vivemos e também das que sonhamos e que só existiram na nossa imaginação. "A vida é sonho." Estamos sempre na busca de algo que nos falta e que, muitas vezes, nunca será possível.
No futebol do passado, uma das coisas de que mais tenho saudades são dos jogos entre o Santos de Pelé e o Botafogo de Garrincha.
Não espero assistir hoje a partidas desse nível, mas elas me servem de referência para analisar e cobrar mais qualidade do futebol atual. Fiquei bem acostumado. Aprendi também com o mestre Fernando Calazans a dizer somente o que vejo. Partidas e jogadores medíocres são medíocres.
O que não posso é achar que tudo do passado é melhor. Mesmo entre grandes equipes, havia péssimos jogos e muitos atletas ruins.
Existem hoje também muitas partidas brilhantes e alguns ótimos jogadores.
Muitos jovens comentaristas não deveriam ser tão conformados com a mediocridade nem achar que o futebol do passado não tem nada a ver com o atual. O passado é essencial para compreender e melhorar o presente e sonhar com o futuro.
Muitos que viveram outras épocas lamentam a falta de pontas, de clássicos meias-armadores, de centromédios elegantes e habilidosos, de mais toque de bola e de amor à camisa do clube pelos atletas.
Em compensação, acontecem hoje muito mais gols em jogadas de bola parada, há mais jogadores desempenhando várias funções, mais velocidade, mais marcação, melhor preparação física e tática e outros avanços.
Além disso, os pontas foram substituídos pelos laterais ou alas que avançam e, recentemente, por atacantes pelos lados que também recuam para marcar.
Têm surgido mais volantes habilidosos e ainda existem alguns meias de ligação clássicos, como Alex, Riquelme e Diego.
Alguns poucos times procuram jogar um futebol bonito e eficiente.
Pena que o Barcelona, a equipe que melhor fez isso nos últimos anos, tenha piorado. Hoje, o time catalão enfrenta o Real Madrid, que está melhor. Mas clássico é clássico, já disse um filósofo do futebol, que não foi Neném Prancha.
Enquanto treinadores e atletas se tornaram mais profissionais -alguns confundem profissionalismo com esperteza-, grande número de torcedores não acompanhou esses novos tempos e ainda cobra amor à camisa pelos atletas.
Na verdade, isso pouco existiu, nem no passado. Antes, a maioria dos jogadores ganhava como profissionais, embora menos que hoje, e se comportava como amadores.
As coisas que amamos continuam presentes, mesmo que no inconsciente. "Por muito tempo achei que ausência fosse falta. E lastimava a falta. Hoje não a lastimo. Não há falta na ausência. A ausência é um estar em mim. Sinto-a tão aconchegada em meus braços que rio, dan- ço e invento coisas alegres. Essa ausência assimilada, ninguém a tira mais de mim." (Carlos Drummond de Andrade).


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