São Paulo, quarta, 24 de março de 1999

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FUTEBOL
Sinal do goleiro da Portuguesa Santista, antes da partida do Paulista-98, teria tranquilizado diretores da Lusa
"Jogo do suborno' utilizou até código

Eduardo Knapp/Folha Imagem
O presidente da Portuguesa Santista, Aniceto Alberto Disbanca, que exige indenização da Lusa


MARCELO DAMATO
da Reportagem Local

Um ex-profissional da Portuguesa Santista revelou à Folha mais um forte indício de que um esquema de suborno cercava a partida que desclassificou o time do litoral e que assegurou à Lusa uma vaga na segunda fase do Paulista-98.
O técnico Orlando Pereira, que dirigia o clube santista na ocasião, pediu ao goleiro Nasser que se benzesse várias vezes e de uma forma determinada -primeiro numa trave, depois na marca do pênalti e em seguida na outra- antes daquele jogo.
Os sinais, que Pereira justificou ao goleiro como sendo orientação de uma mãe-de-santo, teriam convencido diretores da Lusa de que o goleiro participaria da armação.
Realizada em 1º de março do ano passado, a partida era decisiva para as aspirações da Lusa no último Estadual. A equipe precisava pelo menos empatar com a Santista para seguir na competição. O jogo terminou 4 a 4, mas a Lusa goleava por 4 a 0 já no primeiro tempo.
"Ele (Pereira) me falou que havia sido procurado por um torcedor que lhe dissera que, se fizesse assim, eu não tomaria gol", afirmou Nasser à Folha. "Não acredito nisso, mas sou profissional, cumpro ordens dos meus superiores. Só mais tarde soube que esse torcedor era na verdade o Toninho Silva", declarou o técnico.
Toninho Silva, ex-lateral-direito do Santos, trabalha atualmente como empresário do futebol e foi apontado pela sindicância interna da Lusa como participante no suposto esquema e como uma das pessoas que teriam ficado com parte dos R$ 130 mil que saíram dos cofres do clube.
Ao ser questionado, Pereira confirmou a informação. "É verdade. Foi o Toninho Silva quem me pediu." O técnico afirmou que o conhece há muito tempo, mas não se considera amigo dele.
Silva confirma ter conversado com o treinador. "Eu estava subindo para a arquibancada, uma hora antes do jogo. Apenas falei para o Orlando: Tá feita uma macumba para dar 0 a 0, manda o goleiro bater na trave. (Mas) Não pedi nada para ele", diz o empresário.
O lateral Balu, que defendia a Santista, confirma a versão de Nasser e Pereira. "Foi o Orlando que pediu ao Nasser para fazer aquilo. Não sei por que fez isso. Nunca havia feito isso. Disse que havia sido um pedido de um torcedor."
Nasser afirma que embora tenha sofrido quatro gols no primeiro tempo, sua atuação foi regular, boa mesmo. "Os quatro gols foram normais. Num deles, rebati uma cabeçada de perto do Leandro, mas ele pegou o rebote. Quando estava 4 a 0, o (zagueiro) Toninho foi cortar uma bola, mas mandou para trás. Para mim, se estivesse comprado, seria fácil, deixar a bola entrar, mas fui atrás. Defendi. No final, dei lançamentos, fui tentar fazer o gol na área do adversário", afirma o goleiro.
Nasser afirmou ainda que, quando boatos vieram a público pela primeira vez, em maio, ele e Pereira chegaram a contatar um advogado de Santos, indicado pelo técnico, com a idéia de processar a Lusa. "Nós o procuramos, mas a partir de um certo momento, o advogado disse que era melhor não fazer nada porque não daria certo", afirma Nasser.
Pereira confirmou a informação, mas não quis dar mais detalhes, alegando cansaço.
Desde que sofreu um acidente no banheiro, quando dirigia o Gama (DF), há cerca de seis meses, o técnico está paraplégico. Passa os dias em casa, numa cadeira de rodas ou na cama. Pereira disse à Folha que está se recuperando aos poucos, graças à fisioterapia.
A conexão Silva-Pereira-Nasser, em torno do "sinal", é a terceira evidência do esquema de fraude.
A primeira foi a investigação do próprio Conselho de Orientação e Fiscalização da Lusa.
Espécie de tribunal de contas do clube, o órgão constatou o sumiço de R$ 130 mil e, conforme a Folha publicou na edição de domingo, apontou em um relatório datado de dezembro que Camões Salazar, diretor da Lusa, e Silva eram os principais suspeitos de ter embolsado o dinheiro.
A segunda evidência foi revelada pela Folha na segunda-feira: um contrato assinado entre o goleiro Nasser e o presidente da Lusa, Amilcar Casado. Firmado dois meses depois do "jogo da armação", o documento rendeu ao atleta R$ 83 mil. Nasser, contudo, não chegou nem a treinar no clube.
Este é o segundo grande escândalo que envolve a Lusa nos últimos dois anos. Em 97, a venda do lateral-esquerdo Zé Roberto para o Real Madrid envolveu uma triangulação no Uruguai no qual desapareceram US$ 5,38 milhões. A operação, também revelada pela Folha, resultou no afastamento do então presidente do clube paulistano, Manuel Pacheco.



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