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São Paulo, domingo, 25 de maio de 2003

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Parecer jurídico da pasta foi apresentado como compromisso de acordo

Ministro leu salvaguarda a cartolas durante reunião

DO PAINEL FC

Uma "nota técnica" redigida em três folhas de papel timbrado do Ministério do Esporte é o que restou da promessa feita a cartolas por Agnelo Queiroz de que seria buscada uma saída para aliviar o teor do Estatuto do Torcedor.
A Folha teve acesso ao parecer, que foi lido pelo ministro aos participantes da reunião da última quarta-feira à noite em Brasília, como garantia de que o artigo 19 da lei poderia ser reinterpretado, no caso de ações judiciais baseadas nesse item específico.
O artigo responsabiliza os cartolas por prejuízos causados ao torcedor em eventos esportivos "independentemente de culpa".
O documento, assinado por Francisco Xavier da Silva Guimarães, consultor jurídico do ministério, refere-se também ao artigo 14, que designa as entidades esportivas e seus dirigentes como responsáveis pela segurança nos eventos e enumera suas atribuições, como solicitar ao poder público a presença de policiais.
Dois pontos da nota deixam claro o mea-culpa do ministério quanto à redação do artigo 19.
No primeiro deles, o texto afirma que "(...) não estará o dirigente esportivo assumindo a responsabilidade inerente aos órgãos incumbidos da segurança pública".
No outro, diz que os artigos 14 e 19 são "coincidentes em reconhecer a responsabilidade solidária de dirigentes e responsáveis pela organização da competição, diante de comprovada imprudência quanto às exigências de segurança estabelecidas para garantir os direitos constitucionais assegurados indistintamente a todos".
Depois que leu a nota técnica para os dirigentes, o ministro lhes prometeu que encaminharia o texto à Advocacia Geral da União. O órgão disse não ter recebido o parecer, mas somente uma consulta informal de Queiroz ao advogado-geral da União, Álvaro Ribeiro Costa, que informou não haver correção a ser feita na lei.
Em mais de uma ocasião, Queiroz negou ter feito acordo para atenuar os efeitos do estatuto sobre os cartolas. A reportagem tentou ouvir o ministro, mas não obteve retorno dos três contatos feitos -dois com sua secretária, um com sua assessoria de imprensa.
A nota técnica e a promessa de uma posição da AGU foram a última cartada do governo num dia marcado por negociações. Na primeira reunião da quarta, na Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara, representantes de clubes e da CBF disseram que gostariam de ver editada uma medida provisória para corrigir as "imprecisões" do estatuto.
Orientado por Queiroz, com quem se reunira de manhã, o deputado Gilmar Machado (PT-MG) descartou a possibilidade de uma MP, mas se mostrou aberto a outros acertos.
Os cartolas então propuseram uma solução engenhosa: argumentaram que o estatuto proíbe as entidades de modificarem regulamentos no decorrer das competições (artigo 9º) e que, para se adaptarem a ele, teriam de mudar tudo no Campeonato Brasileiro e na Copa do Brasil -ferindo, portanto, a própria lei.
Acertou-se que um termo de ajuste seria feito, esclarecendo que a lei só valeria para competições iniciadas após a sanção do estatuto -o que, na prática, empurraria o estatuto para 2004-, mas o ministro rejeitou a proposta na reunião da noite.
Após mostrar seus argumentos sobre a aplicabilidade da lei, Queiroz sugeriu a opção da AGU, concordando com a imprecisão de redação do artigo 19 e lendo em seguida a nota técnica.
Os cartolas deixaram o ministério, anunciaram o acordo e jantaram numa churrascaria.
Na quinta, representados por um pequeno comitê, voltaram a se encontrar com Queiroz. Em público, assumiram tom conciliador e aceitaram a "palavra" do ministro que quis negociar.
No final das contas, depois de um dia de ação direta do Planalto, a AGU manteve tudo como estava. Aos dirigentes, restou outro compromisso do ministro: de que os calos nos sapatos serão aliviados futuramente, no Estatuto do Desporto, que, no segundo semestre, deverá unificar a legislação esportiva do país. (FÁBIO VICTOR E FERNANDO MELLO)


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