São Paulo, sábado, 25 de setembro de 2004

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Cúpula corintiana cai na malha da CPI do Banestado

MTB Bank, de Nova York, registra operações suspeitas em nome do presidente Alberto Dualib e do vice de futebol Antonio Roque Citadini em contas de doleiros

EDUARDO ARRUDA
RICARDO PERRONE
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

A base de dados do MTB Bank, de Nova York, identificou uma operação financeira suspeita em nome de Alberto Dualib, presidente do Corinthians, e outra em nome de Antonio Roque Citadini, vice de futebol do clube e conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Aparecem ainda quatro contas movimentadas em nome de "A.Citadini".
As informações foram obtidas pela Folha com base nas operações registradas em um CD enviado pela Promotoria de Nova York (EUA) à CPI do Banestado.
Dualib usou conta controlada por doleiros para repatriar US$ 300 mil ao Brasil. A operação, realizada no dia 1º de março de 2002, seria a venda de um apartamento em Madri, segundo o dirigente, que atribuiu a um ex-funcionário da empresa de um de seus filhos o negócio com os doleiros.
Citadini nega ser o responsável pela abertura e movimentação das contas em seu nome e disse desconhecer a existência delas até então. Segundo ele, as únicas operações com o exterior foram para a aquisição de um seguro familiar.
O MTB Bank, atual Hudson United, está sendo investigado pela Promotoria de Nova York. Segundo levantamento feito pela Folha, um grupo de dez doleiros brasileiros movimentou pelo menos US$ 2,4 bilhões em 42 contas do MTB Bank de Nova York (EUA) entre janeiro de 1997 e 24 de novembro de 2003.
No caso de Dualib, uma conta em seu nome no Citibank, nos EUA, foi usada para enviar US$ 300 mil para a Azteca Financial Corp., "offshore" com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, via MTB.
A Azteca é administrada pelos doleiros Myriam Haber e Roger Clement Haber, que atuam na capital paulista.
Essa movimentação financeira não passou pelos canais oficiais. A transação deveria ter sido comunicada ao Banco Central.
Dualib alega que a conta no Citibank foi aberta sem seu consentimento, pelo comprador do imóvel em Madri, um espanhol casado com uma americana. Segundo o dirigente, a abertura foi feita para que fosse depositado o dinheiro referente ao negócio.
A assessoria de imprensa do banco, no entanto, informou à reportagem que tal procedimento não seria possível sem o consentimento do titular da conta por meio da documentação exigida.
Para sacar a quantia, Dualib disse ter feito três cheques no valor de US$ 100 mil cada.
"Em vez de ele [o ex- funcionário] pegar os três cheques e fazer a operação pelo Banco Central, fez através de um doleiro", afirmou o presidente corintiano.
De acordo com a base de dados do MTB Bank, a última parada do dinheiro foi a Azteca. Depois disso, não se sabe qual foi o destino dos US$ 300 mil. Dualib diz desconhecer o envio do dinheiro para o paraíso fiscal.
A movimentação sugere que houve um sistema paralelo de compensação, conhecido como dólar cabo. O esquema consiste em receber em real no Brasil de um doleiro e pagá-lo em dólar no exterior sem que a operação seja informada ao Banco Central.
Apesar de não ter de pagar imposto para trazer o dinheiro ao país, a operação pode indicar sonegação fiscal caso o valor real da venda não tenha sido declarado. O dólar cabo pode ser usado para ocultar patrimônio.
Dualib diz que não declarou a existência da conta nos EUA porque ela foi aberta e encerrada no mesmo ano, o que o desobriga desse procedimento.
O dirigente mostrou à Folha a sua declaração de bens no IR do exercício 2003, calendário 2002. O imóvel em Madri, de cinco dormitórios e adquirido em 1986 em nome de Elvira Real Dualib, mulher do dirigente corintiano, aparece na relação.
Na coluna referente à situação dos bens em 2001 está registrado o valor de R$ 235.974,29. Segundo Dualib, esse é o valor histórico do imóvel. Por isso, bem inferior aos US$ 300 mil da venda.
Em um extrato bancário fornecido por Dualib de sua conta no Citibank no Brasil aparece a entrada de R$ 845.370,31.
Dualib diz ter vendido o apartamento com o dólar a R$ 2,38 na época. Esse valor, multiplicado por US$ 300 mil, corresponde a R$ 714 mil. Mas o dirigente afirmou ter enviado R$ 240 mil para a conta da Rollex S.A, empresa controlada por um de seus filhos.
A diferença entre a quantia obtida com a venda do imóvel e a gasta com a compra pode gerar uma investigação por parte da Receita Federal. Nesse caso, o contribuinte é obrigado a fazer uma declaração de ganho de capital.
Nela, deve pagar à Receita 15% da diferença, o que, no caso de Dualib, corresponderia a cerca de R$ 71 mil. O dirigente diz ter declarado o ganho de capital, mas não mostrou nenhum documento referente a isso. "Se tiver algum problema aí é com a Receita."
Na presidência do Corinthians desde 1993, Dualib enfrenta atualmente oposição por parte de seu Conselho Deliberativo justamente por querer assinar parceria com uma empresa fundada em um paraíso fiscal, a MSI. Os opositores suspeitam de envolvimento em lavagem de dinheiro.

Seguro
Antonio Roque Citadini, que assumiu a vice-presidência de futebol corintiana em outubro de 2000, aparece como titular de uma conta do Lloyds Bank em Miami. Dela são transferidos U$ 3.703, em 7 de maio de 1998, para a Venus, controlada por doleiros.
Outras quatro operações, entre 4 de junho e 21 de julho de 2003, num total de R$136.928,00, são creditadas a A. Citadini. As transferências foram do JP Morgan Chase para a Digital, administrada pelos doleiros Raul Henrique Srour e Richard A. de Mal Van Otterloo. As transações terminam com o número 982, que pode ser um código de identificação da transferência para os doleiros.
Citadini diz que as operações podem ter sido feitas por um agente de seguros, mas até ontem não apresentou documentos que comprovem isso.


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