São Paulo, sábado, 25 de novembro de 2006

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JOSÉ GERALDO COUTO

O desbravador


Com Adhemar, torço para o mais americano dos esportes se curvar ao povo que soube dar aos pés astúcias de mão


LEMBRA DO Adhemar, artilheiro daquele surpreendente São Caetano (bons tempos) que chegou a vice-campeão brasileiro em 2000? Aquele que tinha um temível petardo de meia distância e que fora do campo era um sujeito risonho e boa praça, com seu jeito simples e seu sotaque caipira?
Pois então: Adhemar resolveu encerrar a carreira de uma maneira inusitada: vai ser (ou pelo menos tentar) "kicker" no futebol americano. É isso mesmo. Quando vi o título da notícia no UOL pensei que ele iria jogar em algum time da liga norte-americana de "soccer", como fizeram antes tantos craques brasileiros em fim de carreira, como Pelé e Romário. Mas não: Adhemar quer ganhar o seu "green card" praticando o esporte mais autenticamente americano, só que usando sua arma mais poderosa: o chute. O Tampa Bay Buccaneers já mostrou interesse.
Adhemar é um pioneiro, um desbravador, como Pizarro, Rondon e Daniel Boone. É todo um novo horizonte, um mercado de trabalho virgem que se abre com sua atitude inovadora.
De agora em diante, aqueles futebolistas profissionais que já estão mais perto dos 40 do que dos 30, que vêem com apreensão a barriguinha crescer e o fôlego diminuir, já têm outro lugar para olhar, além do Japão, do Oriente Médio, do México ou do interior dos Brasis.
A opção é tentadora mesmo para os que nunca jogaram um futebol muito refinado, mas que possuem uma bomba escondida em uma das pernas, se não em ambas.
Não precisa ser um Roberto Carlos, um Nelinho, muito menos um Rivellino. Como o "gol" dos americanos do norte é bem alto, talvez sejam mais apropriados os beques acostumados a dar chutões para a arquibancada. Eles continuariam jogando futebol, mas um futebol diferente, com sotaque ianque. "Football", em suma.
A situação não deixa de ser paradoxal. No mercado de trabalho norte-americano, normalmente os brasileiros (e outros periféricos do planeta) entram como mão-de-obra não especializada, em condições de trabalho e remuneração que os cidadãos do Primeiro Mundo já não aceitam. São pedreiros, faxineiros, engraxates, entregadores de pizza.
No futebol americano passaria a ocorrer o contrário. Num jogo essencialmente bruto, em que a eficácia de cada jogador depende da força física e da capacidade de correr mais do que os outros, o "kicker" é o trabalhador especializado, o único que sabe chutar uma bola com o pé numa direção predeterminada. É o artista no meio de um bando de brutamontes.
Por tudo isso e também por simpatizar com o sujeito , torço de coração pelo sucesso de Adhemar na terra de Marlboro. Pelo menos uma vez na vida o esporte mais americano da América se curvaria ao povo que, como dizia João Cabral de Melo Neto, soube dar aos pés astúcias de mão.

MINHA SELEÇÃO
Já que a CBF divulgou seus indicados para a seleção do Brasileiro, aí vai a minha. Como muitos, não vi dezenas de jogos, e a minha seleção é inevitavelmente subjetiva e injusta. Mas telhado de vidro é comigo mesmo. Lá vai: Rogério; Paulo Baier, Fabão, Fabiano Eller e Júnior; Mineiro, Lucas, Zé Roberto (Santos) e Danilo; Fernandão e Obina. Técnico: Muricy Ramalho. Pronto. Pode malhar.

DURO NA QUEDA
É muito dura a profissão de jogador. Uma única lesão às vezes encerra uma carreira. Que dirá uma série delas? Maurinho, 28, brilhante lateral-direito campeão brasileiro com o Santos em 2002 e com o Cruzeiro em 2003, volta a treinar em janeiro, após quatro lesões no joelho direito. Que os deuses dos estádios lhe sejam favoráveis.

jgcouto@uol.com.br


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