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Geraldino vira andarilho para torcer no Maracanã
"Donos" da geral ressurgem e usam tática para fugir da polícia e manter tradição
Após mais de um ano longe do setor, já reformulado, torcedores ignoram cadeira
e broncas dos guardas para ver de pé jogo do Estadual
SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO
O Maracanã criou um novo
perfil de torcedor: o andarilho.
Na reabertura do setor do estádio que fica mais próximo do
campo, na noite de anteontem,
os geraldinos, antigos ocupantes da área, burlaram a segurança do novo local para manter a tradição de torcer em pé.
Depois de mais de um ano e
meio longe dali, eles se recusavam a se sentar nos assentos
instalados no setor. Decidiram
torcer ""andando" pelo espaço
onde funcionava a antiga geral.
Na nova reforma do estádio, a
geral, setor mais popular do
Maracanã, deu lugar a cadeiras.
""Sinto-me um peixe fora d'água. Não consigo ficar sentado.
Gosto de ver o jogo de pé, gritando, rezando, incentivando
os atletas. Como a polícia não
deixa mais isso acontecer, tenho que ficar andando. Mesmo
assim, o meu berro continua
ajudando o Fluminense", afirmou o tricolor Desirré Rogério
de Carvalho, 57, que há 40 anos
vê os jogos do seu time todo
vestido com as cores do clube.
Conhecido na antiga geral
como ""Pelas Pontas", por causa
do seu repetitivo grito quando
o time ataca, Carvalho freqüentou a área mais popular por 45
anos e afirmou que vai resistir.
""Não sou desordeiro, mas
não deixarei isso virar shopping. Só nesta noite [quarta-feira], andei de um lado para o outro por mais de 30 vezes. Os
apaixonados vão seguir aqui",
disse o mecânico, quase rouco
após a vitória do Fluminense.
Igual a Carvalho, dezenas de
torcedores assistiam ao jogo
em pé e fugindo dos policiais.
""Quando eles pediam que eu
me sentasse, eu andava para
outro lado. Driblei a polícia durante os 90 minutos do jogo.
Vou resistir até o fim. Só vou
parar se a polícia me amarrar
nestas cadeiras", disse o baiano
Aristides Teles, 52, que vê jogos
da geral desde o primeiro dia
que chegou ao Rio, há 28 anos.
Apesar do ingresso mais caro
-pulou de R$ 3 para R$ 10-, os
geraldinos mantiveram a irreverência no novo setor, que
abriga cerca de 30 mil pessoas e
anteontem recebeu por volta
de 10 mil. Centenas foram fantasiados. Teles levou uma bandeira branca e o rádio no ouvido, outro símbolo da geral.
""Aqui é um espaço sagrado.
Já fui Sarney, pai-de-santo, tornei-me até em torcedor-símbolo em 1989 [ano em que o Botafogo acabou com o jejum de 21
anos sem títulos], quando decidi assistir aos jogos com uma
carranca e deu certo. A alegria
da minha vida vai estar sempre
aqui", afirmou Teles.
O mecânico Robson Ruel, 45,
viu o jogo de pé com os três filhos. Todos fantasiados e fugindo de bronca dos policiais. ""A
visão é ótima, mas a brincadeira tem que continuar. O futebol
precisa deste calor humano",
disse Ruel, que se identifica como o ""mascarado tricolor".
Na noite de abertura do Estadual do Rio, em jornada dupla,
vários geraldinos levaram faixas avisando que não deixariam
o local e o seu jeito de torcer por
causa das cadeiras. ""Daqui só
saio para a sepultura", afirmou
Raimundo Rodrigues, 76, que
levava cartaz com a frase: ""Aqui
é o meu lugar desde 1950 [ano
de inauguração do estádio]".
A polícia, que estava mais
preocupada com objetos que
poderiam ser atirados da arquibancada no novo setor, informou que não efetuou prisões,
mas que os geraldinos terão
que se reeducar e, no futuro,
permanecer nas cadeiras.
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