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FUTEBOL
Cinema abre espaço para histórias de excluídas que usam o esporte para atrair holofotes e reivindicar seus direitos
Com bola, mulher faz levante e vira filme
CLAUDIA REGINA MARTÍNEZ
MATEO SANCHO CARDIEL
DA DPA
Histórias de mulheres que querem atrair holofotes, reivindicar
direitos e lutar por melhores condições de vida não são incomuns.
No ano da Copa, porém, o futebol
virou o meio para elas pelo menos
ganharem espaço nas telas.
No prestigiado Festival de Berlim, encerrado no último dia 17,
ao menos duas películas arrancaram aplausos do público exibindo
situações com essa temática.
Em "Offside" (impedimento,
em inglês), o iraniano Jafar Panahi mostrou com humor as dificuldades por que passa um grupo de
mulheres pelo fato de tentar assistir à partida classificatória da seleção iraniana para o Mundial deste
ano, programado para junho.
O Irã não permite a entrada de
mulheres nos estádios e, por isso,
elas costumam entrar disfarçadas
de rapazes. Em "Offside", várias
mulheres são descobertas e levadas por alguns soldados para um
setor fechado, ao lado do campo.
Durante os 90 minutos que dura
a partida, as moças fazem o possível e o impossível para tomar conhecimento do que está acontecendo no jogo, enquanto os soldados se esforçam para impedir
que elas consigam.
"Fizemos esse filme para chamar a atenção para o fato de que
não se respeitam os direitos humanos de algumas pessoas e que
elas não conseguem levar uma vida normal", explicou Panahi.
Embora o diretor iraniano novamente focalize a discriminação
contra as mulheres, como já tinha
feito no premiado "O Círculo",
desta vez ele apresenta uma imagem bem mais amável da sociedade iraniana, graças ao tom de comédia que conferiu à história.
Panahi admitiu que não é fácil
fazer cinema no Irã e conta que
recorreu a alguns truques, tais como assinar o roteiro com outro
nome, para poder realizar "Offside". Mas ele se mostrou otimista
quanto ao futuro, já que um filme
seu foi exibido pela primeira vez
em Teerã há pouco tempo.
"Sempre houve censura no Irã,
antes e depois da revolução. Todos os cineastas têm problemas,
mas cada um tem que buscar seu
caminho próprio", disse.
Outro filme, uma produção espanhola, percorreu caminho semelhante. O documentário "Estrellas de La Línea", também recebeu boas críticas no Festival de
Berlim. Ele retrata a aventura tragicômica de um grupo de prostitutas do bairro pobre de La Línea,
na Cidade da Guatemala, e mostra como as mulheres formam um
time de futebol para reivindicar
sua dignidade e seus direitos como mulheres e mães.
Não se trata, contudo, de uma
história verdadeiramente espontânea. O próprio diretor descreve
seu filme como "uma história real
baseada em um fato fictício".
Tudo porque foi o próprio Chema Rodríguez quem propôs às
protagonistas do filme essa maneira original de se manifestarem,
pelo futebol, e foi assim que nasceu "Estrellas de La Línea".
"Elas começaram a treinar, e,
quando vi que a coisa estava avançando a sério, voltei à Espanha
para procurar financiamento para o filme", contou o diretor.
Finalmente, depois de meses de
trabalho e 150 horas de rodagem,
o filme foi editado para 90 minutos, tempo no qual Rodríguez
compõe seu retrato social através
de "pessoas que conseguiram
equilibrar comédia e drama".
Apesar da seriedade do tema, o
filme é impregnado de um humor
que não reduz seu caráter realista,
pelo contrário, o ressalta.
"A vida é drama disfarçado de
comédia, e é esse o cinema que
quero fazer", explicou o diretor.
E ele não apenas fez como continua fazendo, já que a história lhe
serviu de ponto de partida para
seu próximo projeto, no qual pretende recriar a situação das mulheres no mesmo país, Guatemala. Novamente com um fato que
servirá para costurar uma crônica
social -a rodagem de um filme
no interior de um presídio feminino da América Central.
Chema Rodríguez se mostrou
satisfeito com o resultado de seu
filme, mas não está muito otimista quanto a seu poder de influência. "Não acredito que meu filme
possa mudar a situação. Não acredito na capacidade de cineastas e
escritores de modificar a realidade social", afirmou.
"Estrellas de La Línea" não foi o
único filme em Berlim que Chema Rodríguez desenvolveu relacionado ao esporte. Em meio ao
complicado processo de realização de seu documentário, ele foi
chamado pelo colega Gerardo
Olivares para escrever o argumento de "La Gran Final".
Também relacionado ao futebol, esse filme foi igualmente projetado no Festival de Berlim.
Ao que parece, a presença do futebol nas duas produções não se
deu por acaso, já que, como comentou Rodríguez, "o futebol
profissional não me interessa em
absoluto, mas está presente no cotidiano de todo o mundo".
"Estrellas de La Línea" vai estrear na Espanha no final de abril,
mas ainda deve demorar mais a
chegar à América Latina, depois
de fazer escala em vários festivais.
Não há, portanto, previsão para
a obra aportar no Brasil.
Chema Rodríguez reconhece
que seu principal objetivo é conseguir exibir na própria Guatemala um filme "feito com poucos recursos e muita ilusão".
Com a Reportagem Local
Tradução de Clara Allain
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