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O doce momento de Zagallo
ALBERTO HELENA JR.
da Equipe de Articulistas
Dois ou três segundos antes
da expulsão de Rincón, no jogo
de quinta, contra o Cruzeiro,
pela Copa do Brasil, uma certeza crescia em mim: esse Corinthians não só vai atropelar
a Lusa, como levantar a taça,
seja qual for seu adversário.
É que, pela primeira vez, desde que Luxemburgo assumiu o
comando técnico da equipe,
esse Corinthians conseguia
praticar um futebol solto, envolvente, agressivo, lógico. A
bola saía do meio-campo para
o ataque com fluência e, afora
as precipitações de Mirandinha, rondava a área adversária carregada de perigo.
Bastou, porém, um incidente, e o Corinthians refluiu ao
seu leito morno e plácido, permitindo a reação do inimigo.
Claro que hoje, lá estará Rincón, e a história é outra, mas
não uma sequência, apenas
um novo jogo, um novo roteiro, imprevisível e aleatório.
Apenas mais um jogo, contra
uma Lusa igualmente imprevisível e aleatória.
Confesso que tenho por Zagallo um afeto ensombrecido.
Como jogador, nunca foi meu
preferido. Canhoteiro, com
seus dribles mágicos, me encantava; Pepe, com sua objetividade, seus petardos demolidores, me entusiasmava. Mas
Zagallo, com aquele futebol
certinho, cinzento... Não, positivamente, não fazia minha
cabeça, muito menos me tocava o coração.
Não se engane, porém, o leitor mais jovem: Zagallo não
era nenhum cabeça-de-bagre.
Sabia jogar, driblar, passar,
cruzava com muita ciência e
ainda por cima tinha aquele
senso tático raro em jogadores
de sua época. Soube, aliás, recentemente, pelo Oldemário
Touguinhó, que, quando ainda juvenil nos tempos do América, Zagallo quase foi dispensado porque se excedia nos
dribles e nas firulas, o que me
provocou um choque, confesso.
Como técnico, muito jovem,
surpreendeu, no comando de
um timaço, como o Botafogo
de Garrincha, Gérson e cia. E
sua ida para a seleção do tri,
antes de ter sido alguma armação da ditadura, foi um
gesto de coragem dele. Explico:
Antonio do Passo, diretor da
CBD (CBF na época), convidou Dino Sani para o lugar de
Saldanha, que, depois de classificar o Brasil para a Copa de
70, fizera uma série de lambanças. Dino titubeou. Como
não havia tempo, Zagallo foi
consultado e aceitou no ato.
E quero usar o próprio passado vitorioso de Zagallo para
sugerir-lhe um desvio do epílogo desastroso que se insinua.
Em 70, relutou, mas acabou
cedendo à pressão da crítica e
da opinião pública que queriam Rivellino no time e Tostão ao lado de Pelé, e venceu.
Em 74, até o fim, desprezou
Ademir da Guia, e dançou.
Zagallo, meu velho, qual dos
dois foi o mais doce momento?
Então, que custa ceder novamente, se, neste caso, será
avançar, não retroceder?
Então, chame dois destros
para a meia-direita (seja lá
qual denominação você dá a
esse setor), tipo Giovanni e Raí
ou Juninho, se estiver em condições de jogo. E deixe a
meia-esquerda para os canhotos Rivaldo e Denílson disputarem a vaga.
É tão simples, meu velho, tão
simples como o seu futebol que
provou ser mais vitorioso do
que o do demolidor Pepe ou do
mágico Canhoteiro.
Alberto Helena Jr. escreve aos domingos, segundas e quartas-feiras
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