São Paulo, sexta-feira, 26 de agosto de 2005

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FUTEBOL

De volta, o amigo das criancinhas

MÁRIO MAGALHÃES
COLUNISTA DA FOLHA

O que era para ter sido um momento sublime do futebol, o reencontro dos dois craques supremos a que a minha geração teve a sorte de assistir, constituiu um episódio-síntese de um tempo de hipocrisia.
A visita de Pelé a Maradona, no programa "La Noche del Diez", consagrou a reconciliação dos ex-desafetos. Foi o que nos fizeram -ou tentaram fazer- acreditar. O anfitrião safou-se da morte e deu a volta por cima. O convidado sofre com um filho preso, e nada se compara à dor de pai e mãe.
A TV mostrou-os como companheiros a oferecer o ombro amigo. Além de comprovar que Pelé sabe cabecear com a testa e Maradona, quase inepto, não. Gostaria muito que fosse só isso. Pena que não foi. Fora do ar, Maradona cutucou: "Parece que os fatos o golpearam. Está mais aberto ao diálogo". Pelé retrucou, na Globo: "Pelo contrário. Quem mudou foi ele". Foi o fim da encenação.
Para Maradona, que há anos se refere a Pelé com desprezo, o visitante serviu para a decolagem na TV. Para Pelé, que se escuda na identidade de Edson para justificar as caneladas, pegou bem prestigiar o renascimento do velho antagonista. Tudo pelo pragmatismo.
Maradona estampou na camisa o logotipo do Mastercard, para o qual Pelé faz propaganda. Guillermo Bassignani, agente do brasileiro na Argentina, jura que não houve patrocínio para o encontro. No sábado, Antonio Maria Filho e Jorge Luiz Rodrigues revelaram no "Panorama Esportivo" do "Globo": o desempenho de Pelé lhe valeu US$ 120 mil, "pagos por uma operadora de cartão de crédito". Abraço subsidiado é coisa de tamanduá.
Pior foi saber pelo Rodrigo Bueno, na Folha, que Bassignani ainda é associado a Pelé. Ele falou em nome do parceiro e de Maradona: "Querem viajar juntos em campanhas pelas crianças, pela saúde, essas coisas". Pelé e Bassignani sabem tudo de ajuda às crianças pobres. Há uma década, tabelaram na jogada em que a Pelé Sports & Marketing Inc. abocanhou US$ 700 mil movimentados em torno de um evento pró-Unicef que nunca ocorreu.
Com a seção argentina do Fundo das Nações Unidas para a Infância, a PS&M se comprometeu a organizar um evento beneficente. Nada cobraria. Na moita, a empresa das Ilhas Virgens Britânicas arrumou um jeito de embolsar US$ 3 milhões pelos serviços "solidários".
Entrou na parada a Global Entertainment, firma dos EUA. Seu presidente: Guillermo Bassignani. O evento não saiu, mas os US$ 700 mil que chegaram à PS&M, em nome do amparo aos meninos carentes, ficaram com a offshore presidida por Pelé.
Quando a armação foi revelada, Pelé jogou a culpa no sócio Hélio Viana e vice-versa. Prometeu apurar e, talvez, entregar a grana ao Unicef. Não entregou. Segue a faturar com quem levantou os US$ 700 mil depois repassados à PS&M: Bassignani. A última foi o show com Maradona, a emoção patrocinada. Privatizaram até a camaradagem.

Um grande garoto
Todo mundo erra. Mulheres e homens de caráter reconhecem suas bolas fora. Eis o que Robinho disse (li no "Lance!") sobre os procedimentos que usou para forçar o Santos a liberá-lo: "Não ter ido treinar foi um erro. O Santos sempre pagou meu salário em dia. Eu fui sincero ao falar que estava com a cabeça no Real Madrid. Talvez se eu dissesse que não era para pagar o meu salário... Se fosse hoje, viria treinar e diria para o presidente ir negociando. [...] Nunca tive qualquer privilégio no Santos. As pessoas me vêem como estrela, e estrela deve dar o exemplo". Com Robinho na Espanha, não sei se a espera será mais longa para ver os seus jogos no Real ou os de Ronaldinho no Barcelona. Boa sorte!


E-mail: mario.magalhaes@uol.com.br

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