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AUTOMOBILISMO
Lorena, 8 anos, não gostou do presente de aniversário comprado pelo pai e fez a alegria de Fernando, 3
Campeão largou no cart que irmã rejeitou
DA REPORTAGEM LOCAL
"Cheguei até aqui sozinho, sem
a ajuda de ninguém, de um país
sem tradição no esporte e graças
ao meu próprio esforço."
À primeira vista a declaração de
Fernando Alonso após conquistar
o Mundial pode até parecer antipática. Mas reflete sua trajetória
até alcançar a F-1.
Apaixonado por automobilismo, o sonho do especialista em
explosivos José Luis Alonso era
ver sua filha mais velha, Lorena,
disputando campeonatos de kart.
No outono de 1984, quando a
menina completou 8 anos, o pai
resolveu construir um kart para
que ela pudesse correr, para desespero da mãe, Ana Díaz, balconista da tradicional loja de departamentos espanhola El Corte Inglés. De fabricação artesanal, o
"brinquedo" tinha 50 cc. Mas não
agradou a pequena Lorena.
Coisas do destino. Para a tristeza do pai, quem herdou o kart foi
o filho mais novo, Fernando, o
Nano, de apenas três anos, que
ainda tinha dificuldades para dizer suas primeiras palavras.
Foi assim, de maneira quase acidental, que teve início a carreira
do mais jovem campeão mundial
da história da F-1. Foi no estacionamento da Autonalón, uma concessionária Peugeot que até hoje
ocupa o mesmo número 35 da rua
Cerdeño, na pequena Oviedo, capital do principado de Astúrias,
no norte da Espanha.
Como o kart não havia sido
construído para o pequeno Fernando, o pai teve que fazer algumas adaptações nos pedais para
que seu filho pudesse brincar
-esse era o intuito até então.
Mas aquele primeiro contato foi
o suficiente para que ele se apaixonasse pelo kart e, especialmente, pelo mundo da competição.
Empolgado, o pai juntou um
grupo de amigos e passaram a fazer uma espécie de campeonato
improvisado para os filhos, que
ainda não tinham idade para participar de competições oficiais.
Assim como os karts, as pistas
eram improvisadas, e o grupo, conhecido como "Guardería", viajava todos os finais de semana por
algumas regiões espanholas.
Por causa da pouca idade das
crianças, os pais resolveram que
todos que competissem, independentemente da colocação, ganhariam um troféu, para evitar traumas. Com o passar dos anos, porém, o rechonchudo Nano passou
a sentir-se incomodado por ganhar prêmios mesmo sem vencer.
Foi a chave para que, aos seis
anos, começasse a disputar corridas oficiais, na categoria infantil.
Já na primeira temporada, ganhou sua primeira prova de verdade. No ano seguinte, no Campeonato Asturiano, deu a primeira demonstração de que poderia
chegar aonde chegou: venceu as
oito corridas que disputou.
Naquela época, começou a dar
mostras de outro fator que o
acompanharia até hoje: a sorte.
No Campeonato Espanhol de
1994, disputado em um único final de semana, Fernando não
chegou como favorito. Na última
corrida, vinha em terceiro quando os dois primeiros colocados
bateram e tiveram que abandonar. Resultado: assumiu a ponta e
conquistou mais um troféu.
Os anos se passaram, os títulos
se acumularam, e o piloto entrou
na adolescência. Em 1996, no entanto, um dia ficaria marcado em
sua memória: 14 de julho.
Fernando tentava, ao lado de
outros 81 pilotos, conquistar seu
primeiro título internacional, no
Mundial de Kart júnior em Genk,
na Bélgica. Depois de resultados
fracos nas eliminatórias, conseguiu o oitavo lugar no grid para a
corrida que definiria o campeão.
Mordido por ter ficado em terceiro lugar no ano anterior, partiu
para o tudo ou nada. Na primeira
volta já era o segundo colocado.
Na segunda, liderava. Pronto, o
espanhol conquistaria assim seu
primeiro Mundial.
O nome do jovem piloto já fazia
parte do cenário internacional.
Seguiram-se corridas na Itália, na
América do Norte, no Japão. Em
1998, resolveu que queria mais.
Decidiu tentar o título da Monaco
Cup, uma corrida disputada no final do ano e que confere bastante
prestígio a seu vencedor.
Confiante por largar da segunda
colocação, partiu para cima do
pole logo no início da corrida,
mas o traçado -que conta com
partes do que é usado na F-1-
não favorece ultrapassagens.
Na quarta volta, atacou. Jogou
seu kart por dentro de uma curva,
mas os dois se tocaram. O espanhol abandonou, inconformado
com a atitude do rival, um finlandês chamado Kimi Raikkonen.
Depois de uma bem-sucedida
corrida na F-Toyota -sem nunca
ter pilotado um monoposto com
marchas- causou espanto em
todos ao largar em último e em
apenas três voltas já ter mais de
três segundos de vantagem sobre
os demais pilotos.
Apesar de amar guiar karts e já
estar ganhando um bom dinheiro
com isso, em 1999 acertou um
contrato para competir na F-Nissan. Precoce, ganhou o campeonato logo no ano de estréia.
Como prêmio pela conquista e
graças a um acordo entre a organização da categoria e a Minardi,
Fernando pôde, pela primeira
vez, se sentar em um carro de F-1.
A experiência lhe rendeu um posto como piloto de testes.
Mesmo já estando com um pé
na principal categoria do automobilismo, no ano seguinte o espanhol correu a F-3000. Além não ficar parado, queria aprender os
circuitos da F-1. Foi quarto.
Durante aquela temporada, a
condição de titular na Minardi do
argentino Gastón Mazzacane era
questionada. O consenso era que
o espanhol, apesar da pouca idade
-18 anos- tinha mais condições de assumir o cockpit.
Mas exigências dos patrocinadores da equipe o deixaram no
banco de reservas. Nem isso, porém, fez que os poderosos da F-1
deixassem de prestar atenção no
jovem piloto. Maior prova disso
foi que, naquele mesmo ano, acertou contrato com Flavio Briatore,
que já era chefe da Renault.
Em 4 de março de 2001, Nano
faria, enfim, sua estréia na F-1, pilotando um Minardi -tornava-se o terceiro mais jovem piloto a
chegar no topo do automobilismo. Largou em 19º e completou
aquele GP da Austrália em 12º.
Depois de um ano amargando as
últimas colocações do grid -terminou o Mundial no 23º posto-,
transferiu-se de vez para a Renault para ser piloto de testes.
Aquele ano, porém, serviria de
aprendizado, não só para ele como para sua equipe, que voltou a
dar nome a um time de F-1 após
16 temporadas. Várias baterias de
testes e milhares de quilômetros
depois, o espanhol estava pronto
para sua segunda estréia na categoria, em 9 de março de 2003,
mais uma vez no mesmo cenário,
o Albert Park, em Melbourne.
Apesar de sair em décimo em
Melbourne, completou a corrida
em sétimo e marcou seus dois primeiros pontos na categoria.
Nos 932 dias que se passaram
entre aquele domingo e ontem,
muita coisa mudou. Fernando virou Alonso, ganhou corridas -a
primeira na Hungria, em 2003-,
fez fortuna e escreveu seu nome
na história.
(FÁBIO SEIXAS, TALES TORRAGA E TATIANA CUNHA)
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