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FÁBIO SEIXAS
A pasmaceira da derrota
A F-1 ainda vive um estado de choque, espécie de anestesia coletiva, após a derrota mais trágica dos últimos anos
ACEITAR A derrota é algo complicado. Entender uma derrota retumbante é ainda pior.
Leva tempo. Às vezes, muito tempo.
Antes, há um período de abalo emocional, de choque, de vertigem, de
pasmaceira, de anestesia coletiva.
A F-1 passa por isso agora.
Há 20 dias, Hamilton era o campeão do mundo. Líder da tabela desde junho, tinha 107 pontos. Doze a
mais que Alonso. E 17, veja bem, 17
pontos de folga para Raikkonen.
Mais: tinha a pole position para o
GP da China. Em 6 de outubro, o inglês estava no topo do mundo. Era,
aliás, "O Rei do Mundo", título da
biografia escrita pelo jornalista e escritor britânico Frank Worrall, lançada na semana daquela corrida.
A toalha de Alonso já estava no
chão. "Brilhante Lewis a um passo
do título", proclamava a "Autosport". Para Nigel Roebuck, colunista
da revista desde os 70, "Lewis fez
uma corrida de campeão" no Japão.
A "Autosprint" garantiu: "Hamilton
está com o título no bolso". Esta coluna não escapou do vaticínio furado: "Em 56 temporadas, de 1951 até
a chegada do inglês, só seis pilotos
venceram um GP no ano de estréia.
E ele vai ganhar um campeonato".
Não, não ganhou.
No dia seguinte, 7 de outubro, cometeu o primeiro grande erro da
carreira. Mas ainda estava tranqüilo:
não pontuou, mas a vitória em Xangai ficou com Raikkonen, o coadjuvante da luta pelo título. E, como
Dennis fez questão de frisar após a
prova, a estratégia de Hamilton foi
planejada para combater Alonso...
O finlandês era "café com leite".
Hamilton saiu de lá com os mesmos 107 pontos na tabela, quatro de
folga para Alonso, sete sobre Raikkonen. Vantagem menor, mas uma
corrida a menos para o fim. O GP
Brasil seria mera formalidade, sentimento que explodiu no último sábado com a segunda colocação no grid.
No dia seguinte, 21 de outubro, cometeu o segundo grande erro, ao
tentar passar Alonso por fora no fim
da Reta Oposta. E o terceiro, ao acionar acidentalmente o ponto morto.
Estava consumado o desastre.
E, tal qual o "Maracanazo", a derrota do vôlei feminino para a Rússia
em Atenas, o fiasco do Dream Team
no Mundial de 2002 e tantas outras
tragédias, já há várias explicações
práticas e teorias conspiratórias,
mas ainda não houve assimilação.
E, sintoma do choque, estão atirando para todo lado. Principalmente na Inglaterra. O "Guardian", na
segunda-feira, já comparou Hamilton a Tim Henman, que chegou a
quatro semifinais de Wimbledon e
caiu em todas. Ecclestone, ontem,
culpou a falta de pulso de Dennis.
"Qual é o verdadeiro Hamilton? O
estreante brilhante que estava a um
fio de cabelo do título? Ou o estreante brilhante que, em duas semanas,
jogou no lixo a chance de uma vida?", perguntou o "Guardian".
Só saberemos nos próximos anos.
Nosso erro, porque somos humanos
como Hamilton, foi acreditar cegamente que já sabíamos a resposta.
fseixas@folhasp.com.br
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