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saco sem fundo
Novo Maracanã custa estádio de Copa
Em oito anos e meio, gasto na reforma será de R$ 252 milhões; obra para o Pan consome triplo do anunciado em 2005
Com cobertura móvel, arena de Leipzig custou R$ 244 milhões; no Rio, recursos públicos garantem abrigo
só para metade da torcida
MÁRIO MAGALHÃES
SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO
No estádio dos gols de placa,
os torcedores e visitantes que
chegam pelo saguão dos elevadores vêem tantas placas nas
paredes como pés de velhos
craques impressos na argamassa do Hall da Fama.
Em uma delas se lê: "Inauguração da 1ª fase das obras de reforma do Maracanã; 1º Mundial
Interclubes; 06 de janeiro de
2000". Abaixo, outra: "Inauguração da grande reforma do Estádio Jornalista Mário Filho
-Maracanã; período de outubro
de 1999 a abril de 2002; Rio de
Janeiro, 04 de abril de 2002".
As placas têm pedido limpeza
assídua. O que não falta no antigo "maior estádio do mundo"
são nuvens de pó: o canteiro de
obras quase permanente nos
últimos oito anos se alvoroçou
com a proximidade do Pan-Americano de 2007.
De janeiro de 1999 ao mês
passado foram consumidos R$
157 milhões de verbas do Estado do Rio em reformas do complexo do Maracanã -estádio de
futebol, ginásio Maracanãzinho, parque aquático Júlio Delamare e estádio de atletismo
Célio de Barros.
Até a abertura do Pan, a ser
realizada no Maracanã no dia
13 de julho, serão gastos mais
R$ 95 milhões. No total, R$
252.092.950,10, sem atualização monetária, concentrados
na arena de futebol.
São números fornecidos pela
Suderj (Superintendência de
Desportos do Estado do Rio de
Janeiro), com base nas planilhas da Emop, a empresa estadual de obras públicas.
É dinheiro suficiente para erguer modernos estádios de Copa do Mundo: o de Leipzig, da
Alemanha-2006 (custou o
equivalente a R$ 244 milhões),
ou o de Seogwipo, da Coréia-2002 (R$ 203 milhões).
O volume de recursos é nominalmente o quádruplo dos
R$ 60 milhões anunciados para
a "grande reforma" pelo então
governador Anthony Garotinho em junho de 1999.
Em abril de 2005, a sucessora
e mulher de Garotinho, Rosinha Matheus, afirmou que sairiam por R$ 71 milhões as obras
que deixariam o complexo tinindo para o Pan. De janeiro do
ano passado até os Jogos a conta fechará em R$ 192 milhões,
beirando o triplo do estimado
pela governadora.
Não são apenas orçamentos e
estimativas que não se confirmam. Em outubro de 2005, o
governo do Estado divulgou
que em abril de 2006 o Maracanãzinho seria reinaugurado.
Se mantido o novo prazo
(abril de 2007), o atraso será de
um ano. A conclusão da reforma do Maracanã, cujo prazo
era o mês que vem, ficou para as
vésperas do Pan.
Placa de museu
Sob as duas placas que celebram as reformas em 2000 e
2002 há uma terceira: "Inauguração do Novo Espaço Cultural
e Esportivo do Maracanã; Rio, 4
de abril de 2002".
O tal espaço, em virtude das
obras longevas, não está em
funcionamento. Ocuparam-no
federações desalojadas de setores em reforma.
Mais adiante, as portas fechadas são as do Museu Internacional Mané Garrincha,
inaugurado em abril de 2002
com pompa, circunstância e
placa. O Estado desembolsou
R$ 4 milhões no projeto. Sem
acervo, o museu dedicado ao
futebol operou poucas semanas. Mais de quatro anos depois, segue o abandono.
Com 1.200 trabalhadores em
ação (do consórcio de empreiteiras Odebrecht, OAS e Andrade Gutierrez), tudo que o Maracanã não parece -e não está- é
abandonado. O problema é outro: o bate-estaca atravessa os
anos e se insinua como infinito.
Cariocas falam em "obra de
igreja". O novo Maracanã, cuja
beleza das cadeiras coloridas já
se desenha, continuará como
uma instalação velha se confrontada com os padrões requeridos para a Copa.
Se o Brasil sediar o Mundial
de 2014, para receber alguns jogos o Maracanã exigirá um novo ciclo de mudanças.
Em julho, o estádio vai oferecer 3.000 vagas de estacionamento. A Fifa impõe 15 mil. A
sugestão da Suderj é erguer um
edifício-garagem para 12 mil
veículos em um terreno federal
vizinho, com dinheiro público.
Dos 45 mil assentos da arquibancada, 20 mil não têm -nem
terão em 2007- encosto com
no mínimo 30 cm de altura.
Precisariam ser trocados.
Placa nova
Dos R$ 252 milhões, a Suderj
estima que 70% sejam investidos no estádio de futebol e 30%
no resto do complexo.
Os R$ 176 milhões só para o
estádio o deixarão distante do
conforto e da modernidade das
arenas dos Mundiais recentes.
A cobertura de Leipzig é móvel, para impedir que a chuva
molhe os torcedores. Em Hamburgo, também na Alemanha
(R$ 261 milhões investidos), todos os assentos são cobertos.
No Maracanã, 50% do público seguirá à mercê do aguaceiro. A administração diz que o
alongamento da cobertura engoliria R$ 200 milhões.
Outra diferença é que, na
Alemanha, houve estádios
construídos por empresas privadas, sem verbas públicas. O
de Gelsenkirchen (R$ 514 milhões) não tem um só centavo
do Estado. No Rio, todos os
centavos são estatais.
A capacidade dos novos estádios europeus e asiáticos é menor que a do novo Maracanã
-cerca da metade dos 95 mil a
100 mil lugares previstos.
Graças ao conforto e à tecnologia, contudo, as arenas estrangeiras permitem intensa
exploração comercial, com
shows e outros eventos lucrativos. O déficit anual do Maracanã é de R$ 2 milhões.
Se dependesse de promessa,
o estádio erguido para a Copa
de 1950 teria as qualidades do
futebol nacional.
"Em dezembro, o Maracanã
será um dos mais modernos estádios do mundo", alardeou em
junho de 2000 o então presidente da Suderj, Francisco de
Carvalho. O hoje deputado
inaugurou muitas placas.
Em julho, o Maracanã, reformado por R$ 252 milhões, ganhará mais uma delas.
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