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TOSTÃO
Quem conhece o Afonso?
Quando o técnico Dunga anunciou sua convocação, nunca o Google trabalhou tanto para desvendar o atleta
HOJE, VOU BRINCAR de detetive e tentar descobrir os motivos da convocação do desconhecido Afonso, 26 anos, para a
seleção brasileira.
Uma das razões deve ser a falta de
um excepcional centroavante. É
preciso achá-lo. Tomara que seja o
Afonso. Ficamos mal ou bem acostumados com Ronaldo e Romário,
que também jogaram na Holanda.
Será que Dunga é supersticioso?
Confesso a minha ignorância sobre
o jogador, de quem nunca tinha ouvido falar.
Quando Dunga disse Afonso, toda
a imprensa achou que era o nome
oficial de um craque conhecido pelo
apelido. Ao perceberem o engano,
foi uma correria. Minutos depois já
havia em todos os sites esportivos
um grande número de informações
do novo craque. Nunca o Google trabalhou tanto.
Dizem que dias depois já havia até
bate-papos com Afonso na internet,
desses que fazem com as estrelas.
Afonso falou sobre seu sabonete
preferido, o prato que mais gosta e
do seu livro de cabeceira -deve ser o
do Paulo Coelho.
Na entrevista, Dunga ironizou a
imprensa por não conhecer o Afonso, como se o técnico tivesse visto,
no campo, vários jogos do novo convocado. Além disso, a ESPN, única
TV que passa jogos do Campeonato
Holandês para o Brasil, só mostrou
uma partida do Heerenveen, time
do Afonso. Quem viu disse que ele
atuou mal e não fez gols.
Dias depois, Jorginho explicou o
mistério. Disse que ele e Dunga viram na íntegra várias fitas de partidas do jogador, enviadas por um
amigo ou olheiro. Todo técnico de
seleção diz que tem uma rede de
olheiros espalhados pelo mundo. Fica mais científico.
Ou a principal fonte de informações do técnico foi o programa "Expresso da Bola", do Sportv, que,
coincidentemente, fez uma reportagem na Holanda sobre o Afonso antes da convocação e que foi mostrada nesta quinta-feira?
O mesmo repórter fazia na Copa
de 2006, ao mesmo tempo, reportagens para o Sportv e para a CBF ou
para uma empresa contratada pela
entidade. Para isso, ele estava sempre entre os jogadores, em lugares
proibidos para o restante da imprensa.
Os raríssimos privilegiados que viram o Afonso jogar contam que não
é somente o número de gols que impressiona -ele é no momento o
maior artilheiro de campeonatos da
Europa-, mas também a sua altura,
peso e outras qualidades físicas.
Afonso seria um centroavante moderno, como se fosse projetado por
um megacomputador.
Os apaixonados pela tecnologia e
pelo tecnicismo vão dizer que tudo
agora no futebol é científico, medido, calculado e que não há mais lugar
para análises a olho nu e para empirismos do passado, quando não havia tira-teimas, dosagem de lactato
no sangue, pré-temporada e outros
avanços científicos.
As minhas críticas não são contra
a tecnologia. Não sou louco nem
burro, embora tenha as minhas desconfianças. O que me incomoda é
esse exagerado fascínio pela máquina e o bombardeio de informações,
muitas inúteis, que recebemos.
Estamos desaprendendo a observar e a perceber as subjetividades.
Estamos ficando cegos.
tostao.folha@uol.com.br
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