São Paulo, sexta-feira, 27 de maio de 2011

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XICO SÁ

Faz, amor


Zé Love está há 65 dias sem ter o prazer de fazer gol. Sina de quem vive o calvário, fará o do título


AMIGO TORCEDOR, amigo secador, sempre que um atacante vive uma estiagem de gols, como esse rapaz cujo apelido denuncia o gosto pelas boas coisas da vida, eu me lembro do infortúnio do pescador Santiago, 84 dias mar adentro sem fisgar um cação-martelo para o almoço.
Isso mesmo, vamos falar do Zé Love, pago para fazer gols, há 65 dias sem ter o prazer -talvez um dos maiores da existência- de entrar ali onde mora o goleiro e apanhar a bola no fundo da rede. Azar ou não estaria no ofício mais adequado?
Ele sabe fazer seus golzinhos sim. Acreditemos que seja uma fase. Todo mundo tem seus jejuns demorados. O bom vendedor que não vende, a prostituta que não atende, o dom Juan que perde a lábia.
Acontece nas melhores famílias do Crato. Com Zé Love e com o Santiago, o homem de "O Velho e o Mar", escrito pelo camarada Hemingway. Jovens, falo sério, leiam o livro. Vale por um tesouro da juventude. Sim, amigo, você que leu a obra deve estar pensando agora: "Ah, o velho pescador era um sábio, quase um guru, não me venha com as suas comparações malucas". Entendo. Nosso Zé tem uns apagões mentais que deixam qualquer torcedor, e não só o santista, a perder o juízo.
Principalmente as crianças. Como as crianças são impacientes com os gols perdidos. Esqueça o brinquedo na noite de Natal, tudo bem, mas não perca um gol feito na frente de um menino que começa a gostar de futebol.
Lá vem o Neymar, dribla um, dribla outro, antevê a bola que tabela na canela do adversário, retoma e entrega com açúcar e com afeto. "Faz, amor", parece sussurrar ao Love. O cara, enfezado, recusa o presente. Tomara que não esteja guardando os gols para os italianos. Negócio é negócio, e a mente do homem costuma partir antes dos seus pés.
O atacante do Peixe vai ser Zé no Genoa depois da Libertadores. Que cidade inacreditável, amigo, só perde em beleza e contundência para o assombrado Recife.
Antes, porém, vai fazer o que costuma ser feito por aqueles que quaresmam no deserto: milagre. O gol do título. Pode escrever. É sina de quem vive o calvário. Não, Zé, tu não és Jesus, muito menos Santiago, homem para quem rezo diariamente.
Voltando a Genoa, Zé, como tem mulher linda. Espero que isso te anime. Mas, como disseste, toda sorte agora apenas no jogo. No teu caso -és jovem, chegado e destemido-, podes esperar um pouco. Que faças gol, jamais a guerra.

xico.folha@uol.com.br

@xicosa


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