São Paulo, domingo, 27 de julho de 2008

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TOSTÃO

É proibido ser diferente


A cartilha é uma forma de disciplinar e reprimir, impor limites e unificar os atletas, como se eles fossem iguais


OS ATLETAS brasileiros já receberam sua cartilha, feita pelo COB (Comitê Olímpico Brasileiro), com o nome de "Regulamento das Delegações".
Independentemente do conteúdo, do que é certo ou errado, toda cartilha, com suas regras, proibições e punições, é uma maneira de disciplinar e também de reprimir, estabelecer limites e unificar o comportamento, como se as pessoas tivessem os mesmos desejos.
É proibido ser diferente.
A sociedade, de uma forma parecida, é uma grande cartilha.
A cultura e a civilização atual só existem por causa da repressão e da sublimação dos instintos e dos desejos individuais. São necessárias para evitar a anarquia, mas pagamos um preço por isso.
Entre tantas proibições, os atletas não podem participar de jogos de azar, deixar a cama desarrumada, fazer comercial, ter a companhia de outras pessoas que não participam dos Jogos (nem mesmo pessoas amadas?), tirar fotos da cerimônia de abertura, criticar técnicos e dirigentes, dar entrevistas a favor do Tibete e falar de problemas políticos e religiosos.
Apesar de ser contra cartilhas, vou fazer a minha para o futebol. A intenção não é ditar regras nem ensinar nada a ninguém. Quero apenas dar a minha opinião e brincar com um assunto sério.
Jogador não pode beijar o escudo do clube na assinatura de contrato, correr para abraçar e agradar ao professor após um gol, dizer sempre as mesmas coisas nas entrevistas, ser um boneco nas mãos de empresários, jogar em um clube e pensar no dinheiro que vai ganhar no próximo e fazer somente o que o técnico mandar.
Treinador não pode pensar somente na vitória e desprezar a qualidade do espetáculo, ser defensor da mesmice, ser um Professor Pardal, um retranqueiro, e não deve falar demais certas palavras e expressões, como encaixe, foco, atitude, equilíbrio, mecânica de jogo, oportunizar, segunda bola.
Gallo, técnico do Atlético-MG, disse que falta o encaixe da bola positiva, ou seja, fazer gols.
Torcedor pode vaiar os jogadores, chamar o técnico de burro, mas não pode ter atitudes racistas, jogar objetos no gramado e ir aos treinamentos para ofender o treinador e os atletas.
Dirigente não pode depender tanto de empresário, ser ditador, administrar sem transparência e, se cometer falcatruas no clube, ficar livre de punições nas Justiças civil, criminal, além da esportiva.
Dirigente não pode ainda permitir partidas em gramados em estado ruim nem em estádios sem condições básicas de conforto, segurança e higiene.
Jornalista não pode analisar partidas somente pelos melhores momentos e por informações colhidas na internet, ser amigo de jogadores, dirigentes e treinadores, nem fazer comercial durante seu trabalho.
Vou fazer também a minha cartilha para cumprir.
Vai ser longa.
Entre tantas coisas, vou tentar cometer menos erros de português, devanear menos e falar mais de detalhes técnicos e táticos (muitos leitores pensam o contrário), e assistir a mais jogos do Grêmio e do Vitória, times que são pouco comentados fora de seus Estados.


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