São Paulo, sexta-feira, 27 de agosto de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O MARATONISTA

FURACÃO na Acrópole

Guia em Atenas, a brasileira Nina desconcerta turistas numa visita ao Parthenon, com chamada oral, historinhas infantis e comédia involuntária e ainda desvenda o mistério da azeitona preta

PAULO SAMPAIO
ENVIADO ESPECIAL A ATENAS

"Um, dois, três... oito, acho que está todo mundo aí", diz a guia de turismo Nina Romanou, depois de contar os integrantes do grupo que fará um city tour por Atenas.
A maratona entra na cidade e, antes de se dirigir ao estádio Panathinaiko, o ponto final da caminhada, vai tergiversar um pouco.
Para começar, pega uma carona na excursão que visita a Acrópole, o monumento mais famoso da Grécia. O ônibus parte de Glifada, bairro de classe média alta ao sul da cidade, onde ficava uma das casas do multimilionário Aristóteles Onassis. Nina mostra a casa: nada demais, uma construção de pedras, com uma torre arredondada, a dois quarteirões da praia.
Explica que a residência mais suntuosa de Onassis era a da ilha de Scorpios, onde na década de 70 os paparazzi clicaram Jacqueline Kennedy, então sua mulher, tomando banho de sol nua na praia. "Aquela igreja ali, de estilo bizantino, é nova, tem 105 anos", diz Nina, mudando de assunto de repente para testar a atenção da platéia. Risos. "Ué, as do centro tem 800 anos", ela completa, séria.
Excursões em grupo podem ser um programa chatíssimo, mas nesse caso a guia salva tudo: nascida no Rio de Janeiro, filha de pais gregos que voltaram para Atenas há 19 anos, Nina é exemplo raro da categoria que consegue falar de estátuas, colunas e templos sem que soe uma decoreba sonífera.
De frente para o Parthenon, o templo erigido por Péricles cinco séculos antes de Cristo, ela pergunta para uma integrante do grupo:
"Por que os persas não destruíram o Parthenon na campanha de 480 a.C., Suzana?" A própria Nina responde: "Porque o Parthenon não existia ainda. Foi construído em 447a.C", explica.
E vai em frente, dizendo coisas amalucadas que fazem dela uma engraçada involuntária: o mais dispersivo dos seres não consegue deixar de prestar atenção. "Viram que a maioria das estátuas perdeu o nariz? Por que, seu Rodrigo? Porque o braço delas não mexe, como o nosso, para defender seu rosto em caso de queda para frente."
A técnica ajuda a diluir o que seria maçante, como excesso de nomes e datas. Em meio a informações precisas sobre batalhas, deuses e arquitetos, ela conta, por exemplo, que "o embaixador inglês lorde Elgin foi muito espertinho: disse que precisava fazer estudos, pegou alguns relevos do Parthenon, na época da invasão turca, e nunca mais devolveu".
Sobre a restauração do monumento, iniciada em 1979, Nina diz que já dura mais que os nove anos de construção. Perto das colunas, ela explica que seguem o modelo clássico de proporção -oito no lado menor e 17 no maior: "Elas parecem eqüidistantes uma da outra mas não são: por que, dona Jane? Erraram no cálculo? Nãããão! Simplesmente eles não queriam fazer algo artificial, mas como a vida, cheio de desigualdades. No fim, tudo é tortinho, mas parece perfeito, entende?"
Lendas são transformadas em historinhas para crianças. "Um dia Zeus acordou com uma dor de cabeça infernal. Aí veio o deus do fogo, Ephistos, e pimba! Deu uma machadada na testa dele, abriu um buraco. O que saiu dali? Atenas, a deusa da sabedoria. E o que isso quer dizer? Que as filhas são as maiores dores de cabeça dos pais."
O grupo é carioca, o que deixa tudo mais descontraído. Ao voltar do banheiro, a turista Edla comenta que a porta fica aberta e dá para ver tudo do lado de fora. "Faz parte do congraçamento libertino da época, relaxa", diz Rodrigo.
Na hora da saída, o furacão Nina pára embaixo de uma oliveira, à espera de dois retardatários, e pergunta: "Qual a diferença da azeitona verde para a preta?". Ninguém responde. "A preta é a verde madura", explica.
Você sabia?


Texto Anterior: Memória: Influência européia marca história da modalidade no país
Próximo Texto: Programação da TV
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.