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O MARATONISTA
FURACÃO na Acrópole
Guia em Atenas, a brasileira Nina desconcerta turistas numa visita ao Parthenon, com chamada oral, historinhas infantis e comédia involuntária e ainda desvenda
o mistério da azeitona preta
PAULO SAMPAIO
ENVIADO ESPECIAL A ATENAS
"Um, dois, três... oito, acho que
está todo mundo aí", diz a guia de
turismo Nina Romanou, depois
de contar os integrantes do grupo
que fará um city tour por Atenas.
A maratona entra na cidade e,
antes de se dirigir ao estádio Panathinaiko, o ponto final da caminhada, vai tergiversar um pouco.
Para começar, pega uma carona
na excursão que visita a Acrópole,
o monumento mais famoso da
Grécia. O ônibus parte de Glifada,
bairro de classe média alta ao sul
da cidade, onde ficava uma das
casas do multimilionário Aristóteles Onassis. Nina mostra a casa:
nada demais, uma construção de
pedras, com uma torre arredondada, a dois quarteirões da praia.
Explica que a residência mais
suntuosa de Onassis era a da ilha
de Scorpios, onde na década de 70
os paparazzi clicaram Jacqueline
Kennedy, então sua mulher, tomando banho de sol nua na praia.
"Aquela igreja ali, de estilo bizantino, é nova, tem 105 anos", diz
Nina, mudando de assunto de repente para testar a atenção da platéia. Risos. "Ué, as do centro tem
800 anos", ela completa, séria.
Excursões em grupo podem ser
um programa chatíssimo, mas
nesse caso a guia salva tudo: nascida no Rio de Janeiro, filha de
pais gregos que voltaram para
Atenas há 19 anos, Nina é exemplo raro da categoria
que consegue falar de
estátuas, colunas e templos sem que soe uma
decoreba sonífera.
De frente para o Parthenon, o templo erigido por Péricles cinco séculos antes de Cristo, ela
pergunta para uma integrante do grupo:
"Por que os persas não
destruíram o Parthenon
na campanha de 480
a.C., Suzana?" A própria
Nina responde: "Porque
o Parthenon não existia
ainda. Foi construído
em 447a.C", explica.
E vai em frente, dizendo coisas amalucadas
que fazem dela uma engraçada involuntária: o
mais dispersivo dos seres não consegue deixar de prestar atenção. "Viram que a maioria
das estátuas perdeu o nariz? Por
que, seu Rodrigo? Porque o braço
delas não mexe, como o nosso,
para defender seu rosto em caso
de queda para frente."
A técnica ajuda a diluir o que seria maçante, como excesso de nomes e datas. Em meio a informações precisas sobre batalhas, deuses e arquitetos, ela conta, por
exemplo, que "o embaixador inglês lorde Elgin foi muito espertinho: disse que precisava fazer estudos, pegou alguns relevos do
Parthenon, na época da invasão
turca, e nunca mais devolveu".
Sobre a restauração do monumento, iniciada em 1979, Nina diz
que já dura mais que os nove anos
de construção. Perto das colunas,
ela explica que seguem o modelo
clássico de proporção -oito no
lado menor e 17 no maior: "Elas
parecem eqüidistantes uma da
outra mas não são: por que, dona
Jane? Erraram no cálculo?
Nãããão! Simplesmente eles não
queriam fazer algo artificial, mas
como a vida, cheio de desigualdades. No fim, tudo é tortinho, mas
parece perfeito, entende?"
Lendas são transformadas em
historinhas para crianças. "Um
dia Zeus acordou com uma dor de
cabeça infernal. Aí veio o deus do
fogo, Ephistos, e pimba! Deu uma
machadada na testa dele, abriu
um buraco. O que saiu dali? Atenas, a deusa da sabedoria. E o que
isso quer dizer? Que as
filhas são as maiores dores de cabeça dos pais."
O grupo é carioca, o
que deixa tudo mais descontraído. Ao voltar do
banheiro, a turista Edla
comenta que a porta fica
aberta e dá para ver tudo
do lado de fora. "Faz
parte do congraçamento
libertino da época, relaxa", diz Rodrigo.
Na hora da saída, o furacão Nina pára embaixo de uma oliveira, à espera de dois retardatários, e pergunta: "Qual a
diferença da azeitona
verde para a preta?".
Ninguém responde. "A
preta é a verde madura",
explica.
Você sabia?
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