São Paulo, sábado, 27 de setembro de 2008

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No recomeço, Zé Roberto dilata universo feminino

Técnico da seleção de vôlei ouro em Pequim vislumbra novas lições com Pesaro

Depois de "crescer bastante" no convívio com brasileiras, treinador inicia novo ciclo olímpico cercado de alemãs, italianas e holandesas


MARIANA LAJOLO
DA REPORTAGEM LOCAL

José Roberto Guimarães inicia hoje seu novo ciclo olímpico. No ginásio do Ibirapuera, o treinador vestirá a camisa do Pesaro em uma competição internacional, porém seus olhos já buscam novos horizontes para a seleção feminina de vôlei. Nesta temporada, ele se dividirá entre a equipe italiana e viagens para observar atletas brasileiras e cuidar da avalanche de compromissos após a conquista do ouro em Pequim. No clube, cercado de alemãs, argentinas, holandesas e italianas, vislumbra ainda mais lições sobre o universo feminino. No Brasil, espera ajudar suas pupilas a lidarem com o assédio e a não repetirem os erros da seleção campeã em Barcelona-1992. Tenta também cumprir sua primeira missão: encontrar uma substituta para Fofão. "Recomeçaremos um trabalho, será um grande desafio. Vamos correr alguns riscos daqui para a frente, mas serão riscos calculados", declarou ele em entrevista à Folha.

 

FOLHA - Em 1992, você foi campeão olímpico com o time masculino, que teve problemas após a medalha. Isso preocupa agora?
ZÉ ROBERTO
- O que elevou o nível desse time [campeão na China] foi a competição interna. Em 1992, não havia isso. Se tivermos jogadoras chegando, as que estão aí sempre vão querer estar bem. Mas tenho alertado as jogadoras. O importante é continuarmos sendo os mesmos. O time será mais cobrado, exigido, elas agora são espelho. É importante se cuidar. É musa? Pode ser, mas que tipo de musa? Na quadra, todas são iguais e terão de ralar. O caminho [para o ouro] foi duro, elas sabem disso. Você tem de continuar a fazer o que estava fazendo. Existe outro trabalho a ser feito, que é o que vai garantir que as pessoas continuem a se interessar por você, vai ter de voltar para Saquarema [no CT do vôlei], treinar...

FOLHA - O mercado masculino sempre foi mais valorizado. A medalha ajuda a mudar esse cenário?
ZÉ ROBERTO
- Espero mais patrocinadores e mais adeptas. O feminino não tem uma base tão grande. Não só o vôlei, mas todos os esportes precisam de mais investimento na base. Se isso não mudar, teremos problemas no futuro.

FOLHA - O esporte cada vez mais depende do dinheiro estatal. Não é boa vitrine para a iniciativa privada?
ZÉ ROBERTO
- Algumas empresas se interessam. Mas, infelizmente, a visibilidade é maior no adulto. Sinceramente, não sei como está a lei [de incentivo fiscal], mas acho que deveria se criar um mecanismo forte para que mais empresas apoiassem [via lei de incentivo].

FOLHA - Sua agenda de palestras está lotada. Você gosta?
ZÉ ROBERTO
- Gosto de falar das experiências, de coisas que aconteceram. É um crescimento trocar experiências, traçar paralelos com outros setores.

FOLHA - Você tem três mulheres em casa e treina mulheres no clube e na seleção. Como é essa convivência? Há ciúme?
ZÉ ROBERTO
- Da Alcione [sua mulher], não. Das meninas [suas filhas], também não acredito. Elas estão sempre preocupadas com o time. Eu curto essa relação em família.

FOLHA - É mais desafiador treinar mulheres?
ZÉ ROBERTO
- Sem dúvida. Existem muito mais coisas envolvidas. Mulher é mais ligada em alguns detalhes. Você tem de se preocupar se a jogadora vai menstruar, se está tomando o remédio... Tudo isso me fez crescer bastante. Aprendi que às vezes bater o pé não é uma boa, é melhor ouvir o que os outros têm a dizer. Pedir desculpa também é algo que eu não fazia e passei a fazer mais.

FOLHA - Se perdesse o ouro, deixaria o cargo?
ZÉ ROBERTO
- Eu nunca pensei em sair.

FOLHA - Você acha que o Brasil pode organizar uma Olimpíada?
ZÉ ROBERTO
- Quando o Brasil se mobiliza para organizar algo, faz bem-feito. O que eu não sei é se esse é o momento. Estou falando como brasileiro que vê de fora. Acho que temos muitas prioridades para resolver antes na educação, na saúde...


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