|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TOSTÃO
Especialistas do óbvio
A psicologia esportiva deveria ser valorizada no futebol, e não me refiro às palestras de auto-ajuda e de motivação
NO DOMINGO , escrevi que existe, principalmente entre os
atletas e mais ainda entre os
de mais talento, uma sábia comunicação intuitiva, inconsciente e
corporal.
Citei o exemplo do primeiro gol do
Liverpool contra o Barcelona, quando o excepcional Gerrard, com o
olhar, percebeu os movimentos do
corpo do Bellamy e colocou a bola na
sua cabeça.
Coincidentemente, a Folha publicou no domingo uma ótima reportagem sobre a psicologia esportiva, feita pelos repórteres Guilherme Roseguini e Mariana Lajolo. Na
matéria, o professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG),
Renato Miranda, falou sobre a capacidade dos atletas de perceber os
movimentos corporais, fenômeno
que é chamado pelos especialistas
de inteligência sinestésica.
Quando joguei ao lado de Pelé,
antes de a bola chegar ao ataque,
ele me mostrava, com seu expressivo olhar, que parecia ter um campo
visual de 360 graus, tudo o que pretendia fazer. Enquanto tentava entendê-lo, Pelé, em uma fração de
segundos, sem racionalizar, provavelmente calculava os movimentos
e a velocidade dos companheiros,
dos rivais, da bola e de todos os
obstáculos que teria para chegar
ao gol. Um gênio.
A mesma reportagem mostra
que especialistas franceses, François Ducasse e Makis Chamalidis,
publicaram um imenso livro sobre
a psicologia esportiva, "Champion
dans la Tête" ("Campeão na Cabeça"), não traduzido para o português. Os dois especialistas disseram ainda que, em competição de
alto nível, 70% das decisões são definidas pelos fatores psicológicos.
Exageros à parte, é indiscutível a
sua importância.
Por ser um curioso dos mistérios
da alma, ter feito cursos de medicina psicossomática e de psicanálise
e, principalmente, por ter sido atleta que percebia a importância do
fator emocional, penso, há tempos,
que a psicologia esportiva deveria
ser mais valorizada no futebol.
Não me refiro às palestras de auto-ajuda e de motivação, tão comuns nos clubes. São os especialistas do óbvio. Isso às vezes funciona
bem por causa do comportamento
submisso, infantil e bastante sugestionável de muitos atletas.
A psicologia esportiva é muito
mais do que isso. É necessário fazer uma avaliação psicológica individual dos atletas e acompanhá-los. Muitos psicólogos fazem isso,
como Regina Brandão, que há muito tempo trabalha com Felipão.
Outro trabalho feito pela psicologia esportiva, que complementa
e enriquece a avaliação afetiva dos
atletas, é o realizado por meio de
testes físicos, técnicos e laboratoriais, quando se avalia e se mede a
capacidade de concentração dos
atletas, as suas reações aos estímulos positivos e negativos e tantas
outras coisas. Após essas avaliações, existem exercícios específicos para melhorar a performance.
No mundo atual, tecnológico,
utilitarista, pragmático, grande número de pessoas vibra com o cientificismo e o tecnicismo e despreza
os aspectos psicológicos e subjetivos dos atletas, como se eles fossem formados apenas por músculos, ossos, cartilagens, tendões, outros órgãos, e que os sentimentos
só existissem para enfeitar.
Absurdos preços
Após o aumento absurdo do preço do ingresso (R$ 40) e o pouco
público presente no clássico entre
Vasco e Flamengo, os dirigentes,
que sonham com ingressos caros e
estádios cheios em um país pobre,
tiveram de recuar. Um estádio de
futebol deveria ter vários tipos de
lugares, com preços diferentes,
mas todos com segurança e um básico conforto. Quem quiser mordomia e frescuras, que pague por isso.
tostao.folha@uol.com.br
Texto Anterior: Italiano: Ronaldo será reserva no Milan contra Palermo Próximo Texto: NBA se rende à força do YouTube e aceita parceria Índice
|