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ARTIGO
Weggis e os campeões
MARCELO BACKES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Antes de receber a
seleção, poucos brasileiros haviam descoberto Weggis. Eu estive lá
em 2002, ano da última Copa! Weggis é referida nas crônicas pela primeira vez no
ano de 825, quando faltava
muito para o Brasil ser "descoberto", e fica na região
central da Suíça em um dos
mais belos recantos do mundo, entre Rigi, a rainha das
montanhas, e o lago de Vierwaldstätte (algo como Lugar
das Quatro Florestas), que já
disseram ser o mais belo lago
da crosta terrestre.
O lugarejo tem 3.886 habitantes que se orgulham de
morar onde todo mundo gostaria de tirar férias. A programação cultural de Weggis dá
de dez na de muita capital
brasileira. E ainda tem o cassino! Há mais de 30 hotéis e
restaurantes para todos os
gostos e bolsos e belos descontos nos impostos para
quem decidir adotar o lugarejo. Apesar do gelo que rodeia Weggis no inverno, os
guias turísticos garantem
que a temperatura média é
superior a zero grau.
Mas os jogadores brasileiros precisam encarar apenas
o verão e guias turísticos,
ademais, nunca são confiáveis. O escritor americano
Mark Twain, um gigante do
humor, visitou a cidadela várias vezes. Na primeira delas,
escalou Rigi; um guia lhe disse que a subida duraria cerca
de três horas. Twain levou
três dias na escalada e ainda
teve de ouvir piadas de um
cicerone que, desdenhando a
lentidão do escritor e adiantando-se para reservar o
quarto no hotel que fica no
cume da montanha, disse
que caso não encontrasse nenhuma vaga se ocuparia em
construir uma hospedaria,
deixando-a prontinha para
quando Twain chegasse. Rigi
seria um bom exercício para
Ronaldo provar que está magro e Cafu que não está velho.
Duas horas, meus caros, trata-se de atletas!
Mark Twain não foi a única eminência a passar por
Weggis. Reis e imperadores a
visitaram. Da rainha Vitória
da Inglaterra ao imperador
Carlos 1º, passando por Luís
2º, da Baviera, o rei dos castelos de brinquedo. Entre os
escritores, estiveram por lá
Alexandre Dumas, Emile Zola e August Strindberg. Goethe, ao subir Rigi, limitou-se
a anotar em seu diário: "À
minha volta, o esplendor do
mundo". A paz do lugar fez
até Karl May deixar o espírito belicoso de seus faroestes
de lado e escrever o livreto
"Karl May como Educador".
Roberto Carlos faria bem em
se instruir um pouco na folga
dos treinos... O compositor
Sergei Rachmaninoff fez sua
casa em Hertenstein, perto
de Weggis, e por lá compôs as
"Variações Sobre um Tema
de Paganini".
Em Weggis os famosos
vêm de fora. Mas há um que é
de lá: Pulsy, cujo apelido data
de seus tempos de soldado
sanitário na 2ª Guerra, quando "media os pulsos" da população. Pulsy era o faz tudo
do Hotel Post e da comunidade; pintava e bordava para
quem quisesse, e também
poetava e decorava, além de
ser um exímio cantor à tirolesa. Existe alguém que suporta o falsete desses montanheses ecoando nos Alpes?
Talvez os adeptos da música
sertaneja entre os selecionados. E eles existem; Roberto
Carlos, por exemplo... Aposto que Pulsy, ainda que ande
meio retraído nos últimos
tempos, já pediu autógrafo a
Ronaldinho. E que Ronaldinho só não pediu para que o
velho entoasse a tirolesa porque é pagodeiro.
Weggis é o paraíso das rosas. Quem teve a idéia da
Festa das Rosas foram nove
jovens, reunidos secretamente em 14/11/1925 no bar
do mesmo Hotel Post, às 3 da
madruga. Ora, ora, homens
ideando com rosas num bar
às três da manhã? Florzinhas... Ronaldo -agora já é o
outro- é que entende da calada da noite! E os nove ainda
formaram o Clube dos Inofensivos para dar bandeira à
idéia. E deu certo! A melhor
coisa da festa anual é, naturalmente, a Princesa das Rosas que, devido à inocência
confessada pelos suíços que
a idealizaram, faz a felicidade
dos turistas. Eu sei disso, estive lá em 2002!
Neste ano, a Festa das Rosas acontecerá de 7 a 9 de julho, quando todos os suíços
-inclusive os da seleção- já
terão voltado pra casa e Ronaldo por sorte estará jogando a final da Copa. Eu ainda
não sei se assisto à festa ou à
final, mas a Rainha das Rosas, ainda que eu prefira as
trepadeiras, é imperdível. E
com Ronaldo na final talvez
sobre pra mim de novo. Vai
ser uma festa!
Que certeza de final é essa?
Na página de abertura do site
de Weggis está anunciado:
"Weggis -onde treinam os
campeões mundiais". Eu,
que sempre tive os olhos fincados no presente, encaro a
frase não como uma constatação relativa ao passado
mas como uma profecia...
MARCELO BACKES, escritor e tradutor, é
doutor em germanística e romanística pela
Universidade de Freiburg e autor de "Estilhaços" (Record, 2006), entre outras obras,
no qual pode ser encontrado o "Dicionário
nostálgico do meu futebol missioneiro".
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