São Paulo, quarta-feira, 28 de junho de 2006

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Torcida por Gana pára Nações Unidas

Diplomatas dizem que Brasil é Golias e a graça seria a vitória de Davi; em uníssono, eles vaiam até a dupla de Ronaldos

Kofi Annan, secretário-geral da ONU e ganense, pede para não chorarem por seu país e promete um melhor desempenho na Copa-2010


VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DE NOVA YORK

Torcida contra o Brasil na ONU. As nações, unidas por Gana, vaiaram a seleção e os Ronaldos. A partida pelas oitavas-de-final da Copa parou o órgão ontem. Literalmente. Do plenário ao Conselho de Segurança, tudo vazio.
Pelos corredores só se viam turistas, a maioria japoneses, em visitas guiadas. Diplomatas rompem a neutralidade e se amontoam na lanchonete do lobby, em frente a uma televisão que transmite o jogo com narração em espanhol. Outros delegados assistem em laptops e computadores compartilhados no corredores, graças à emissora Africast.
A reportagem pergunta o porquê da opção. Não era só torcer por Gana, pátria do secretário-geral, Kofi Annan. Era torcer contra o Brasil.
"Quem quer que Golias vença? Tem de dar Davi", responde o francês Jacques Dubois.
A maioria fuma, apesar dos sinais de proibição. "É para aliviar a tensão", justifica Dubois.
Qualquer lance do Brasil é motivo de vaias. Nem Ronaldinho, aquele, gaúcho, o melhor do mundo, é poupado. Aplausos só para os africanos.
No gol de Adriano, aos 46min do primeiro tempo, uma dupla de brasileiros grita um palavrão em português, impublicável. Ninguém entende. Vaia geral, de novo.
"Já acabou, juiz. Ih! Começou o desespero", afirma o diplomata carioca Eduardo Uziel, da missão brasileira na ONU.
Intervalo. Todos saem. Quinze minutos. Todos voltam.
Aos 7min do segundo tempo um ganense dá um carrinho em Roberto Carlos. Gargalhadas gerais.
"O Brasil vai fazer mais uns dois, três gols", diz um russo de nome indecifrável, em inglês claudicante. "Não. Vai ter no máximo mais um, e outro de Gana", rebate um outro torcedor, paquistanês.
Pouco depois, a platéia grita em uníssono: "Gol!". Meia dúzia de torcedores brasileiros responde: "Dida!".
"Sorte que esses ganenses são ruins. Quero ver contra a Itália", comenta Cláudio Medeiros, que veio do Itamaraty para uma conferência sobre armas, errando o adversário.
Não é Itália, é França. No sábado, quartas-de-final, revanche da decisão de 1998.
"Parece joguinho de futebol de Atari", completa.
Uma das poucas ganenses, Mara diz "restar só uma esperança". Mara de quê? "Só Mara. Estou com vergonha."
Terceiro gol do Brasil, Zé Roberto. Silêncio geral. A irlandesa Deirdre Mullan chega minutos depois. "Qual o placar?", pergunta. "Está 3 a 0? Queria que Gana ganhasse."
Num corredor a caminho do Conselho de Segurança, Kofi Annan retoma a diplomacia. "Foi só uma festa. Não chorem por Gana. Amanhã a história vai ser diferente. Em 2010, tem a Copa da África do Sul".
No cargo desde 1997, Annan já afirmou que pretende assistir à final da Copa.
Apesar da gana, Gana não ganhou. Ao final, sem aplausos, vitória de Golias.


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